Publicidade

Opinião

Retrogosto

Cannes veio, foi e me deixou uma sensação agridoce


15 de julho de 2022 - 15h07

Cannes veio, foi e me deixou uma sensação agridoce.

A parte doce, imagino, vocês não terão dificuldade de adivinhar qual foi. Ir a um evento internacional desta importância depois de 2 anos trancadinha em casa foi inesquecível, eu diria.

Reencontrei colegas do mercado, revi amigos que fiz nele, e tive oportunidade de conhecer inúmeros novos colegas de trabalho da cintura pra baixo – um luxo nestes dias de vida nas telas.

A outra parte do doce foi perceber que nossa indústria está evoluindo no tipo de conteúdo que debate por lá. Assuntos como a reinvenção das agências, a fluidez de gênero e identidade, o poder da colaboração (a palavra que mais vi, ouvi e falei por lá!) que emerge de relações comerciais transparentes e com objetivos alinhados, a importância da coragem nas esferas pessoal e profissional, e tantos outros bons assuntos foram debatidos no Palais des Festivals (onde o evento acontece), nas “praias corporativas” e nos bistrozinhos charmosos da Croisette.

Mas a parte azeda – ou melhor, decepcionante – foi tão forte quanto, e esteve presente desde antes da minha ida. Como uma colunista que cobre o festival, eu tive acesso a um relatório da Unstereotype Alliance da ONU que mostra um retrocesso importante em diversas frentes relacionadas à evolução global em direção à igualdade de gênero, como:

– O Covid fez andarmos para trás no assunto violência doméstica. 19% dos respondentes da pesquisa acreditam que há circunstâncias aceitáveis para alguém bater em uma parceira ou parceiro. O mais assustador é que esta estatística cresce em países pujantes economicamente, como os EUA e a Suécia.

– A despeito do progresso que já fizemos, ainda é muito pequena a participação das mulheres na política. Os respondentes da pesquisa mostram que para um homem é quase duas vezes mais fácil se eleger para um cargo público quando comparado a uma mulher.

– Os desafios econômicos impostos pelo Covid também fizeram reaparecer uma estatística alarmante: 25% dos respondentes do estudo acreditam que em tempos de escassez econômica, deve se priorizar a contratação de homens.

Foi duríssimo ler estas estatísticas. O relatório tem informações que não são necessariamente novas, mas que quando colocadas juntas nos mostram quão difícil é conseguirmos progredir consistentemente.

Mas, aí, no primeiro dia do festival apareceram Tarana Burke e Susan Credle no palco do Palais, e elas reavivaram minha esperança ao contarem para a plateia como o movimento #metoo vem evoluindo nos últimos anos. Quantas mulheres devem a ele a superação de seus traumas, quantas passaram a falar abertamente sobre situações de assédio que viveram e que estão em processo de cura neste momento.

Elas falaram sobre como o mundo está populado de traumas – e sobre como a falta de gentileza pode piorar isso e assassinar, pouco a pouco, o nosso senso de coletividade.

Combater a escuridão pressupõe empatia, na visão delas, e a combinação entre rigor e fluidez.

Como disse uma das CCOs que vi falar no terraço no mesmo dia: temos que saber ser âncoras e ondas ao mesmo tempo.

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • De estagiária a VP global: os 20 anos de Thais Hagge na Unilever

    De estagiária a VP global: os 20 anos de Thais Hagge na Unilever

    A nova VP global de marketing para Seda fala sobre sua trajetória na multinacional e como concilia a carreira com outras áreas da vida

  • Alice Pataxó eleva a voz indígena nas redes sociais e no mundo

    Alice Pataxó eleva a voz indígena nas redes sociais e no mundo

    A jovem fala sobre sua trajetória no ativismo e como se tornou uma influenciadora e porta-voz das pautas indígenas