Por que discutir concorrências ainda é tabu?

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Por que discutir concorrências ainda é tabu?

Agências e anunciantes discutiram práticas para tornar os processos de concorrência menos traumáticos durante o Festival do Clube de Criação, que aconteceu no último final de semana


24 de setembro de 2018 - 10h00

Passar por processos de concorrência sem a garantia de que o trabalho será colocado na rua ou que o job será remunerado é rotina para as equipes de agências, uma prática que, em muitos casos, pode ser desgastante para todos os lados. A criação de metodologias de concorrência “menos traumáticas” foi uma das discussões do Festival do Clube de Criação no sábado, 22, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo.

Durante um debate sobre o tema, representantes de agências e anunciantes falaram da importância de desmistificar o assunto. Mario D’Andrea, presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), afirmou que o mercado brasileiro se acostumou a modelos abusivos de concorrência que acabam onerando as agências – com formatos não remunerados e sem critérios claros, por exemplo. Para D’Andrea, o processo deve ser visto como qualquer outro serviço prestado por outras indústrias. “Quando se fala do trabalho de uma consultoria ou empresa de branding, por exemplo, a empresa dimensiona o tamanho e a duração do trabalho e demonstra seu jeito de pensar, mas nenhuma consultoria entrega o trabalho pronto antes de ser contratado”, argumenta.

Da esquerda para a direita: Miriam Shirley, Marcio Toscani, Fernando Musa, Maria Gouvea, Rita Almeita e Mario D’Andrea. Foto: Karina Balan Julio

Como uma alternativa aos modelos atuais, ele defende formatos como o adotado na Argentina, onde um número menor de agências é chamado para as concorrências e as participantes são necessariamente remuneradas pelo anunciante. “Isso não significa que as agências querem ficar ricas fazendo concorrências, mas quando o cliente não paga fica a sensação de que se está jogando boas ideias para o céu. Além disso, um modelo pago desestimularia anunciantes a fazer concorrências todos os anos ou chamar um número excessivo de agências”, afirma.

Outro modelo mais viável, segundo D’Andrea, seria um processo de escolha de agências via workshops, onde há mais colaboração entre o cliente e as potenciais agências.

Marcio Toscani, co-CEO e COO da Leo Burnett Tailor Made, afirma que é importante que o mercado padronize boas práticas e que as regras para seleção sejam claras, para que os processos não sejam tão desgastantes para as equipes. “Considerando que cada agência participe de 10 concorrências por ano e ganhe duas, isso significa uma taxa de insucesso imensa. Você já começa o ano sabendo que vai investir capital humano ao longo do ano, que vai virar noites e não vai ter retorno daquele trabalho”, disse.

Segundo a MindMiners, 65% dos publicitários consideram os processos de concorrência injustos, e 60% afirmaram que os critérios de escolha geralmente não ficam claros

Detalhes como precificação de campanhas devem ser acertados desde o início, já que as discrepâncias na negociação costumam ser muito elásticas. “É necessário conversar mais antes do processo. Uma agência pode seguir até o final de uma concorrência para então descobrir que outra agência cobra três vezes menos, e que na verdade o preço é um dos critérios principais para o cliente”, afirma a head de planejamento da F/Nazca S&S, Rita Almeida, citando um estudo da Mind Miners que avalia a percepção dos publicitários sobre os processos de concorrência.

Segundo o estudo, publicado em 2017, 65% dos publicitários consideram os processos de concorrência injustos, e 60% afirmaram que os critérios de escolha geralmente não ficam claros.

O caso Santander

Com um método diferente, o Santander buscou promover, em março deste ano, um processo de concorrência remunerado e com parâmetros mais claros para as agências participantes. Maria Gouvea, gerente de marketing da marca, esteve no painel para falar sobre como foi elaborada a concorrência que, em abril, escolheu a Y&R como agência da marca.

Desde a convocação das agências participantes, a marca buscou deixar claro o que buscava, os elementos que não gostaria de ver nas apresentações e a forma como gostaria de vir a trabalhar com a vencedora – uma das preferências era por agências que valorizassem success fees e metodologias ágeis. Também estipulou que daria um feedback sobre os critérios que levariam à escolha ou a desclassificação de uma agência. “O que segura um contrato não é um filme ou ideia mirabolante, mas a relação e o comprometimento mútuo no dia- a-dia”, disse a gerente.

Adaptação interna

Apesar dos ajustes necessários aos formatos, as concorrências ainda podem servir como ricas fontes de aprendizado e experimentação para as agências. “Concorrências podem ser um momento de grande aprendizado dentro da estrutura, e, individualmente, é uma chance de cada profissional mostrar mais o seu trabalho e fazer algo que acredita”, avalia Fernando Musa, CEO da Ogilvy.

Ele acredita que, mais do que vilanizar os processos de concorrência, é preciso discutir o assunto para que ele não seja um tabu na indústria. “Do lado das agências, as boas práticas partem do pressuposto de falar ‘não’ para algumas concorrências, ou de falar ‘sim’ e saber assumir as implicações diante da equipe”, acrescenta.

Miriam Shirley, copresidente da Publicis, também tem sido mais seletiva em relação às concorrências nas quais a agência embarca. Se não é possível interferir nos métodos de seleção dos clientes, uma opção é estruturar o fluxo de trabalho para não desgastar os funcionários, afirma ela. “Tenho a pauta da criação inteira no meu celular, busco saber os momentos de pico de cada colaborador e avaliar quais estão mais disponíveis para entrar em um pitch. Afinal, estamos lidando com seres humanos, que precisam de tempo com a família e para trabalhar nas ideias”, avalia.

 

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