O pulso efervescente do Festival
Cannes vive uma maré cheia de oportunidades, mas nem todo mundo aprendeu a navegar nos ventos da nova economia criativa
Cannes vive uma maré cheia de oportunidades, mas nem todo mundo aprendeu a navegar nos ventos da nova economia criativa
19 de junho de 2025 - 14h26
Tudo vai muito bem, obrigado.
O mercado está efervescente, e isso parece pulsar pelas ruas da cidade durante o Festival. Este é o ano do Brasil no Lions Festival, e talvez por isso seja um momento tão abundante em oportunidades a serem exploradas, no melhor estilo Brasil.
Mesmo com todas as dificuldades no mundo — guerras, inflações, tensões e medos —, uma curiosa e otimista bolha se forma na cidade, impulsionando a indústria a seguir em frente.
Esse mercado efervescente em transformação produz diversos feitos curiosos.
As agências, historicamente as “anfitriões” do evento, estão sendo um tanto quanto deixadas de lado na pista de dança.
Mesmo ainda patrocinando muita coisa, o dinheiro e o espaço parecem insuficientes para a nova realidade que se apresenta. Dos grandões, são poucos os que conseguem lugar ao sol.
Quem chegou este ano com força total ao evento foi a creator economy. Eles ganham merecido destaque e espaço, reflexo de um crescimento gigantesco, que quase triplicou os investimentos nos últimos anos e, pouco a pouco, vai roubando share de todo mundo.
A nova era das mídias digitais também tem seu momento especial em Cannes. É comum, e curioso, ver que todos têm interesse comercial bilateral e, por isso, passeiam de mãos dadas pela Croisette.
Afinal, a série que bomba na Netflix gera conteúdo no TikTok, que faz o search do Google explodir, e assim sucessivamente: o espiral virtuoso da indústria se move. O cliente vira fornecedor, a plataforma vira parceira, e o dinheiro que vai, uma hora volta também.
No quarteirão ao lado, outro assunto efervescente toma conta. Enquanto produtoras, fotógrafos e artistas se alimentam no red carpet, as premiações sentem uma inovação sem nome ou fisionomia chegar à festa.
A tal da Inteligência Artificial não pede licença e vai logo se sentando na primeira fileira de qualquer painel ou premiação. Todos dizem não temer e querer trabalhar juntos, mas não há como negar que, bem ao certo, ninguém sabe ainda como vai ser — só se sabe que, em muito pouco tempo, tudo será diferente.
Pelos corredores do Palais, CMOs dividem seu tempo entre escutar inspirações, estudar categorias, formatos e ouvir a defesa de trabalhos em Glass e Titanium. Cannes tem esse poder: vicia e apaixona quem vivencia tudo isso.
Quem não tem Leão, quer ter. Quem já tem um shortlist, querem o bronze. Depois a corrida pela prata e o tão sonhado ouro — e o inatingível GP. Se conseguiu o GP, vem a vontade de ser Agência do Ano.
Se for global, a meta passa a ser a Network do Ano. Para quem já fez essa procissão de troféus, agora o foco é buscar reconhecimentos de consistência: Marca do Ano, falar no palco, ser convidado para ser júri.
Depois que subiu ao palco, quer ir para a sala maior, ter sessão lotada e encher as redes sociais das pessoas com fotos daquilo que você apresentou.
Talvez, um dia, ser reconhecido pelas ruas por onde passa aqui em Cannes — mesmo sendo um ilustre desconhecido no bairro onde mora.
Como bons brasileiros temos memória curta. E parece que não lembramos que toda essa vontade de querer sempre mais bugou uma geração, encheu o mercado de trabalhos fantasmas e criou uma era de muito vídeo e pouco case.
Na corrida desenfreada, até Leão já precisou ser devolvido. Que a gente aprenda com o passado e cuide do caminho que vamos trilhar agora.
Mas o fato é que não podemos jamais dizer que a indústria está calma como o mar da Riviera. Muito pelo contrário: temos ondas agitadas e mar revolto.
Alguns navegam de vento em popa, surfam as ondas, enquanto outros veem o navio afundar, tomando rosé ao som de violino.
A indústria vai muito bem, com muitos espaços e oportunidades, mas não mais com os mesmos formatos dos verões passados.
Sigamos em frente. Afinal, mar calmo nunca fez bom marinheiro.
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