Depois da tempestade
Fernando Figueiredo, jurado em Promo & Activation, avalia a experiência e dá dicas estratégias que podem ajudar a render um Leão no futuro
Cannes acabou e estamos de volta à nossa realidade de matar um leão por dia. Confesso que foi uma das maiores experiências que já vivi. Passar cinco dias mergulhado em cases de todas as espécies, dos mais medíocres a verdadeiras obras de arte, dividindo opiniões com profissionais de todas as especialidades e, às vezes, debatendo de forma bem calorosa opiniões diversas. Uma experiência que não tem preço. Aliás, tem. E prometi ao Armando Ruivo, que meu trabalho como jurado seria feito antes, durante e depois.
Chegou o momento do depois. Vou tentar passar adiante o que vi, o que senti, e o que pode ser feito para que a categoria Promo & Activation realmente aconteça no Brasil.
Promo Lions e o Brasil
O Brasil mandou 214 inscrições em 2011, 95% a mais que no ano anterior. A estatística já estava em nosso favor. Mas Cannes é loteria.
Na hora do vamos ver, a dinâmica da votação não favorece o formato dos cases de Promo. No meu ponto de vista, o júri de Cannes como está é perfeito para votar Press e Film: 30 segundos, no máximo dois minutos, e a história está contada.
No caso de Promo & Activation, um case é uma campanha e não uma peça. Um videocase e uma prancha muitas vezes não são suficientes para contar, explicar e comprovar. Acho que é aí que muita gente se perde.
A mecânica
O shortlist é decidido em três dias. O grupo de jurados é dividido em quatro ou cinco subgrupos que são misturados a cada sessão. Ou seja, cada jurado analisa cerca de 1/4 de todas as inscrições.
Não sei como é feita a distribuição dos trabalhos, mas me parece que realmente existe um controle para que o jurado avalie o mínimo de campanhas possível de seu país. Não passaram por mim mais que 30 campanhas brasileiras nessa primeira fase.
Assim, a cada dia, cases são submetidos a grupos que não falam a mesma língua e não entendem a cultura de cada região. O que torna o trabalho de analisar cada case, incluindo vídeo, prancha e sinopse, insano. Apesar de soar tendencioso, poder explicar os cases do seu país para esse grupo faz toda a diferença.
O jurado como tradutor
Tive a chance de defender cerca de 15 cases brasileiros. E posso garantir que as chances mudam muito. Quando chegamos ao grande grupo, o shortlist está praticamente decidido. É quando normalmente os jurados mais patriotas – os latinos são com certeza – tomam um susto: onde estão as 214 inscrições? No meu caso, só dez estavam na lista. O “vale-tudo” começa. Resultado do dia: quatro cases brasileiros “repescados”. E que venha a distribuição dos metais.
Aí que o jurado se torna fundamental no processo: contar para as demais 22 pessoas detalhes que escaparam nas inscrições, fatos culturais que dão ainda mais sentido para aquela peça tão criativa. De saliva em saliva, um voto a mais dos 14 fundamentais no processo.
A matemática é a alma de Cannes. E nesse caso ainda mais. Se a base de trabalhos no shortlist fosse maior, mais chances de metais teríamos. E para a aumentar a base? O vídeo, a prancha e uma ideia blockbuster.
Na primeira metade do primeiro dia, todo mundo muito aplicado. Mas a partir da rotina estabelecida, a construção do case começa a criar vícios e os jurados já estabelecem critérios de pontuação. Cada um cria o seu. E pode apostar: é nessa hora que muita coisa boa deixa de ser profundamente analisada. Por isso, acho que o que conta mesmo não é sorte e, sim, dez segundos.
Um Leão em dez segundos
Dez segundos é o tempo para prender a atenção do jurado. Se isso não acontecer nesse período, perdemos os jurados. Muitas vezes vi celulares sendo tirados do bolso, lápis rabiscando papéis e conversas paralelas quando o case não capturava a atenção nos primeiros segundos de exibição.
Para os dez primeiros segundos, fiz o meu próprio check-list, que pode ajudar muito nos anos que virão:
1. Arranque um sorriso. Os cases que fizeram os jurados rirem, seja pelo humor, pela beleza, pelo ineditismo ganharam um lugar na lista.
2. Prove implementação. Nesse mundo de fantasmas, mostrar que o case foi feito ganha mais votos ou, pelos menos, deixa de perder alguns.
3. Seja simples. Cases muito bons, mas que eram complexos na execução ou no entendimento, perderam preciosos votos.
4. Mostre resultados, não números. Os jurados ignoram os 120% de crescimento ou 30% de aumento de marketing share. Imagens nesse caso valem mais que números: gente consumindo, filas sendo geradas, emoções sendo provocadas valem mais que qualquer estatística.
5. Use pop media. Não tente criar a sua. Perderá muito tempo explicando-a. Facebook e Twitter são “price of entry”: não valem ponto extra, mas mostram pertinência.
6. Quanto mais “sem nacionalidade”, melhor. Não acredito em caça aos brasileiros, americanos ou australianos. Mas cases muito patriotas sem necessidade de estar na mecânica, eram literalmente desprezados. A campanha "ROM" é um caso a parte. A nacionalidade era fundamental no contexto.
Meu Cannes imaginário
Acho que muita coisa poderia ser diferente, no meu Cannes imaginário. Mesmo sabendo que a minha opinião não agregaria qualquer valor na história. Mas em categorias complexas, em que vídeo e prancha não são suficientes, os jurados poderiam ser vistos como representantes do seu país para esclarecer a ideia ao júri.
Nesse meu Cannes imaginário, também juntaria Cyber, Promo e Direct e, a esta “Shopper Category”, também o Mobile, que, se-tudo-der-errado virará mais uma categoria no ano que vem.
Não existe mais Promo sem Facebook ou Twitter. Ou Direct sem interaction. Mobile é ferramenta básica de qualquer ativação de marca. Se fragmentar perde força.
Por falar em fragmentar, cases que tinham tudo para se dar bem, perderam muita força quando foram “picotados” na inscrição. Aquele projeto integrado perdeu qualquer sentido quando julgado como um cartaz ou um bandeirão. Mas como ninguém aqui quer ganhar um Leão imaginário, contem comigo. Será um prazer contribuir para que no ano que vem a jaula fique cheia.