Netflix: Estado da Arte em Inovação não é sinônimo de sucesso eterno

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Opinião

Netflix: Estado da Arte em Inovação não é sinônimo de sucesso eterno

É preciso entender que a inovação é cultura e que ela tem que ser disseminada pela empresa inteira


13 de maio de 2022 - 6h00

Chegar ao “estado da arte” em inovação não é sinônimo de que a empresa não precisará mais inovar. É preciso entender que a inovação é cultura e que ela tem que ser disseminada pela empresa inteira. A Netflix foi conhecida como uma das empresas que fizeram a inovação disruptiva, que desconstruiu o mercado das locadoras:

De acordo com Clayton M. Christensen: “Inovações disruptivas são aquelas que provocam uma ruptura no antigo modelo de negócios. Elas, normalmente, favorecem o aparecimento de novos entrantes.”

Vale lembrar que a Netflix começou como aluguel de DVD enviado pelos correios a partir de um site em 1997. No modelo de negócios da empresa, o cliente pagava uma taxa única de US$ 5 por aluguel; e o consumidor não precisava se preocupar com a data de devolução, multa por atraso ou limite de títulos alugados por mês. Ou seja, uma das grandes reclamações na época (quem lembra de alugar fitas no Blockbuster?), era devolver fora do prazo e pagar multa. Ou até esquecer de rebobinar a fita? Isso já era uma inovação na época, no caso uma inovação radical. Incrementaram a inovação e logo mudaram para modelo de assinatura e trouxeram recomendações de títulos. Cogitaram vender a própria Netflix para a Blockcbuster e ainda tiveram reuniões com Jeff Bezos da Amazon.

Em 2002, a Netflix fez sua oferta pública de ações (IPO) e começou a ter lucro. Lançaram novas inovações como o recurso Perfis, onde os assinantes conseguiam criar listas para diferentes usuários e/ou necessidades. Só foi em 2007 que lançaram o modelo que conhecemos hoje, e que fez a disrupção do mercado. Pagamento de uma mensalidade e o consumo via streaming de todos os títulos disponíveis, o All-You-Can-Eat.

Em 2013 lançaram um dos primeiros sucessos com produção original (até então eram contratos de licenças com grandes estúdios). A inovação nesse caso foi usando a cultura de dados (e que até hoje usam muito bem nesse meio digital). Eles usaram cada clique, pausa, tempo de retenção nas séries e filmes, aceleração ou desaceleração de frames, entre mil outros fatores, e entendeu também que seu público estava interessado em séries políticas, com personagens fortes, principalmente os femininos, etc. Assim o seriado foi feito escolhendo os atores com mais destaque e influência, número de capítulos de acordo com o gosto das pessoas, o tempo de cada capítulo, entre outros itens.

Outros seriados de sucesso seguiram o mesmo padrão de uso de dados como Orange is the new Black, Stranger Things etc

Inclusive a partir de um problema identificado foi criada uma proposta de valor enorme na plataforma. Na época, muitas pessoas começaram a dividir as contas da sua assinatura. Foi então que a Netflix trouxe a criação dos perfis diferentes (inclusive em que as pessoas podiam escolher ícones diferentes do seu perfil, dos personagens de seriados prediletos, etc). Mas como incentivar a criação de perfis? Entregando as melhores sugestões de acordo com o perfil dos filmes e seriados assistidos. Quem já teve sobrinhos ou crianças em casa e usou o seu perfil da Netflix? Se sim, viu que aquele seu perfil se desvirtuou e começaram a aparecer sugestões de desenhos para crianças. Isso irrita as pessoas, e com os perfis é evitado esse problema, e as sugestões começam a ser mais assertivas. Além disso a plataforma de streaming oferece até os cards da mesma de acordo com o perfil da pessoa

Provavelmente assinantes que gostam de filmes de terror, vão ver o card da personagem Eleven com sangue escorrendo. Quem tem perfil mais nostálgico, vai ver as crianças fantasiadas de Caça Fantasmas. Quem tem o perfil mais neutro verá apenas o logo do seriado, e assim por diante.

Não é por acaso que a Netflix mudou a forma como você demonstra se gostou ou não do filme. O que era uma joinha para cima e outra para baixo, desde abril, ele acrescentou o duplo joinha. Assim as recomendações tendem a ficar ainda mais assertivas.

Até a forma de consumir mudou no mercado. Apareceu o termo “maratonar o seriado”. Outra inovação no mercado e que não existia antes, é baixar e ver offline os filmes.

A experiência do usuário começou a ser o grande diferencial da Netflix, inclusive com essas customizações. E já que estamos falando de experiência do usuário, quem nunca viu ser cancelado algum serviço só porque seu cartão de crédito foi trocado, ou porque seu cartão expirou, etc? E não apenas pelo fato de não querer mais o serviço. A Netflix entendeu que não podia simplesmente cancelar, e começou a mandar uma mensagem que provavelmente o cartão estava com problema e era para atualizar a forma de pagamento em vez de simplesmente cancelar. Além disso, caso sua conta esteja inativa há muito tempo, você recebe um email ou uma notificação ao acessar a Netflix informando que a sua assinatura terminará em breve.

Inovação com certeza é sobre experiência do usuário também. Até por isso, em 2021 a Netflix lançou uma loja virtual (https://netflix.shop/) para diversificar sua receita. Lá podem ser adquiridos produtos oficiais de filmes e seriados do streaming, como camisetas, moletons, brinquedos, etc de seriados como The Witcher, o coreano Round6, Stranger Things, Cobra Kai, O Gambito da Rainha, etc. Outra forma de diversificar a receita foi apostar no mercado de games.

Inclusive o Gambito da Rainha (um seriado sobre xadrez, baseado no livro homônimo de Walter Tevis, se tornou a produção original curta mais vista na história da Netflix na época), influenciou diretamente o mercado. A procura por tabuleiro aumentou 273% no Ebay, a busca no Google atingiu o pico da década (as pesquisas pelo termo quase dobraram dez dias após seu lançamento em relação ao ano passado inteiro), o livro virou best seller mesmo tendo sido lançado 37 anos antes, o número de jogadores no site chess.com aumentou 500%, entre outros números.

Mas apesar de toda inovação a Netflix começou a ter problemas e estão refletidos em números esse ano. Um exemplo são a quantidade de cancelamentos que chegou a 200 mil entre janeiro e março deste ano. No comunicado ainda diz que a perda de assinantes no segundo semestre deve ser 10 vezes maior, chegando a 2 milhões de usuários. No dia 20/04, as ações da empresa caíram mais de 35%.

O mar está ficando vermelho, e a entrada de novos concorrentes têm mostrado que o mercado de streaming de filmes tem virado commoditie, e é necessário pensar cada vez mais em inovações para se diferenciar. E não estamos falando apenas de concorrentes como Disney+, Amazon Prime, Youtube, AppleTV+, HBO Max etc. Como o próprio CEO da Netflix, Reed Hastings disse em 2019:
“Competimos com (e perdemos para) Fortnite mais do que HBO”

Ou seja, a concorrência está cada vez mais acirrada, não só pelo streaming mas pelo entretenimento.

Os usuários do TikTok por exemplo, gastam em média quase 26 horas por mês no aplicativo – ou mais de 1 dia inteiro por mês. É maior que as 23,7 horas médias de usuários por mês no aplicativo móvel do YouTube em 2021 e é mais que o triplo do tempo gasto no Instagram.

Source: TheNetworkEC via Twitter

Diferente do modelo Spotify, em que as pessoas ouvem várias vezes a mesma música, o usuário da Netflix, normalmente vê uma vez o filme, e por isso ela tem sempre que atualizar e lançar novas produções, para manter o cliente na plataforma.

Outro fator desse desafio, é o que está sendo chamado de: “fadiga do streaming”. De acordo com a pesquisa da Deloitte, há a previsão de que mais de 150 milhões de pessoas deverão cancelar alguma assinatura. Faça a conta, quantas assinaturas você tem? E quantas assinaturas tem na sua casa, contando seu marido, esposa, filhos, mães, etc?

Por fim, a Netflix começou a se preocupar mais com o compartilhamento de contas:

“Quando estávamos crescendo rápido, isso não era uma prioridade (compartilhamento de contas). Agora estamos trabalhando muito nisso”, diz Hastings aos acionistas.

Apesar de todos os esforços da Netflix nos últimos anos em inovar, ela vem tendo suas dificuldades. Se não está fácil para empresa com esse reconhecimento no mercado, imagine para as demais. O próximo passo da Netflix é criar planos de assinatura mais baratos, mas que contenham a veiculação de anúncios. “Não existe receita de bolo para inovação”. Mas a Netflix está sim se mexendo. Se vai dar certo ou não, veremos nos próximos meses.

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