Dissecando a cultura dos fandoms
Matt Hills, professor de estudos de mídia da Universidade de Huddersfield e especialista em fandoms, explica como as comunidades de fãs se tornaram um grande filtro para o acesso a informação e produtos
Matt Hills, professor de estudos de mídia da Universidade de Huddersfield e especialista em fandoms, explica como as comunidades de fãs se tornaram um grande filtro para o acesso a informação e produtos
Karina Balan Julio
8 de dezembro de 2017 - 14h00
Assistir a todos os filmes ou episódios de uma franquia 20 vezes, interagir com todo o elenco nas redes sociais ou esperar o ano todo para comprar um produto ou ver o show de um ídolo: ser parte de uma comunidade de fãs em 2017 traz possibilidades mais complexas do que há alguns anos. Com mais influência do que muitos veículos de comunicação, as comunidades de fãs, conhecida como fandoms, foram favorecidas pela relativa democratização do acesso a informação e a variedades de produtos, e ajudaram a criar novas relações com produtores de conteúdo.
Matt Hills professor de estudos de mídia da Universidade de Huddersfield, na Inglaterra, e autor do livro Fan Cultures, esteve na Comic Con Experience na quarta-feira, dia 6, em São Paulo, onde falou sobre a relação das comunidades de fãs com a mídia e produção de conteúdo.
Segundo a definição de Hills, fandoms são audiências contraditórias.“Fãs podem ser anticomerciais, de algumas maneiras, mas também colecionam merchandising. Podem amar uma franquia, mas nunca incondicionalmente, pois é uma relação de amor e crítica. Eles adoram a mídia, mas também podem ficar muito frustrados sobre a forma como uma história é contada”, disse.
O estudo da cultura dos fandoms começou nos anos 2000, com um olhar antropológico sobre o comportamento do público em relação a consumo, eventos de nicho e à atitude das pessoas nestes espaços. A organização das comunidades na internet também fomentou o surgimento de uma nova economia criativa.
“Foi criada uma espécie de jornalismo de fã, com blogs de fan fiction e canais que especulam sobre futuras storylines. Se voltarmos às antigas fanzines impressas, que tinham muito pouca circulação, veremos que os Fandoms sempre criaram suas próprias versões dos conteúdos. A mudança de hoje não está necessariamente na facilidade do acesso ao conteúdo em si, mas de acessar ao que outros fãs estão fazendo com esse material”, avaliou.
Com isso, surgiram inúmeros canais especializados em diferentes franquias e categorias de entretenimento. “Hoje há fãs famosos com milhões de views, que podem atingir a uma fração considerável da audiência ‘oficial’ de um produto”, acrescentou.
Plataformas como Netflix e Amazon também deram o pontapé inicial para a criação do que ele chama de data targeted fandoms, ou comunidades de fãs criadas com ajuda de ciência de dados. “A Netflix, devido a suas tecnologias de dados proprietários, tem usado as informações para estudar a forma como sua audiência assiste a séries. Existe quase um ranqueamento de conteúdo com base na miração de dados dos fãs. A empresa viu que se tivesse uma série que combina nostalgia, blockbusters de horror clássico e referências a Spielberg, poderiam agregar diferentes nichos de fãs”, disse ele, usando como exemplo a utilização de algoritmos para a concepção de Stranger Things.
Manipular séries e conteúdo sob medida para demografias e gostos híbridos exige cuidado, de certa forma. Com tendência a serem muito críticos, os fãs podem acabar questionando a agenda das plataformas de conteúdo digital. “Se perceberem que essa personalização não vem de uma visão autêntica e não passa de um jogo de números, podem reagir negativamente”, pondera.
O hábito de maratonar e o imediatismo das redes sociais trazem ainda novas tensões para a relação entre estúdios, plataformas de vídeo e fãs. “Produtores podem acompanhar as resposta do público, episódio por episódio e em tempo real, e têm uma consciência muito grande dos personagens que fãs amam e o que fazem”, argumentou Matt. A linha entre produzir um bom conteúdo ou simplesmente ceder aos desejos do público, portanto, fica muito mais tênue.
A carga simbólica de produtos também é muito mais significativa para os fandoms do que para o consumidor ordinário. A organização dos fãs em grupos online, com o intuito de dividir novidades, disputar por preços e se vangloriar pelos “achados”, torna estes nichos muito valiosos para as marcas. “O principal não é a compra em si, mas o ato criativo de colecionar. Ao colecionar produtos, fãs fazem ligações entre os elementos de sua coleção e suas memórias, criando uma biografia própria e uma inteligência coletiva de fãs”, diz o professor.
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