Do áudio à tela: videocasts conquistam o streaming
Plataformas oferecem suporte, monetização e ferramentas para que criadores explorem o vídeo com autenticidade

Nátaly Neri, Pequena Lô e Camila Fremder no podcast É Nóia Minha? (Crédito: Reprodução)
Em 2004, em um artigo publicado no The Guardian, o jornalista Ben Hammersley propôs o termo “podcasting”.
Na época, ele buscava nomear a prática emergente de distribuir programas de áudio sob demanda pela internet, unindo as palavras iPod e broadcasting.
Mas, o que parecia uma tendência de nicho se transformou em um dos maiores fenômenos digitais das últimas duas décadas.
Se a primeira fase foi marcada pela explosão de ouvintes e criadores, a nova etapa coloca os videocasts, podcasts com imagem, no centro das estratégias do streaming e do interesse de anunciantes.
YouTube lidera descoberta de podcasts
Segundo a Emarketer Brasil (2023), o País é o segundo com maior número de ouvintes de podcasts, atrás apenas dos Estados Unidos, e lidera o mercado de podcasts e videocasts na América Latina, com 56 milhões de pessoas consumindo podcasts regularmente em um universo de 136,8 milhões de usuários de áudio digital.
A distribuição regional mostra predominância no Sudeste (43%), seguido por Nordeste (28%) e Sul (14%), segundo a Nielsen Brasil.
O comportamento de consumo também mudou: 48% dos brasileiros entrevistados afirmaram ter aumentado o tempo dedicado a podcasts em áudio nos últimos seis meses, enquanto 55% declararam ter ampliado o tempo gasto em podcasts em vídeo.
De acordo com a Edison Research (2024), os usuários brasileiros dedicam, em média, 11 horas por semana a podcasts, quase quatro horas a mais que os norte-americanos, e 81% utilizam o YouTube para descobrir novos programas, superando Instagram (48%) e Spotify (46%).
Entre os consumidores semanais de podcast, 63% a 67% consideram importante que os conteúdos tenham vídeo.
O smartphone é o dispositivo preferido para 61% dos usuários, seguido pela Smart TV (18%), e 79% consomem podcasts em casa.
Segundo Eduardo Brandini, head de parcerias e responsabilidade do YouTube Brasil, a plataforma permite que podcasters explorem diferentes formatos de monetização, como anúncios, assinaturas de canal e membros, além de ferramentas de organização e descoberta de novos programas.
Comentários, chat ao vivo e Shorts ampliam a interação entre criadores e audiência.
“Criar uma comunidade é central para nós, e o vídeo é a ferramenta que humaniza essa relação”, afirma Brandini.
O vídeo, segundo o porta-voz, adiciona camadas de profundidade à experiência: expressões faciais, linguagem corporal e recursos visuais tornam as conversas mais envolventes, enquanto gráficos, imagens e vídeos de apoio enriquecem o conteúdo.
Apesar do foco em vídeo, o áudio puro continua estratégico, permitindo que criadores publiquem apenas o arquivo de áudio com imagem estática ou onda sonora.
A integração com o YouTube Music, que possibilita ouvir com a tela desligada, reforça a experiência híbrida, combinando áudio e vídeo.
Spotify impulsiona produções em vídeo
O Spotify também vem investindo em videocasts. A plataforma lançou seus primeiros podcasts em vídeo no Brasil em 2022, com Psicologia na Prática, de Alana Anijar, e o Podpah Verão, em parceria com o Grupo Podpah.
Entre 2024 e 2025, o consumo de videocasts cresceu 70%, enquanto a base de ouvintes mensais subiu 90%. Em 2025, sete dos dez podcasts mais populares da plataforma já tinham versão em vídeo (Spotify, 2025).
Camila Justo, head de podcast do Spotify no Brasil, destaca que os formatos audiovisual e em áudio se complementam:
“Os podcasts em vídeo adicionam camadas visuais que ampliam a conexão entre criadores e ouvintes, trazendo expressões, gestos e interações que o áudio não consegue transmitir. Nosso trabalho é capacitar os criadores com ferramentas, visibilidade e suporte para que explorem o vídeo com autenticidade.”
Entre os destaques em vídeo estão Mano à Mano, que chega à quinta temporada com produção visual exclusiva, e a Spotify Creators Home, espaço temporário criado em 2024 que recebeu nova rodada de gravações para apoiar diferentes perfis de criadores, como Gostosas Também Choram, Sofia em Off, Cartas para Pepita e Não é por Akhaso.

Gravações no Spotify Creators Home em 2025 (Crédito: @h.agst)
A plataforma também mantém programas de incentivo a criadores independentes, como Radar Creators, Creator Academy e Amplifika Creators, que oferecem suporte técnico, ferramentas de monetização e visibilidade editorial.
Segundo a executiva, métricas de engajamento, como retenção de audiência, são mais relevantes do que o número absoluto de plays.
Oportunidade para anunciantes
Segundo o Spotify (2022/2023), 63% dos entrevistados se sentem mais ligados a apresentadores de podcasts do que a âncoras de TV, e 75% consideram os hosts decisivos em escolhas de compra.
A Nielsen Brasil aponta que dois em cada três ouvintes prestam mais atenção aos anúncios em podcasts, com atenção até duas vezes maior do que à TV, e 48% dizem ser mais propensos a comprar após recomendação do podcaster.
A Kantar (2025) indica ainda que 60% dos anúncios têm melhor desempenho quando acompanhados de elementos visuais.
Camila Justo reforça que a força do formato está na intencionalidade do consumo, destacando que “as pessoas acessam o Spotify para se conectar, não apenas para passar o tempo”.
“Isso gera uma audiência mais qualificada, engajada e valiosa. Trabalhamos para mostrar às marcas que esse não é um espaço de consumo passivo, mas um ambiente de troca e relacionamento”, completa.
O Spotify também oferece integração com o APOIA.se e recursos de monetização direta na plataforma, permitindo que criadores rentabilizem o conteúdo e que marcas participem de forma estratégica.
Concorrentes observam com cautela
Enquanto YouTube e Spotify investem no formato, concorrentes tradicionais avançam com mais cautela.
A Deezer afirma que “ainda não disponibilizamos a ferramenta de videocast, mas contamos com uma equipe de P&D focada em aprimorar as funcionalidades do app”, enquanto a Amazon Music optou por não comentar sobre estratégias.