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Opinião

Hora de servir comida quente e dar wi-fi no estádio

Acabou o tempo em que as marcas podiam oferecer uma boa narrativa junto de uma experiência murcha


20 de outubro de 2023 - 14h47

É o meu primeiro dia nas montanhas geladas de Banff, Canadá, acompanhando o The Gathering 2023, um evento que acontece há dez anos e que propõe uma imersão no mundo das marcas, se aprofundando nelas não somente sob o aspecto do branding ou da publicidade, mas também da cultura corporativa, do propósito e da conexão com seus públicos. Uma exploração que inclui desde marcas automotivas, como Range Rover e Jeep, até da economia dos games, como Nintendo e Call of Duty, em meio a outras tão distintas como Barbie, Netflix, Gatorade e Converse.

Para mim, um dos sofrimentos desse tipo de evento é escolher o que acompanhar, entre tantas conversas acontecendo ao mesmo tempo. Sempre vem aquele FOMO, “fear of missing out”, que é o medo de estar ficando de fora, perdendo o melhor da festa. Mas logo passa, quando começamos a embarcar nos conteúdos (e compartilhar as outras palestras via Otter, vídeos e fotos), saltar de um ambiente para outro e fazer conexões entre os diversos pensamentos.

Nesse dia, uma das coisas que me chamou a atenção foi como, em diferentes setores, países ou modelos de negócio, se percebe cada vez mais a necessidade de cada marca superar continuamente as expectativas de sua comunidade (mais do que um “público ou audiencia”, as marcas cada vez mais precisam pertencer às comunidades que uma vez criarem). Atender em suas expectativas no mundo real, e não apenas em uma narrativa convincente. Em minha opinião, uma visão interessante de inovação contínua, sem que nenhuma vez tenha sido citado esse termo.

Essa conclusão foi mais forte do que nunca no painel “Build Raving Fans – Regardless of your Industry” (numa tradução livre, “Como criar fãs enlouquecidos – Independente de qual seja o seu setor”). A sessão reuniu os responsáveis pelo marketing de diversos times de sucesso, em uma improvável combinação de esportes. O lendário Tim Harris, CEO dos Lakers, a equipe mais vitoriosa da história da NBA. Matt O’Neil, CMO dos Dallas Cowboys, que que estão brigando pelo primeiro lugar na conferência Leste da NFC, a liga do futebol americano. Kris Knief, CSO dos Vegas Golden Knights, uma equipe de hóquei criada no deserto do árido estado de Nevada, que nasceu em 2017 mas já conquistou a Copa Stanley na última temporada. E Kathryn Dobbs, CMO dos Columbus Blue Jackets, um time de hóquei de menos destaque, do estado de Ohio. Para todos, a conclusão é que a barra das entregas subiu muito nos últimos anos. Atender a comunidade não é o suficiente: é preciso superar expectativas de forma contínua e, para isso, disciplina é a palavra do jogo.

Obviamente estão falando dos Estados Unidos, onde os negócios do esporte são infinitamente mais organizados e profissionais do que no Brasil, e onde as cifras envolvidas também são muito maiores. Mas, como observaram os organizadores, esse aumento da exigência é uma realidade comum a todas as marcas no mundo de hoje. Como um apaixonado pelo meu clube e por futebol, acredito que já passou da hora dos clubes brasileiros irem atrás destes tipos de referências.

“Costuma-se dizer que esportes são um pouco diferentes de negócios comuns, porque os torcedores, os clientes, vêm até você, não é preciso inventar truques para atraí-los. Eles legitimamente querem saber do seu produto”, raciocinou Matt O’Neil, dos Dallas Cowboys. “Só que isso vem com um peso”. O gestor dos Vegas Golden Knights exemplificou como isso não é fácil. “Pense que em Las Vegas nós estamos competindo com todos os outros entretenimentos que existem na cidade. Se não nos destacarmos, ninguém irá comprar ingresso e visitar a arena”. Mesmo para os Lakers, uma das mais famosas marcas do esporte no mundo, a vida não é fácil. “Antigamente as pessoas vinham ao ginásio e a expectativa era de comida horrível, pretzel frio e duro. E era OK, porque ninguém ligava. Agora as expectativas cresceram muito, e chegam às vezes a ser irrealistas”, comentou Tim Harris.

A tecnologia mudou o jogo em muitas coisas, e o aumento de exigência também trouxe oportunidades. Anos atrás, Mark Cuban, investidor, empresário do esporte e apresentador do programa Shark Tank, escreveu um artigo sugerindo que deveria ser proibido levar celulares para o ginásio. “Naquele tempo, se tínhamos wi-fi suficiente para 15% do público, era muito. Hoje é preciso ter para pelo menos 80% dos frequentadores ou todo mundo reclama”, contabilizou Harris. O lado positivo é que, com as pessoas usando uma segunda tela em pleno jogo, surgiram possibilidades de interagir em tempo real, comunicar e até vender para sua comunidade, durante a partida, quando a empolgação também é alta. No final do jogo, trabalhar bem com suas comunidades é cada vez mais o caminho das marcas, porque a tecnologia favorece isso. “Agora não pensamos como uma marca de time, pensamos como uma marca de estilo de vida. Nosso público não inclui somente as pessoas que frequentam nossa arena. Ele inclui também aquele garoto na Austrália que nunca veio ao nosso país, mas gosta da gente e quer comprar nosso boné. E nós queremos estar com ele”, conclui Knief, dos Vegas Golden Knights.

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