Quem não se atualiza se trumbica
O jovem está atualizando seu comportamento de consumo não só de produtos, mas de conteúdo e de relação com sistemas tradicionais de busca
O jovem está atualizando seu comportamento de consumo não só de produtos, mas de conteúdo e de relação com sistemas tradicionais de busca
Lembro até hoje a primeira vez em que tive contato com um meme. Eram os idos de 2000 e da banheira do Gugu quando recebi por e-mail, assim como os incas faziam, um link para um vídeo no YouTube. O vídeo em questão era O Cara Tussiu, uma animação brincando com a música-tema do Jaspion “traduzida” exatamente como ela era ouvida em português.
E esse foi apenas o começo de um período de deliciosos memes em vídeo: As Árvores Somos Nozes, Os Irmãos Crazy Frog, Trololó, Padre Quemedo, Rivaldo Sai Desse Lago e Tapa na Pantera são só alguns que me vêm à mente neste momento.
Talvez por eu ter consumido tantos vídeos no começo do YouTube em uma época decisiva da vida, o início da fase adulta, é que até hoje ainda sigo acompanhando muito conteúdo por lá. Além dos memes e entretenimento, vejo tutorial de como consertar a rebimboca da parafuseta até vídeos de professores explicando questões de lógica (esse último é um vício adquirido, confesso).
O YouTube funciona pra mim como fonte de diversão e de conhecimento. Muitas vezes, os primeiros resultados de busca do Google são vídeos respondendo à minha pergunta. E eu segui consumindo vídeo dessa forma por bons anos, até surgir o TikTok.
A idade chega e com ela nem sempre ficamos mais sábios, mas quase sempre ficamos pra trás.
Desde meados do ano passado, tenho convivido com mais pessoas de gerações posteriores à minha e então percebi que todas as minhas referências, todo meu conhecimento adquirido de conteúdo e memeria já são peças de museu. Por exemplo, se para mim o capeta em forma de guri é a música do Sérgio Mallandro (que por sinal é uma versão de uma música norte-americana da década de 1970), para outra pessoa é uma referência do Hermes & Renato. E para outra pessoa ainda mais nova não quer dizer coisa alguma!
E o caminho inverso funciona da mesma forma, ou você já se aventurou em duas horas de gameplay de Minecraft? E por acaso você já ouvir falar na Belle Belinha? Xurrasco?
A geração Z quase não consome vídeo no YouTube, o lance é o TikTok, mas isso todo mundo já sabe. Talvez por já nascerem digitais, por terem acesso a tanta informação, tudo que dure mais de 1 minuto cansa. Mas, talvez por ser uma geração com um humor muito peculiar, com uma pós-ironia, que acha tudo anterior muito cafona, muito desatualizado, é definitivamente uma geração muito criativa para produzir conteúdo.
Por vaidade de não me sentir velha e por fora do mundo “xovem”, e por trabalho, assim que surgiu o TikTok me aventurei e lá fui eu ser a tia do rolê que tenta se atualizar de tudo. Como sabemos, o algoritmo é o grande trunfo da rede. Alguns gostam de treiná-lo para receber sempre mais conteúdo customizado, outros (como eu) gostam de tentar enlouquecê-lo.
Um dia eu assisto a tudo do Toguro, no outro dia eu vejo dancinha, no outro estou vendo vídeo de como perder o BV. Um belo dia estava na busca do TikTok e comecei a pesquisar “como perder peso” (estava prospectando uma nutricionista) e a lista de resultados prévios mostrou o termo “como perder o BV”.
Logo pensei que BV poderia ser bônus de veiculação, ou gíria para alguma outra coisa, como boletos da vida, bolo de vento, ou qualquer nonsense dos jovens. Mas não, era boca virgem mesmo. Opa, ali acendeu uma luz, então TikTok não é só dancinha? Pois é, não.
Assim como a minha geração pesquisava tutoriais no YouTube (um beijo a todos os jogadores de Skyrim desse mundão), a nova geração está pesquisando no TikTok, só que com muito mais afinco!
Essa descoberta empírica não estava isolada. Não sou trend setter nem futuróloga, só repeti um comportamento pessoal e esbarrei em uma tendência de mercado. E, agora, vamos aos fatos.
Dentre o 1 bilhão de usuários ativos mensalmente no mundo que usam o TikTok, 60% são da geração Z. A média de uso diário desses jovens na rede é de 82 minutos. A popularidade da rede é maior que o acesso aos streamings. Então, é de esperar que, estando imersa tanto tempo na rede, ela ganhe cada vez mais importância na vida prática dessa geração.
Um estudo recente mostrou que 40% dos jovens preferem perguntar ao TikTok quando querem saber a qual restaurante ir, como cortar cebola ou como perder o BV. O TikTok está se tornando um balcão único de oferta de conteúdo e funciona de uma forma que estimula o usuário a não sair de lá.
“Eles sabem o que eu quero ver, dá menos trabalho eu pesquisar por lá do que ir até o Google”, foi um relato que vi recentemente sobre essa questão. Enquanto a geração millennial vai ao Google procurar dicas do que fazer em Fortaleza, a geração Z só precisa rolar por alguns vídeos curtos do TikTok. E isso muda todo o cenário de possibilidades para nós que trabalhamos com publicidade.
Pensando nesse cenário e comportamento atual, eu me pergunto: vale mais a pena tentar ser a marca descolada que faz dancinhas e trends ou ser a marca que ajuda e responde às dúvidas dos jovens? Por que concorrer com influenciadores se podemos atuar em uma frente muito mais relevante?
São perguntas que ficam na minha cabeça a cada dia que eu me aventuro mais e mais nesse mundo do TikTok. Todo dia eu caio no mar de conteúdo e todo dia eu testo uma pesquisa diferente. E me pego presa na rede mais nos resultados dessas pesquisas do que nos vídeos de sugestão ou das pessoas que eu sigo.
O jovem está atualizando seu comportamento de consumo não só de produtos, mas de conteúdo e de relação com sistemas tradicionais de busca. Considerar a rede apenas um espaço de dancinha e entretenimento pode ser um erro grave que pode atrapalhar muito a comunicação da marca.
Mas agora deixe-me ver o que o ChatGPT tem a dizer sobre essa questão! 😉
Compartilhe
Veja também
Marketing de influência: estratégia nacional, conexão local
Tamanho do Brasil e diversidade de costumes, que poucos países têm, impõe às empresas com presença nacional o desafio constante de expandir seu alcance sem perder de vista a conexão com as comunidades
O novo eixo na comunicação das marcas
A base (fraca) do modelo persuasivo está sendo substituída pelo informativo