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Opinião

Sobre 40 anos, 42 km e 21 anos de criação

Corredores e criativos experientes sabem como poupar energia e não sofrer à toa


7 de junho de 2016 - 10h10

Não é fácil fazer 40 anos. Não me venha com essa de que os 40 são os novos 30. Quarenta são os velhos 30 mesmo. Tudo piora quando você vive rodeada pelos novos 20. Mas é inevitável e chegou a minha vez.

Para tornar essa data menos senil, resolvi fazer uma coisa bem jovem: correr 42 quilômetros. E aprendi mais em 42 quilômetros do que dos 20 aos 30 anos. Dizem que você conhece uma pessoa quando dá poder a ela. Devo dizer que você conhece a si mesmo quando está no limite das suas forças: cabeça e corpo trabalhando juntos pela sua sobrevivência.

Na maratona você sente tudo: ansiedade, euforia, desespero, raiva, felicidade, sofrimento, dor, apatia, inveja, medo… Tudo começa com você tentando não ter um ataque cardíaco mesmo antes de começar a correr. Você chega na largada e te colocam num lugar que parece um brete que segura os bois antes do rodeio (desculpem, minha mãe é de Barretos). Somos separados por faixa de tempo. Menti que iria fazer a prova em 3h e 15min. Coisa que só seria possível se pegasse uma carona de moto no meio do caminho. Mas me disseram que não é bom largar lá atrás (onde seria meu tempo real).

Passar uma linha, muda tudo. É emocionante. O coração acelera com as passadas e com milhares de pessoas batendo palminha pra você. Depois de alguns quilômetros você se acostuma com a gritaria e a ansiedade vai passando. Daí você começa a viver um período meio apático, mecânico. Entra na tal de velocidade cruzeiro e segue nesse mood musiquinha de elevador até os 21.

Eis que entra em cena o pânico, o desespero. Você já se sente passado no moedor de carne e ainda tem mais 21k pela frente. Cheguei nos 30 e me deu uma esperançazinha de que os 42 não seriam um sonho distante. Só mais 12k. Só mais 11K, Só mais 10… Aí começou o “The Walking Dead”. As pessoas começam a implodir na minha frente. Diminui o ritmo a cada corpo que eu passei. Fiquei mega impressionada com um corredor musculoso sendo atendido por paramédicos, com direito a massagem cardíaca e tudo. Senti muito medo de morrer também.

Mas no quilômetro quarenta você só quer acabar, daí entra a raiva. Acho que a gente precisa dela pra terminar. Acabou. Uma sensação absurda de felicidade entra em você como um Gatorade gelado. É muito bom virar maratonista. Me senti o Leonardo de Caprio e quis gritar “I’m in the top of the world! ”

Mas sabe, já senti tudo isso. Num período bem mais longo do que 4 horas, vivi essa jornada de sentimentos nos meus 21 anos de criação.

No começo só de ter uma cadeira no departamento mais cobiçado da agência era uma alegria sem fim. Mas aí a realidade te estapeia na cara e você descobre que seu papel é fazer folhetos e esperas telefônicas. Ou seja, vai treinando aí, quem sabe um dia você vira “corredor”. O dia-a-dia te engole, segue a vida.

Até que um dia alguém deixa você fazer um job legal. A maratona dos jobs. Não é aquele jobzinho 10K, é uma maratona com verba!

Assim que chega o briefing você acha que não vai conseguir. Dá um embrulho no estômago. Mas aí você passa dias rachando a cuca, olhando referência, se torturando.

De repente, sem aviso, vem aquela ideia supimpa, brilhante, fodástica! Você se sente o máximo, como depois de 42km.

Corredores experientes, ops, criativos experientes, lidam melhor com essa jornada. Sabem como ninguém poupar energia e não sofrer à toa.

Mas um job bom é sempre uma maratona. Doí muito, mas quando acaba é bom demais.

Quero correr e criar até os 80 anos. Sei que o corpo e a cabeça não vão ter o ritmo de antes. Mas é lindo ver um senhor passando por você com passadas firmes. É lindo demais ver um criativo mais velho mandando ver no meio da molecada. Ele sabe o que faz. Quero ser ele. Vou treinar pra isso.

Até lá, deixa eu correr aqui que tem um job pra entregar.

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