Pyr Marcondes
25 de junho de 2019 - 6h40
Quem me lê há algum tempo sabe que, nos últimos cinco anos, ou mais, tenho sido um crica enchendo os piquá das agências de propaganda no Brasil, na tentativa e busca de alertá-las não só para as transformações em curso, mas principalmente para sua aparente letargia em se adaptar ao novo. O inevitável novo.
Pois tenho tido, mais recentemente, em contrapartida, a enormemente grata surpresa de constatar que, não porque tanto falei, mas porque a realidade se tornou finalmente incontornável, as agências brasileiras resolveram, de fato e na prática, se mexer. E o que estamos vendo agora é um sem número de novos modelos em fase de desenvolvimento e teste. Eba!
Sou capaz de afirmar que não há agência em operação no País hoje que não esteja revendo suas filosofias, estruturas e ofertas de valor, cada qual a seu jeito, é claro, mas todas buscando responder aos desafios renovados de construir marcas e falar com consumidores num universo em profunda transformação, que é o que as agências de propaganda fazem de melhor. E com uma excelência única.
Isso é bom. Aliás, isso é ótimo. E, de resto, inevitável, para quem quiser sobreviver.
Alerto aqui, contudo, que o que chamo de inevitável há algum tempo, seguirá inevitável, e se trata da migração massiva do consumidor e do consumo para os ambientes digitalmente distribuídos, para as plataformas de contato interativo, para os ambientes de ativação online e always on.
Isso não significa nem que os canais de conteúdo e mídia, nem que as experiências vivas do mundo real, offline, vão desaparecer. Nem ferrando. Seguirão relevantes. Mas mesmo essas, cada vez mais, estarão integradas e serão ativadas pelo espectro sem fim da onipresença digital.
Boa notícia para as agências que entenderem que não se trata somente de reavaliar seu próprio modelo de negócio, o que seria olhar miopemente apenas para seu próprio umbigo e ver como ganhar um troco. Mas de observar e entender, de forma mais generosa e estrategicamente mais inteligente, as novas verdades do mundão lá fora. Ver e enxergar como está se comportando a nova sociedade e os novos consumidores. E construir, a partir daí, ofertas de valor que encantem toda essa gente.
No caminho, seus clientes-anunciantes serão encantados também. E o troco virá.
Essa é a lógica. De fora para dentro, não o contrário.
Nessa linha, destaco que a expansão do chamado “digital” na absorção dos recursos de marketing vem sendo crescente, como todos temos tido oportunidade de presenciar.
O recente estudo do IAB Brasil Digital Adspend dá conta de que cerca de 1/3 das verbas de mídia do País são hoje já destinadas ao mundo digital. Isso deve crescer.
Aposto com você que os volumes de investimento em marketing serão 50% digitais em três anos e 70% em cinco.
Ousada essa previsão? Nem um pouquinho.
Explico por quê.
Começo revelando que peguei você num truque baixo nessa frase aí da previsão. E você caiu direitinho.
Marketing não é mídia. Ou seja, pra começar, o universo que abrangi com a fase vai bem além do universo medido pelo IAB … adspend … investimentos em advertising. Advertising é publicidade, um teco dos investimentos em um universo maior, o da Comunicação, que por sua vez, é só um teco dos investimentos totais em marketing.
Vou ainda mais adiante, questionando a essência do conceito de mídia, afirmando que, em dois anos, vai ficar difícil dizer o que é investimento em TV. Por exemplo.
O que será TV? O conteúdo de uma rede de TV por assinatura transmitido em um canal do You Tube é TV? E o mesmo conteúdo visto a partir de um player no celular, é TV? E se esse mesmo conteúdo estiver disponível na Alexa, que já terá uma tela em dois anos, é TV?
O mundão digital lá fora, em cinco anos, vai incorporar distribuição e ativação de serviços, conteúdos e experiências em aparelhos conectados que nenhum estudo ou levantamento de investimentos em marketing mensura hoje. Em cinco anos, com tudo isso já rolando, e com a simples evolução do que já temos em operação agora no mercado, imaginar que 70% dos investimentos de marketing serão digitais corre o risco de ser uma previsão conservadora, uma vez que quase nada será não-digital. Percebe?
É para esse mundo que as agências brasileiras precisam estar preparadas.
Estou falando da distribuição de conteúdos e experiências através de plataformas móveis, de apps e de streaming; da criação e produção de formatos nascentes como esports e gaming; de podcasting e messaging; e do onipresente e-commerce, que hoje não é só mais um canal de distribuição, mas uma plataforma de ativação recorrente na vida das pessoas (basta ver o movimento da Amazon e Apple, entre outros, se transformando em players de conteúdo, entretenimento e mídia).
Tudo isso passa, agora, a ser um novo ambiente mercadológico de atuação possível. O que, longe de significar um problema, pode e deve ser encarado como uma enorme nova oportunidade de geração de novas receitas.
De novo, isso é bom. Aliás, isso é ótimo!
Uma nova página da história das agências de propaganda no Brasil, potencialmente muito promissora, está sendo escrita exatamente agora. Bora escrever direito?