Economia em terceirização não recupera valor de marca
Roberto Kanter explica que um sólido trabalho de cultura corporativa é essencial para evitar mortes como a ocorrida dentro de supermercado Extra
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Teresa Levin
22 de fevereiro de 2019 - 18h00
A morte de Pedro Henrique Gonzaga, de 19 anos, dentro do supermercado Extra, no Rio, após ser mobilizado pelo segurança Davi Ricardo Moreira Amâncio, gerou uma série de reações negativas na internet, com acusações de assassinato e preconceito racial. Com a probabilidade de o funcionário ser acusado de homicídio doloso, já que foi confirmado o estrangulamento do jovem, e a reação nas redes sociais, o caso também joga à luz sobre temas que envolvem a cultura corporativa das empresas, os riscos da terceirização de serviços e ainda os impactos de um acontecimento como este para uma marca.
Procurado pelo Meio & Mensagem, o Extra compartilhou em comunicado oficial que “não aceita qualquer ato de violência, excessos e repudia toda forma de racismo”. No mesmo texto, reforçou que não irá se “eximir das responsabilidades diante do ocorrido e tem total interesse em esclarecer a situação o mais rápido possível, colaborando com as autoridades e fornecendo todas as informações disponíveis”. Nesta semana, também anunciou que rescindiu o contrato com a prestadora de serviços responsável pela contratação do segurança, antes mesmo da conclusão do processo de investigação.
O fato ainda ocorre em sequência a diversos incidentes envolvendo grandes empresas e fatalidades, desde a cadela Manchinha morta por segurança no Carrefour, até a responsabilidade da Vale na tragégia de Brumadinho (MG). Sobre esses casos e seu impacto sobre reputação de marca, Meio & Mensagem conversou com Roberto Kanter, professor de marketing do MBA da FGV e diretor da Canal Vertical.
Meio & Mensagem – Como a imagem do Extra pode ser afetada com a repercussão da morte ocorrida dentro do supermercado?
Roberto Kanter – Hoje vivemos a questão da cultura do corporativo. Se perguntarmos ao francês do Cassino, ao GPA, se isso seria uma coisa plausível, é óbvio que dirão que de jeito nenhum. Infelizmente são decisões de “CNPJ” tomadas por “CPF”. Quando o “CPF” é terceirizado ou quarteirizado, perde-se este elo da cultura da corporação. Os danos a marca em outro país seriam maiores. Infelizmente somos um País com uma péssima memória, seletiva, horrorosa. Só lembramos os momentos bons, não os ruins. O que aconteceu com Brumadinho é inadmissível. Em qualquer outro país do mundo a Vale teria quebrado ou sido dividida, vendida, já por causa de Mariana (MG). Participo ativamente do Flamengo, sou flamenguista doente, chorei com as mortes no Ninho do Urubu e choro pela maneira como lidamos com as coisas.
Entendo a posição da terceirização e eventual quarteirização, mas não adianta fazer isso orientado pelos custos sem ter o cuidado de implementar a cultura corporativa. Quando erros absurdos como este acontecem, é um sacrifício para a marca e o valor de marca
Qual o dano efetivo que o Extra terá enquanto marca?
Vai depender muito da postura deles. Falou-se que foi o segurança do Extra, tive a sensação que o fato de ter uma empresa de serviços terceirizados possa ter amenizado o fato. Mas toda vez que uma marca tem um problema sério como esse, será afetada em seu valor e no dia a dia da operação, a depender do quanto esta questão estará dentro do que chamamos de engajamento popular. Neste mundo de consumidores engajados, é o que vai aumentar ou diminuir o tamanho das consequências para a marca. Essas são as vantagens ou não do empoderamento do consumidor, se as pessoas vão se mobilizar ou não em relação ao fato, aumentando ou não sua extensão. No ano passado a JBS foi tremendamente afetada pela ligação da marca com a Lava-Jato. A Friboi foi muito impactada do ponto de vista de receita, mas seis meses se passaram e as pessoas já compram Friboi se estiver mais barata. Como disse, temos uma péssima memória.
Você fala em terceirização e quarteirização, algo comum no varejo.
Existe uma tendência em todo mundo, e aí falamos da operação no varejo, que é de extremo volume e com margens reduzidas, com uma busca de eficiência, que faz com que as empresas estejam o tempo todo buscando terceirizar e, eventualmente quarteirizar. Quando isso é feito, o maior problema é a cultura, algo ligado ao intangível da sua marca. É neste momento que temos uma incoerência, uma contradição ambulante das empresas. Ao mesmo tempo que o diretor de marketing sabe da importância da marca, o diretor financeiro está o tempo do apertando o pé no freio e buscando redução de custos. Terceirizados, às vezes quarteirizados, não entendem a cultura corporativa. Ano passado, a United Airlines retirou a força quatro passageiros de um voo e isso viralizou no mundo inteiro. O ceo foi mandado embora. Neste caso, ainda eram funcionários os envolvidos mas a empresa perdeu, imagine, US$ 12,3 bi em uma semana.
Como as empresas podem fazer um trabalho de prevenção?
Elas tem que trabalhar a questão da cultura corporativa. Entendo a posição da terceirização e eventual quarteirização, mas não adianta fazer isso orientado pelos custos sem ter o cuidado de implementar a cultura corporativa. Quando erros absurdos como este acontecem, é um sacrifício para a marca e o valor de marca. É importante o gestor financeiro ter noção do que 10% a menos no valor de marca representa nos indicadores e bônus dele para tomar decisões um pouco menos orientadas pelo custo, mas mais com uma visão de longo prazo. Buscar este equilíbrio é um desafio constante de todo gestor, que as empresas enfrentam, o tempo todo.
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