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Opinião

Socorro

Nesses tempos desconexos, o que nos conecta? O que gera a tal empatia?


13 de setembro de 2022 - 9h00

(Crédito: Mary Long/Shutterstock)

Tenho a sorte de ter um grande amor do meu lado, meu amor romântico, minha vida. Mas o que existe para além do amor romântico particular e íntimo? Que emoções além do amor romântico nos conecta?

Em tempos de desconexão, quem tem um sentimento já não é alma penada ou depenada. Nunca a música do Arnaldo Antunes fez tanto sentido:

 

Socorro, não estou sentindo nada

Nem medo, nem calor, nem fogo

Não vai dar mais pra chorar

Nem pra rir

Socorro, alguma alma, mesmo que penada

Me empreste suas penas

Já não sinto amor nem dor

Já não sinto nada

Socorro, alguém me dê um coração

Que esse já não bate nem apanha

Por favor, uma emoção pequena

Qualquer coisa

Qualquer coisa que se sinta

Tem tantos sentimentos, deve ter algum que sirva

(…)

 

Parece meio dramático, mas, se formos sinceras, tem tanta ansiedade pairando no ar, tanto cheiro de pão mole, tanto mofo de sentimentos embotados, que buscamos alguma coisa para nos fazer sentir novamente. Algo que seja uma via paralela do amor romântico, outro tipo de amor.

Pode ser um momento particular que vou dividir com vocês, mas pra mim existe um desejo de remexer dentro para ver se a emoção vem à tona. E qualquer coisa serve: vídeo de cachorro, de gato, jornada de herói que ajuda o próximo, história de superação, de amor, de empatia.

Nesses tempos desconexos, o que nos conecta? O que gera a tal empatia? Essa emoção que o outro nos desperta ou não, nos conecta ou não.

Tenho pensado muito sobre isso. Qual é a tecnologia do afeto? Qual é o repertório de vida que precisamos ter para acessar essa plataforma de emoções que parece ter os botões muito distantes dos nossos dedos? Aqui de onde eu observo, parece uma plataforma invisível que faz seus cálculos e chega aos seus números de sentimentos de forma aleatória e muitas vezes contraditória.

Quem são as pessoas que nossa alma escolhe? Por que elas, e não outras? Tenho tentado hackear esse mistério. Observo com atenção as escolhas da minha alma e penso o que elas têm em comum entre si e comigo. A resposta: não tenho a menor ideia. Essa é a verdade.

Tenho feito um exercício para mudar o ponto de observação e tentado olhar o coletivo, os grupos. Vou pedir licença para os moços sensíveis que estão por aqui também, mas há uma turma em particular que tenho prestado mais atenção, talvez por estarmos juntas aqui nesse encontro mensal, talvez pelo momento do mundo, talvez pelo desejo da minha alma: as mulheres.

Mulheres de todos os jeitos, formas, crenças e pensamentos. Que coisa interessante essa de acessar a emoção por um grupo. As mulheres têm me emocionado, eu confesso. Não sei se por um quê de tristeza, um quê de abandono por tanto tempo, um quê de força, um quê de coragem ou de vontade. É a tal da conta invisível fazendo seu trabalho. Tenho olhado com atenção, com zelo, com intenção de admirá-las, de percebê-las, de senti-las.

Tenho me dedicado a elogiar todas que consigo ver algum detalhe, alguma coisa que me chame a atenção.

Acho que nos olhamos pouco, passamos tanto tempo entendendo que deveríamos competir que não nos enxergávamos como grupo, pois somos mu-lhe-res.

Mulherada, talvez essa seja uma chave: vamos nos elogiar mais, nos ver mais, nos falar mais.

A gente olha embotado porque embota por dentro. Ficamos tão alheias a nós mesmas e às outras que vamos crescendo no ensimesmamento de algo que só conta no tempo que não passa. Em tudo o que é realmente importante, o tempo não é protagonista. Nem percebemos que ele está perto.

Por mais coisas que realmente importem em nossas vidas, por mais olhares admirados. Por mais amores despretensiosos. Por mais nós de nós.

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