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Cannes, criatividade e quebrada: quem está realmente acessando o quê?

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16 a 20 de junho de 2025 | Cannes França
Diário de Cannes

Cannes, criatividade e quebrada: quem está realmente acessando o quê?

A real transformação não acontece na premiação, mas no que a gente faz depois que as luzes do palco se apagam


20 de junho de 2025 - 12h37

Vivemos o auge da era da informação. Inteligência artificial, ferramentas poderosas, dados ao alcance de um clique. Dizem que o jogo está mais justo. Que agora todo mundo tem acesso. Mas será mesmo?

Enquanto celebramos festivais como Cannes, um espaço legítimo de reconhecimento da criatividade, precisamos fazer uma pausa para refletir: quem está de fato ocupando essas cadeiras? Quem está sendo ouvido? E mais importante: quem teve que atravessar quantas pontes para conseguir ouvir?

A quebrada também cria. Aliás, a quebrada resiste criando. Enquanto alguns têm o privilégio do acesso natural à educação, ao networking, à visibilidade, outros precisam hackear o sistema todos os dias para ter o mínimo.

Para esses, o processo criativo não é uma escolha, é uma sobrevivência com propósito.

E mesmo assim, é dessa margem que surgem as ideias mais originais, as narrativas mais fortes, os olhares mais sensíveis. Porque quem vive na periferia não apenas observa o mundo sente, ele na pele.

Criatividade com fome é potência

Aos jovens que estão começando: sim, o caminho é mais pesado, mas vocês carregam algo que muitos ainda estão tentando comprar ou simular: verdade. A criatividade que nasce da falta, da urgência, da ausência de atalhos, essa é a mais potente. E o mercado precisa disso.

Agora, aos líderes que leem esse texto e já estiveram (ou estão) em Cannes, fica a pergunta: o que vocês estão fazendo com toda essa informação, esses contatos, esses cases, esses troféus? Como esse capital simbólico e intelectual está voltando para as bases do nosso país?

Estamos construindo pontes ou apenas colecionando prêmios?

Porque no fim, criatividade sem acesso é privilégio disfarçado. E a real transformação não acontece na premiação, mas no que a gente faz depois que as luzes do palco se apagam.

Não basta aplaudir, tem que abrir caminho

A indústria criativa precisa parar de romantizar a periferia como “fonte de inspiração” e começar a enxergá-la como protagonista estratégica.

Não é só sobre contar histórias da favela. É sobre contratar quem vive lá, ouvir, investir, formar, e mais que tudo: compartilhar o acesso real.

O futuro da publicidade não está nos cases geniais, mas na coragem de derrubar os muros invisíveis que ainda separam o talento do recurso.

E se Cannes realmente quer ser um espelho do que há de melhor no mundo criativo, ele precisa refletir todos os rostos, inclusive os que vêm da beirada.

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