Comunicação

Morre Roberto Duailibi, o D da DPZ

Publicidade brasileira perde uma de suas maiores referências, que deixa legado de empenho pessoal na profissionalização e sedimentação de uma indústria forte e sustentável

i 18 de julho de 2025 - 23h37

Roberto Duailibi faleceu em São Paulo, aos 89 anos

Roberto Duailibi faleceu em São Paulo, aos 89 anos

Morreu nesta sexta-feira, 18 de julho, em São Paulo, o publicitário Roberto Duailibi, o D da DPZ, aos 89 anos. O velório acontecerá neste sábado, dia 19, no Cemitério do Morumbi, das 9hs às 16hs.

Duailibi era o único fundador da DPZ vivo, após os falecimentos de Francesc Petit, em 2013, e de José Zaragoza, em 2017.

Nascido no dia 8 de outubro de 1935, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, filho de pai libanês e mãe brasileira, Duailibi se mudou para São Paulo nos anos 1940 e iniciou sua carreira, em 1952, no departamento de propaganda da Colgate-Palmolive. A partir de 1956, trabalhou como redator em agências como CIN – Companhia de Incremento de Negócios (comprada pela Leo Burnett na década de 1970), JWT, McCann-Ericson e Standard Propaganda (incorporada pela Ogilvy & Mather em  1972), onde foi vice-presidente de criação. Em 1968 associou-se aos espanhóis José Zaragoza e Francesc Petit na fundação da DPZ, em São Paulo.

Entretanto, a trajetória da DPZ começou cerca de dez anos antes da criação da agência, com o estúdio Metro 3, uma sociedade entre Zaragoza (que deixava a JWT), o produtor gráfico Ronald Persichetti e Petit (então na McCann). Duailibi já colaborava para o estúdio como freelancer (enquanto gerenciava o escritório paulista da Standard, então a maior agência do País). Era comum que os três se encontrassem fora do expediente, em almoços de segunda-feira organizados na casa da mãe de Duailibi, no bairro do Paraíso, zona sul de São Paulo. Foi num deles que Duailibi foi convidado para ser sócio de uma nova agência ao lado de Zaragoza e Petit. Meio a contragosto, aceitou. “As pessoas fizeram bolões nas outras agências para saber quanto tempo ia durar. O Alex Periscinoto me disse, mais tarde, que apostou em três meses”, contou Duailibi à reportagem de Meio & Mensagem, em julho de 2013, quando a DPZ comemorou 45 anos. “Queríamos viver do nosso trabalho, e com dignidade”, disse, sobre a rotina pouco saudável que se costumava levar em agências multinacionais daquele período.

Francesc Petit,Roberto Duailibi, José Zaragoza., Div.Carol Carquejeiro-Valor-Folhapress 13-07-11

Francesc Petit, Roberto Duailibi e José Zaragoza: DPZ mudou a forma de fazer propaganda 

Em 1º de julho de 1968, em plena ditadura militar, nascia a DPZ, ocupando uma casa ampla – com direito a estúdio fotográfico – na Alameda Casa Branca, no Jardim Paulista, bairro nobre de São Paulo. Além dos três sócios, Persichetti tinha participação na agência – que deixou anos mais tarde para explorar o mercado gráfico, sua especialidade. Os primeiros clientes que deram estofo para a agência conquistar outros de maior porte foram a rede de revendedoras da Ford Borda do Campo e a Fotoptica. A estabilidade da empresa se confirmou nos três anos seguintes. Assim como a economia brasileira vivia um milagre, a DPZ passava a criar para ícones do capitalismo brasileiro, como o banco Itaú.

Da Alameda Casa Branca, a agência migrou para outro endereço, na esquina da avenida Brasil com a rua Augusta. O imóvel pertencia a um contato comercial de um grande veículo – portanto bem informado sobre o desempenho da agência – que segundo Duailibi “aumentava o aluguel a cada conta que ganhávamos”. Em 1971, o problema chegou ao fim: apesar de terem terreno comprado no Real Parque para construir uma sede, os sócios optaram por se mudar para um prédio próprio a poucas quadras de sua então sede.

Se por fora a agência impressionava, por dentro promovia uma pequena revolução na forma de se fazer propaganda – sobretudo no mercado brasileiro, anos atrás do que se fazia nos Estados Unidos e na Europa. A exemplo do que já vinha acontecendo na Alcântara Machado Propaganda (Almap) e em outras líderes de mercado, a DPZ adotava o esquema de trabalho de duplas de criação – nada mais natural quando dois dos sócios eram diretores de arte e o terceiro, redator. Algo lógico hoje em dia, o modelo era revolucionário numa época em que os então “layoutmen” ficavam em andares separados dos redatores e eram tratados com certo desdém.

Outra inovação era a participação dos criativos na apresentação de suas campanhas aos clientes – antes, os “contatos”, responsáveis pelo atendimento, é que se encarregavam da tarefa. O protagonismo da criação era sentido, também, na liberdade que gerou anúncios, conceitos e letterings incorporados pela cultura popular brasileira, como o Garoto Bombril, o Leão do Imposto de Renda, o franguinho Lequetreque da Sadia e o Baixinho da Kaiser. Ao mesmo tempo, a agência deu o primeiro emprego a alguns dos principais criativos brasileiros.

O modelo que a DPZ adotou ao colocar a criação como elemento primordial de seu negócio, algo inovador à época de sua criação, transformou o número 280 da avenida Cidade Jardim numa espécie de maternidade dos melhores criativos da história da publicidade brasileira, entre os quais Helga Miethke, João Palhares, Neil Ferreira, Washington Olivetto, Gabriel Zellmeister, Paulo Ghirotti, Camila Franco, Stalimir Vieira, Murilo Felisberto, Nizan Guanaes, Marcello Serpa, Tomás Lorente, Ruy Lindenberg, Carlos Righi, André Laurentino e Rafael Urenha.

Esse modelo de trabalho rendeu à DPZ a verba dos principais anunciantes da época – além do Itaú, a agência passou a atender Souza Cruz, Nestlé, Johnson & Johnson, Sadia, Bombril e Olivetti. Nas décadas seguintes, figuraram na carteira da agência marcas como Coca-Cola, Avon e Editora Abril. Outra vertente de lucros era o atendimento a verbas públicas. A DPZ foi responsável pelo atendimento à Petrobras Distribuidora, ao BNDES e à Prefeitura do Rio de Janeiro, entre outros.

A habilidade dos sócios em manter negócios e amizade caminhando em conjunto era explicada de forma pragmática por Duailibi: “Costumo dizer que o segredo da longevidade foi nunca ter nos reunido”. Segundo ele, trabalhar em andares separados (ele no sétimo, Zaragoza no sexto e Petit no quinto), a trajetória de saldo positivo nas contas ao final do mês e o uso de intermediários em questões do dia a dia permitiram que a empresa não se abalasse por atritos entre os sócios. “A proximidade é inimiga da longevidade. Nos encontramos todos os dias, mas sem tratar de questões profissionais. Sempre que havia desavenças, era entre dois dos sócios e o terceiro intermediava. Sempre houve equilíbrio.”

Adquirida pelo Publicis Groupe em 2011, a DPZ utilizou as três letras iniciais dos sobrenomes de seus fundadores até 2015, quando a holding francesa decidiu fundir a agência com a Taterka. Com o movimento, as três letras ganharam a companhia do “T”, inicial do sobrenome de Dorian Taterka, fundador da operação adquirida pelo Publicis Groupe no início dos anos 2010. Entretanto, em julho de 2022, a agência abandonou o “T” e voltou a usar sua marca original, composta pelas iniciais dos sobrenomes de seus fundadores. Atualmente, a DPZ é presidida por Benjamin Yung, que, em outubro do ano passado, recebeu Duailibi para comemorar na agência os seus 89 anos de vida.

Duailibi com o atual presidente da DPZ, Benjamin Yung, em outubro de 2024

Duailibi com o atual presidente da DPZ, Benjamin Yung, em outubro de 2024

Além de escritor, Duailibi foi professor e diretor de cursos da atual ESPM de São Paulo e presidente, por três gestões, da Abap: comandou a entidade por dois mandatos seguidos, de 1984 a 1987, e voltou à presidência na gestão 1993 a 1995. Em 1986 e 1987, ele foi bicampeão na categoria Empresário ou Dirigente da Indústria no prêmio Caboré. Em 2015, Duailibi foi o primeiro publicitário eleito para assumir uma cadeira na Academia Paulista de Letras (APL).

Duailibi deixa a esposa Silvia, os filhos Marco, Rubem e netos.