Erin Johnson: “Faria tudo de novo, foi o certo a se fazer”

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Comunicação

Erin Johnson: “Faria tudo de novo, foi o certo a se fazer”

Ex-global chief communications officer da J. Walter Thompson fala sobre o processo judicial à agência a ao ex-CEO da operação por assédio sexual


24 de setembro de 2019 - 6h00

Por I-Hsien Sherwood, do Advertising Age

 

Crédito: Tam Nguyen/Advertising Age

Oito meses antes de o movimento #MeToo começar a tomar forma em Hollywood, a chefe de comunicação global da J. Walter Thompson prestou uma queixa judicial contra a agência e o CEO na época. Erin Johnson acusou Gustavo Martinez de ter estabelecido contato físico inapropriado e proferido comentários machistas, racistas e anti-semitas, além de ter feito piadas sobre estuprar colegas.

Nos dois anos que se seguiram, o processo se arrastou pelas cortes. O WPP e o então CEO Martin Sorrell foram acusados de omissão em uma época na qual a maior parte das agências optava por tratar de tais assuntos na surdina. À medida em que escândalos de assédio da Martin Agency e da Droga5 emergiram, Erin foi colocada na posição pouco característica de profissional de RP – constantemente citada nas manchetes, mas impossibilitada de falar em público durante a litigação pendente.

Três anos e meio depois de formalizar a ação judicial e quase 18 meses depois de ter firmado um acordo com o WPP cujos termos não foram revelados, Erin está lidando com um cenário bastante diferente na indústria. Sorrell foi demitido da holding fundada por ele e agora está à frente da S4 Capital. O WPP finalmente rompeu vínculos com Martinez que, dois meses depois do acordo com Erin, pois, até então, o executivo tinha sido silenciosamente realocado na Espanha para comandar a operação do grupo no país.

Quanto à J. Walter Thompson, uma vez a agência de publicidade mais antiga do mundo, desapareceu, se transformou em Wunderman Thompson no final de 2018.

Durante um tempo, Erin deixou a indústria também, passando menos de um ano como chefe de comunicação da startup de tecnologia Gifnote, para a qual ela permanece como consultora. Ela falou com o AdAge sobre os custos pessoais por ter feito uma acusação formal contra assédio, o movimento #MeToo e o que pretende fazer em seguida. A conversa foi condensada e editada.

AdAge – A J. Walter Thompson se foi, se fundiu à Wunderman no ano passado. Como você se sente em relação a isso?
Erin Johnson – Muito triste. Deprimida. Um pouco brava. Era uma marca tão boa. Lembro-me de que trabalhei tão duro para celebrar o futuro no aniversário de 150 anos (em 2014), fui parte daquilo. Amava a marca. Ainda a amo. E estou triste de que não exista mais, é devastador para mim.

AdAge – Para pessoas que não passaram por assédio no trabalho, como você diria que é estar nesse tipo de ambiente?
Erin –
Infelizmente, acho que muitas pessoas sabem como é porque lidam com isso todos os dias. Acho que toda mulher tem histórias como a minha. É como a morte de milhares de cortes. E durante minha carreira, passei por todo tipo de coisa – comentários inapropriados, toques inapropriados. Disseram às mulheres, ou as ensinaram, que é assim mesmo.

AdAge – Como você decidiu que seu único recurso seria o processo judicial?
Erin –
Todo mundo tem uma linha. E quando essa linha é ultrapassada, é como não conseguir viver consigo mesmo a menos que faça algo sobre isso. Essa situação com o Gustavo em particular começou a cruzar a linha da minha capacidade de olhar a mim mesma no espelho e aceitar isso. É muito assustador. Sei que acredito em mim mesma. Sei que estou me defendendo, mas também sei do poder de uma companhia de bilhões de dólares. Você se questiona várias vezes. Lembro-me de conversar uma noite com meu marido, às três da manhã, discutindo o que fazer porque em um certo ponto eu sabia que tinha de processar ou então fazer nada. Ficava repetindo: “Isso vai se enraizar em nossas vidas. Não vai ser rápido. Podemos perder a casa, podemos perder tudo (por causa de taxas legais)”. E estava aterrorizada com o que poderia acontecer comigo. Você vai a lugares sombrios. Como poderia pagar as contas da hipoteca? Como sustentaria as crianças? Como continuaria a viver? Quem iria me contratar de novo? Ficaria na lista negra para sempre? E meu marido só dizia: “Querida, ninguém pode te tratar assim. Venderemos a casa. É só uma casa. Compraremos um apartamento. Só nós dois e as crianças importam. Você trabalhou muito duro e isso não é aceitável. Estou com você”. E ele tirou todo meu medo naquela noite, porque eu estava com tanto medo.

AdAge – Existe um consenso de que a holding lidou mal com seu caso. Como uma empresa deveria responder a alegações como as suas?
Erin –
Deve lidar imediatamente. Acredite nelas. Acredite e as apoie.

AdAge – O documento legal detalha suas condições de trabalho durante o processo. Mas quais foram os efeitos em outras partes da sua vida?
Erin –
Tenho um jeito de fazer piadas sobre isso para dissipar a realidade do medo e o estresse. Mas foi exaustivo, isolador, solitário. Você acorda pensando nisso, vai dormir pensando nisso. Tem pesadelos sobre isso. Quero dizer, foi minha vida por dois anos e ao mesmo tempo estava tentando ser uma boa mãe e parceira, é muito difícil.

E acho que as crianças absorveram muito do meu estresse. Tiveram muitas questões porque entreouviram certos nomes, então perguntavam “Quem é esse? Quem é aquele?” ou “Por que a mamãe está chorando? Por que a mamãe está tão triste?”. Tive de explicar a eles de uma forma compreensível para uma criança da pré-escola e uma do jardim da infância. Como explicar isso para uma criança?

AdAge – Diante de tudo isso, você alguma vez teve dúvidas? Já desejou ter ficado quieta ou ter mudado de emprego?
Erin –
Não, nunca. Nunca. Faria tudo de novo se precisasse. Foi a coisa certa a se fazer.

AdAge – Você estava sob litigação quando o #MeToo emergiu. Como foi assistir ao movimento se desdobrar mas não poder dizer algo?
Erin –
Acho que o New Yorker e o New York Times fizeram um trabalho incrível e qualquer mulher ou pessoa que se pronuncie é muito corajosa. Aplaudo qualquer um que se defenda, mas foram oito meses muito solitários. Fiquei sozinha por muito tempo.

AdAge – Como acha que seu caso influenciou o modo como o #MeToo se espalhou na indústria publicitária?
Erin –
Gostaria de pensar que meu caso teve um efeito multiplicador. Recebi e-mails e ligações de muitas pessoas no mercado que depois se manifestaram. Então sei que teve um impacto positivo.

AdAge – Você teve muito apoio das pessoas no mercado?
Erin –
É uma questão complicada, porque parte do problema é que a mudança ocorre quando as pessoas que estão puxando as cordas se mexem. Tem uma empresa que nos primeiros dias do meu processo escreveram um tweet maravilhoso sobre mim e sobre como me apoiavam. Daí três dias depois o post foi deletado. Isso foi devastador, mas também abriu meus olhos – vi que era assim que iria ser. Alguém deu um tapa na mão deles por me endossarem.

AdAge – Quem mais ofereceu apoio em particular?
Erin –
Teve muito apoio privado de pessoas que não podiam ir à público porque tinham muito medo de represálias, o que é muito triste. Sou a favor da transparência. Se não pode me apoiar publicamente, não se dê ao trabalho de me ligar de forma privada.

AdAge – Isso mudou depois de o processo ter sido estabelecido?
Erin –
Muitas pessoas que não estavam falando comigo me procuraram para dizer o quanto acreditavam em mim e blá, blá, blá. Mas não quero falar com qualquer pessoa que de repente encontrou sua voz depois de saberem para que lado o vento estava soprando. Aprendi muito sobre quem eram meus amigos e sobre o caráter dos outros.

AdAge – Você trabalhou com algum grupo relacionado ao #MeToo, como o Time’s Up Advertising?
Erin –
Nunca fui contatada pelo Time’s Up Advertising. Nem sabia que estava sendo lançado.

AdAge – Como você lida com a notoriedade?
Erin –
Preocupo-me que sempre possa haver um asterisco perto do meu nome para companhias que queiram me contratar. Pessoas que estão atreladas ao que aconteceu na indústria reconhecem meu nome. No entretenimento e na tecnologia, nem tanto. Foi um certo alívio, na verdade, trabalhar com tecnologia.

AdAge – O que pretende fazer?
Erin –
Fiquei adjacente à indústria por um ano e sei que estou tentando descobrir o que vem pela frente porque sou alguém que ama trabalhar. Neste verão tive mais tempo para pensar o que quero. Mas provavelmente afugentei os sentimentos. Consegui aprisionar meus sentimentos como se não estivesse pronta para processá-los. Foi como uma morte para mim e estou em luto pela minha vida. Por muito tempo, a carreira é parte da sua identidade.

Mas tive tempo suficiente de espera na praia com meus filhos e de tentar coisas novas. Não descanso bem. Sou melhor ocupada. Então quero fazer algo que me faça feliz. Algo em que eu possa acreditar.

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