16 anos da Lei Maria da Penha: o que evoluiu na comunicação?

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16 anos da Lei Maria da Penha: o que evoluiu na comunicação?

Instituto Maria da Penha aponta avanços da questão e o papel da comunicação na luta contra a violência doméstica


8 de agosto de 2022 - 16h09

Nesse domingo, 7, a Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006) completou 16 anos. Para entender como o combate a violência contra a mulher avançou nesse período e como a publicidade e a comunicação se encaixaram nesse processo de ajudar a disseminar a conscientização, o Meio & Mensagem conversou com Conceição de Maria, cofundadora e superintendente geral do Instituto Maria da Penha.

 

Conceição de Maria, cofundadora e superintendente geral do Instituto Maria da Penha (Crédito: Divulgação)

Meio & Mensagem Como o Instituto Maria da Penha busca ampliar os diálogos através da comunicação?

Conceição de Maria – O Instituto Maria da Penha sempre teve a comunicação como uma forte aliada, desde o início da nossa criação, em 2019, com o objetivo de trabalhar projetos pedagógicos e educacionais no enfrentamento a violência doméstica e familiar contra a mulher. Entende que a cultura do machismo, da violência, a cultura patriarcal precisa passar impreterivelmente pela educação para que possa ser transformada em médio e longo prazo. Então, a comunicação é uma forte aliada, porque o que não se conhece não se pode enfrentar, não se pode não se pode tomar nenhuma decisão e a comunicação nos ajuda a divulgar as informações sobre o enfrentamento a violência doméstica e familiar contra a mulher para a grande população.

M&MNa pandemia, os números de violência doméstica aumentaram em 50%. Diante disso, vocês lançaram a campanha Call, como aconteceu essa construção e qual foi a importância dela?

Conceição – Durante a pandemia nós ficamos muito preocupados com o aumento da violência doméstica familiar contra a mulher relatados não só aqui no Brasil, mas em diversos países do mundo. Assim tivemos que ter soluções rápidas e que atendessem a maior parte das mulheres que estavam muitas vezes em isolamento social com o seu próprio agressor. Pensando nisso, a Fbiz, a nossa agência de comunicação parceira teve essa ideia. Nós lançamos o vídeo Call e foi muito impactante, ele viralizou e as pessoas acharam que demonstrava de uma forma muito real o problema de quem estava em isolamento social com o seu agressor. Era uma reunião virtual de trabalho como estava acontecendo muito no período do isolamento social. Nós recebemos vários feedbacks com a palavra impactante, as pessoas começavam a assistir o vídeo achando que realmente era uma reprodução de uma reunião online e quando elas viram aquela cena acontecendo e que uma pessoa pode ajudar a outra por prestar atenção nos detalhes, foi muito importante. Especialmente no isolamento social, quisermos demonstrar que se importar com a outra pessoa, prestar atenção aos detalhes, estar em contato, às vezes virtual mesmo, mas escutar o som da voz numa ligação, tudo isso faz diferença para quem está precisando de ajuda. Esse vídeo viralizou, foi muito impactante, foi assim uma grande sacada realmente e foi um grande modelo comunicação inteligente no período da pandemia.

 

M&M – Nesses 16 anos, como vem avançando a pauta da violência contra a mulher?

Conceição – Tivemos diversos vários os avanços na questão do enfrentamento da violência doméstica familiar contra a mulher. A lei Maria da Penha foi um divisor de águas; hoje as mulheres tem onde recorrer quando precisam de ajuda. Sabemos que muito ainda falta ser feito, especialmente falando-se da aplicação da lei Maria da Penha, que são os equipamentos que atendem as mulheres em situação de violência: a Delegacia da Mulher, o Centro de Referência da Mulher, a Casa Abrigo, o Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Infelizmente esses equipamentos só existem nas grandes cidades, que geralmente são as capitais ou nos grandes municípios. Os municípios menores, mais interioranos são desassistidos desses desses equipamentos. Então, essa também é uma das principais bandeiras de luta do Instituto Maria da Penha, que todo município possa ter pelo menos um centro de referência da mulher pelo menos um centro de referência da mulher dentro de uma unidade de saúde. E nos municípios polos daquela região, os maiores municípios, possam ter os outros equipamentos e essa mulher possa ser encaminhada até eles quando necessitar. Sabemos que são muitos desafios e que essa implementação correta da lei Maria da Penha depende da vontade política e da sensibilização dos gestores públicos, mas estamos atentos a essa pauta e quanto mais informação nós tivermos sobre a Lei Maria da Penha, sobre como procurar ajuda, como romper o ciclo da violência, mais vamos ter a possibilidade de lutar por melhorias na causa da mulher.

M&M – Como você vê a evolução da abordagem do combate à violência contra a mulher na mídia e qual a importância dela?

Conceição – A comunicação tem um papel preponderante. A informação salva vidas; ela é capaz de tirar uma pessoa da escuridão. O papel da imprensa é muito importante para divulgar não apenas as estatísticas, mas também informações sobre o que existe naquele município, sobre como buscar ajuda, que é o ciclo da violência e uma informação tão básica, mas tão importante, que é quais são os tipos de violência. Porque hoje as pessoas tendem a imaginar que a violência doméstica é somente a violência física ou que somente a violência física é passiva de ser aplicada à lei Maria da Penha, mas não. A lei tipifica cinco formas de violência: doméstica, física, patrimonial, sexual, moral e psicológica. É uma informação simples, mas muitas mulheres suportam por muito tempo as fases iniciais do ciclo da violência que se apresentam como violência psicológica, violência moral, violência patrimonial, por não saberem que estão sofrendo violência doméstica Nem todas tem acesso a cursos de formação, então a imprensa tem um grande papel nisso em informar essas mulheres sobre onde procurar ajuda, como romper o ciclo da violência e principalmente informar o que é um ciclo da violência para ela saberem se reconhecer dentro desse cicl. O primeiro passo para romper com o ciclo da violência é saber se reconhecer dentro dele.

M&M Nesses 16 anos, como vem sendo a cobertura midiática? Houve uma evolução?

Conceição – Podemos dizer que houve uma grande mudança na abordagem da violência doméstica na mídia. Hoje já contamos com muitas muitas abordagens responsáveis da imprensa e dos jornalistas, especialmente os que nos procuram, pedem informações, entrevista, mas também nos pedem orientações de como devem proceder. Isso é algo muito positivo. Porém, ainda encontramos notícias sensacionalistas, que incriminam a própria vítima, retrancas e manchetes que colocam em dúvida, por exemplo, a honra da mulher por ela ter sido estuprada ou colocando como se fosse culpa da mulher estar dentro de um relacionamento violento. Então, sabemos que os comunicadores precisam também passar por capacitações sobre o tema. O Instituto Maria da Penha tem o curso “Defensores e defensora dos direitos da cidadania”, em parceria com as universidades, onde abordamos a questão da violência doméstica, a cidadania, os direitos humanos. Ele é oferecido para os alunos dessas faculdades para que já saiam para as suas profissões mais humanizado pra questão da violência. Quem mais nos procura para fazer esse curso são os alunos das áreas que vão atuar com acolhimento, direito, psicologia, serviço social, medicina, enfermagem, odontologia e comunicação social.

M&M – De que maneira as empresas e marcas podem ser apoiadoras da causa e também fazer parte do enfretamento à violência?

Conceição – As empresas e marcas têm um papel preponderante no enfrentamento à violência doméstica, porque para que uma mulher consiga romper o ciclo da violência, é preciso envolvimento de todo o circuito social, é necessário várias ações sequenciadas. Uma mulher não consegue sair da violência somente com acesso à justiça, serviço social ou programas de empreendedorismo e autonomia financeira, mas precisa de tudo isso em conjunto. As empresas estão atentas a esse tema, desde o período da pandemia nós notamos um aumento na procura de empresas para levar informação sobre violência doméstica para os seus funcionários e treinar os seus colaboradores pra que eles sejam capazes de detectar essas situações dentro da imprensa. Pensando nisso, o Instituto até desenvolveu um serviço especialmente para o público corporativo com palestras para todos os funcionários, homens e mulheres, falando sobre o que é a violência doméstica, como reconhecê-la, procurar ajuda, quais os equipamentos que existem naquela localidade etc. Também fazemos um workshop com a liderança informando como deve ser abordada essa questão a violência doméstica dentro da empresa, como se reconhece uma situação de violência, o que que a empresa pode fazer por aquela mulher, se a mulher tiver uma medida protetiva, como é que a empresa também tomar conhecimento e pode apoiar. Temos uma pesquisa em parceria com a Universidade Federal do Ceará que detectou que as mulheres que sofrem violência doméstica faltam aproximadamente 18 dias de trabalho por ano. E que as mulheres que sofrem violência doméstica, recebem 10% a menos do que as mulheres que não sofrem violência. Talvez por, por exemplo, não terem participado de capacitações porque elas em vivem num ambiente de de violência, de extremo ciúmes, então elas não podem eh por exemplo participar de programas de desenvolvimento de carreira. Então, quando surge uma vaga para ter uma promoção, essa mulher não está capacitada.


M&M – Quais os desafios de trabalhar a comunicação de temas como a violência contra a mulher?

Conceição – São muitos, não só na comunicação, mas na conscientização, na sensibilização dos gestores públicos, na capacitação do pessoal que trabalha com atendimento a mulher em situação de violência, especialmente do corpo jurídico que muitas vezes tem mais dificuldade se capacitar do que técnicos servidores que atuam nos outros órgãos. A Lei Maria da Penha é reconhecida pela ONU como uma das três leis mais avançadas do mundo na questão da violência e um dos pontos principais da lei a é que ela não é somente punitiva, mas ela tem a dimensão punitiva, pedagógica e preventiva. Ela é pedagógica quando cita que as pessoas que atuam na rede de atendimento da mulher tem que receber capacitação; que o poder público tem que estar atento a realizar pesquisas sobre a violência doméstica; quando ela diz que o poder público também tem que fazer campanhas esclarecedoras sobre violência doméstica. Quando diz que o homem é autor de violência tem que participar de programas de grupos reflexivos, para eles se reabilitar e repensar nas suas ações. Nós sabemos que a reincidência desse homem que passa por um grupo reflexivo é mínima, se não me engano, é menos de 5%. Quando o artigo oitavo da lei Maria da Penha for corretamente implementado nós vamos ver grandes mudanças acontecerem, mas essa luta é diuturna. Nós temos que estar atentos dia, porque até o que a gente já conquistou querem tirar de nós. O preço das conquistas é ser eternamente vigilantes.

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