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Opinião

Liderança além das quatro linhas

O sucesso do cliente requer uma mudança de mentalidade e a criação de um ambiente que prioriza o envolvimento do cliente


26 de janeiro de 2023 - 6h00

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O sucesso do cliente, por meio da implementação do LAER, requer uma mudança de mentalidade e a criação de um ambiente que prioriza o envolvimento do cliente (Crédito: Shutterstock)

Em ano de Copa do Mundo de futebol é inevitável pensar como este esporte guarda tantas semelhanças com o ambiente corporativo. Embora muitos achem que a vitória se define dentro de campo, nos limites das quatro linhas e no diferencial dos talentos individuais, a conquista de um jogo e, principalmente, de um campeonato de grande magnitude começa muito antes do apito do árbitro — parte da montagem de um time com diferentes habilidades, comandado por um bom treinador, e pela construção de estratégias e táticas que, depois de muito treino, erros e acertos, possam ser implementadas e bem executadas naqueles 90 minutos decisivos. 

No mercado, o processo é o mesmo: uma empresa bem-sucedida precisa estar sempre preparada para a próxima jogada, com uma equipe coesa, trabalhando em sinergia, orquestrada por líderes que vestem a camisa, sabem reconhecer seus profissionais e compartilham uma visão de futuro clara, com propósitos bem definidos. Se no gramado o objetivo maior é erguer a taça de campeão, no mercado corporativo os passes hoje são para garantir o sucesso do cliente, principal meta das companhias. Pesquisa da Harvard Business Review com mais de 700 organizações em todo o mundo mostrou que 34% delas tinham como foco o aumento da satisfação dos clientes, analisando melhor os dados corporativos para descobrir novas oportunidades de negócios e novos insights visando melhorar suas operações dentro deste novo contexto digital.

Muitas vezes relegada ao banco, a disciplina de Customer Success (ou sucesso do cliente, em português) acabou assumindo posição de destaque nos últimos anos, já que os clientes estão cada vez menos focados nos recursos dos produtos e cada vez mais preocupados em como essas soluções podem levar a melhores resultados de negócios. Nesta nova realidade, o tradicional modelo de fabricar, vender e entregar deixou de fazer sentido, dando lugar a uma soma de novos marcos críticos projetados para atrair, fidelizar e evitar a rotatividade de clientes. Até pouco tempo atrás o foco das empresas de tecnologia estava em criar relacionamentos com seus potenciais clientes visando o próximo e mais importante passo: a venda de seus produtos e serviços. No modelo de consumo onde o cliente paga conforme ele usa os produtos e serviços, a construção do verdadeiro relacionamento se dá gradualmente após a primeira venda.

Seguindo essa lógica, atualmente, companhias vêm buscando outras maneiras de engajar e cativar parceiros e clientes para além das interações pós-primeira compra. Esse é o caso da estratégia de Usage-Based Pricing (precificação baseada no quanto foi usado, em tradução livre), a qual permite que consumidores paguem de acordo com a quantidade de serviços ou produtos utilizados por suas empresas. De acordo com relatório da consultoria Open View, o UBP já faz parte da tática de vendas de 45% das 600 empresas de Software as a Service (SaaS) consultadas pela pesquisa. Ainda segundo o estudo, estima-se que em 2023 o método faça parte dos planos de mais da metade de corporações baseadas em SaaS e que destrave novos horizontes de negócios para os dois lados do balcão.

Sistema tático

Esse olhar mais atento para o Customer Success vem acompanhado de uma nova mentalidade, que busca conectar toda a cadeia de valor das organizações, mantendo o cliente no centro, em uma estratégia contínua para construir vínculos de longo prazo. A visão holística, pautada pela crença de que sucesso do cliente é hoje uma responsabilidade de todos dentro das organizações, é a base para a implementação do LAER (sigla em inglês para LandAdoptExpandRenew), um modelo para engajamento do cliente, dividido em quatro etapas distintas que permeiam cada fase do seu ciclo de vida. Esse sistema “camisa 10” ajuda a impulsionar o crescimento dos negócios, principalmente quando falamos em um mercado cada vez mais demandante por modelos de consumo.

Conquista ao longo do tempo

Em 1999, a norte-americana Salesforce começou a operar um modelo de software por assinatura que permitia a seus clientes adquiri-lo e expandi-lo de acordo com os crescimentos dos negócios, sem ter que se preocupar com investimentos ou gestão de sua infraestrutura. Essa disrupção foi um dos primeiros passos para o modelo de computação em nuvem que conhecemos hoje, rompendo diversos paradigmas e resultando no surgimento do conceito SaaS, responsável por trazer esse modelo de assinaturas para os serviços de tecnologia. Desde então, o crescimento desse mercado foi exponencial em todo o mundo: segundo dados da McKinsey, vale cerca de US$ 3 trilhões atualmente, com projeções de chegar a US$ 10 trilhões até 2030. 

A fórmula inovadora desse sistema, no entanto, contava com um outro componente bastante importante: o customer success. Para equilibrar perfeitamente o relacionamento com o cliente e o ganho de escala com geração de receita, a empresa investiu na chamada economia de recorrência, na qual é necessário contar com uma mentalidade muito mais voltada ao revenue deferido, conquistado ao longo do tempo, do que simplesmente ao lucro inicial de uma venda, por exemplo. 

Isso mudou a forma como a tecnologia é adquirida e adotada por uma empresa, já que não há mais compromissos iniciais significativos, mas sim assinaturas de custo mais baixo, com ofertas de serviços de maior valor agregado. Na prática, isso significa que, se em qualquer ponto da jornada do cliente ele decidir que determinado produto ou serviço não está atendendo suas necessidades, a receita deixará de fluir. 

Inteligência estratégica

Outro levantamento da McKinsey mostra que, hoje, mais de 75% dos clientes B2B preferem modelos de adoção de pagamento conforme o uso para serviços de software (usage based model). Embora pisar nessa arena e colocar a bola em jogo seja um atrativo, é preciso estar munido de muita estratégia, tática e inteligência em campo para ganhar esse jogo – algo que se torna muito mais fácil com a adoção do LAER. 

A jogada de mestre começa com o Land, também conhecido como processo de conquista do cliente, que envolve todas as atividades de marketing e vendas necessárias para conseguir levá-lo à primeira compra e à implementação inicial dessa solução. O segundo passo envolve o Adoption, com foco em acelerar e garantir o chamado time-to-value, quando o cliente percebe o valor do produto ou serviço adquirido. Esta é a etapa na qual é necessário ajudar o cliente que acabou de comprar sua tecnologia a usá-la com sucesso conectando-a aos seus objetivos de negócios. É uma das etapas mais importantes dos modelos SaaS e Usage Based, especialmente aquelas focadas nos negócios em nuvem. 

Na sequência, aparece o Expand que engloba atividades que possam ajudar os clientes a expandir seus investimentos de maneira inteligente e com amplo custo-benefício. Neste lance, o mais importante é a fidelização do cliente, com estratégias para gerar e manter satisfação crescente, para que o cliente volte a fazer aquisições por meio de vendas cruzadas e o upselling, por exemplo. Aqui, o importante é deixar o papel de fornecedor de lado para se transformar em um trusted advisor, ajudando a ampliar os resultados de negócios do cliente. Isso torna mais fácil vincular um produto ou serviço a outros projetos e iniciativas, já que só é possível fidelizar clientes satisfeitos. 

Finalizando a jogada, temos o Renew, com um conjunto de táticas para garantir a retenção do cliente. Conquistar a renovação dos contratos pode ser equiparado a um gol de placa, daqueles que fazem a torcida vibrar: é a concretização de um trabalho bem-feito de empoderamento do cliente durante toda a sua jornada, entregando valor e excelência. Essa é a chave para o crescimento dos negócios em um jogo de ganha-ganha. O aumento de vendas cruzadas, vendas adicionais e retenção pode resultar em taxas médias de retenção líquida (NRR) de 120%, como mostra a McKinsey, o que significa um crescimento anual de 20% sem adquirir um novo cliente. 

Vestindo a camisa

A regra é clara e a evidência esmagadora: o mesmo esforço dedicado à conquista de novos clientes precisa ser implementado para uma manutenção constante daqueles já existentes. Por isso, para manter o alto rendimento do LAER em campo, é imprescindível contar com líderes preparados, capazes de disseminar a cultura de sucesso do cliente em todos os níveis da empresa, envolvendo toda a cadeia de valor. Pesquisa realizada pela Gallup no ano passado mostrou que o comportamento do gestor influencia diretamente no engajamento, podendo impactar em até 70% as variações de comprometimento e empenho dos profissionais.

Também é necessário um conhecimento profundo das necessidades dos clientes e das habilidades de todos os jogadores do elenco, para que seja possível montar diferentes combinações táticas visando impactar cada ponto da jornada. Um espetáculo em campo depende mais de uma boa gestão, baseada em formação de base e cultura forte, do que de características individuais dos jogadores. Por isso, os líderes precisam vestir a camisa, além de compartilhar uma visão convincente de futuro, garantindo uma direção clara onde todos possam trabalhar coletivamente para o alcance de um objetivo em comum, criando um senso de propósito. 

O sucesso do cliente, por meio da implementação do LAER, requer uma mudança de mentalidade e a criação de um ambiente que prioriza o envolvimento do cliente. É um desafio diário que requer dedicação, aprimoramento e treino. Na busca pela vitória, nosso maior adversário está dentro de cada um de nós. Por isso, o mais importante é entrar em campo com vontade, reconhecendo o prazer de praticar um bom jogo e buscando compartilhar a vitória. Customer success somos todos nós e, quando o cliente ganha, todos saem ganhando.

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