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Coreia: um país, um mercado e um varejo, no mínimo, surpreendentes – Parte 2

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Coreia: um país, um mercado e um varejo, no mínimo, surpreendentes – Parte 2

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SEOUL, SOUTH KOREA - FEBRUARY 14, 2013: Myeong-Dong district at night. The location is the premiere district for shopping in the city.
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Coreia: um país, um mercado e um varejo, no mínimo, surpreendentes – Parte 2

O mais impactante elemento da realidade do varejo da Coreia é a participação de mais de 22,3% das vendas do e-commerce sobre o varejo total, que é igual a da Inglaterra e mais que o dobro dos Estados Unidos – e quatro vezes maior que a do Brasil.


28 de outubro de 2019 - 16h19

 

Por Marcos Gouvêa de Souza (*)

No primeiro artigo desta série sobre a Coreia discutimos os aspectos macroeconômicos e de mercado que configuram o comportamento do varejo por lá.

Neste artigo vamos destacar outros aspectos mais focados diretamente no varejo local e, nos próximos, nos concentraremos na análise de alguns dos principais players locais e suas estratégias de acelerada diversificação de canais, formatos, negócios e marcas – talvez uma das mais agressivas globalmente.

Diferente dos Estados Unidos, que usam o modelo de plataformas exponenciais para expandir com base focada em tecnologia, ou dos chineses, que o fazem apoiados no modelo dos ecossistemas de negócios, também a partir da dominância da tecnologia, na Coreia do Sul foi o conceito dos Chaebols que desenhou o modelo de negócio vigente.

Esse conceito foi desenvolvido e apoiado pelos governos do país e pressupunha grupos empresariais escolhidos e estimulados a tornarem-se mais relevantes na sua atuação, de forma diversificada e nos mercados interno e externo.

Sem dúvida uma mais do que provável inspiração dos Campeões Nacionais de recentes gestões no Brasil.

Esses conglomerados, como Samsung, LG, Hyundai, Lotte e vários outros, diversificaram setores, negócios, áreas e mercados, e eram inicialmente grupos empresariais de origem, controle e gestão familiares que, gradativamente, avançaram para atuarem de forma mais abrangente e se tornaram pilares da forte expansão econômica na Coreia.

E que combinados com a grande atenção à educação explicam em boa parte a forte expansão dos últimos trinta anos na Coreia.

Recentemente o governo coreano passou a intervir mais diretamente na concentração econômica que o modelo criou aquilo que, de certa maneira, tornou o próprio governo refém desses grupos empresariais ainda que, alguns, tenham se tornado empresas públicas com ações cotadas em mercado aberto e atuação global.

Essa recente intervenção tem ocorrido por meio de maior regulamentação das atividades empresariais e aumento dos salários mínimos praticados tentando preservar espaço para pequenas e médias empresas que vinham desaparecendo pela concentração e poder de fogo dos grandes conglomerados.

Um desenho da realidade do varejo coreano

Vamos a um conjunto de elementos que ajuda a desenhar a visão do varejo da Coreia do Sul:

1 – O mais impactante elemento da realidade do varejo da Coreia é a participação de mais de 22,3% das vendas do e-commerce sobre o varejo total, que é igual a da Inglaterra e mais que o dobro dos Estados Unidos – e quatro vezes maior que a do Brasil. E o mais interessante é que essa forte participação não está baseada num domínio da informação sobre o omniconsumidor, como na China, mas é derivada do comportamento atípico do consumidor coreano, hiperconectado, e que tem sua vida gravitando em torno dos celulares para absolutamente tudo. Especialmente os mais jovens. Não há dúvidas que o tempo que o jovem coreano olha a tela de seu celular é das maiores do mundo, talvez só comparável à China;

2 – Diferente da China, Inglaterra, França e dos Estados Unidos, na Coreia são os varejistas tradicionais que dominam o presente do varejo. Inclusive o e-commerce. Na China os players dominantes no varejo são os novos entrantes que vieram do mundo da tecnologia, games, e-commerce e redes sociais (Alibaba, Tencent, JD e outros). Nos Estados Unidos, a Amazon desenha a nova realidade, on e offline, e impõe novos padrões para o varejo tradicional, obrigando Walmart, Target, Kroger, Gap, Macy’s e muitos mais a se reposicionarem.

Na Inglaterra é uma mescla dos varejistas tradicionais pressionados por pure players, como Amazon, Ocado e outros, que estão redesenhando o mercado. Na França ocorre algo similar com Auchan, Carrefour, Casino, La Redoute e outros que correm para tentar se reposicionar ante o avanço dos pure players.

Na Coreia, diferente dos demais países, são os tradicionais varejistas que dominam os diferentes canais, formatos e negócios e partiram para diversificação de conceitos, dentro da melhor proposta Chaebol que criou o modelo cultural, mental e empresarial de crescimento acelerado e diversificado, sem receio de atropelar a realidade. Sem dúvida facilitado por acesso a recursos em custos e condições que tornam, ou tornaram, o processo possível;

3 – Outro elemento importante da equação de varejo da Coreia é a consciência sobre preços praticados que tem o omniconsumidor local, provavelmente derivado do intenso uso dos celulares para comunicarem, compararem e relacionarem-se. Essa consciência de preço torna o mercado dos mais competitivos, apesar de pagarem preços em produtos globais de marcas e modelos comparáveis entre 40 a 50% daqueles praticados na Europa, ou até mais, quando se considera os Estados Unidos.

Isso ocorre por conta das taxas de importação que são planejadamente altas como forma de proteção da indústria local. Para minorar essa questão de preços mais altos de produtos e marcas comparáveis, é disseminada a oferta de rebate de impostos para os consumidores internacionais que afluem em grande número ao país.

Todo o sistema é automatizado com um código de barras impresso nas notas de produtos comprados por estrangeiros acima de determinado valor e é posteriormente apresentado num quiosque eletrônico, no aeroporto ou outro local, junto com o passaporte. Em outro quiosque, depois do Controle de Imigração, apresentado o passaporte, é feito o crédito automático num cartão de crédito indicado, num processo extremamente rápido e simples quando comparado com outros países;

Por conta disso alguns varejistas, como Shinsegae, têm uma área Duty Free em suas lojas em Seul e depois remetem o produto para ser retirado no aeroporto quando o estrangeiro estiver na área de embarque internacional;

4 – A obsessão por marcas de prestígio internacional é outra característica do mercado local, mesmo reconhecidamente pagando muito mais caro. As razões por essa obsessão talvez possam ser explicadas pelo crescimento da renda e por conta da história do país, tendo vivido intensos conflitos com Japão e Coreia do Norte que parecem ter criado um estilo de vida que mescla afluência, trabalho pesado, atenção com educação, diversão e o bem viver, numa vida intensa e interessante, com elevada preocupação com aparência e bem estar;

5 – Aliás, preocupação com aparência e bem-estar é uma das características mais fortes do mercado coreano, explicando ser o maior do mundo em termos relativos, para cirurgias plásticas, vendidas como serviços para o consumo. Na área de cosmética e beleza seguramente a Coreia é, perceptivamente, o maior dispêndio percentual per capita com produtos de beleza a se considerar o número de lojas de produtos dessas categorias, muito acima do que qualquer outro país.

Aqui o primeiro artigo da série.

(*) Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral do Grupo GS& Gouvêa de Souza, membro do IDV – Instituto para o Desenvolvimento do Varejo, do IFB – Instituto Foodservice Brasil, presidente do LIDE Comércio e membro do Ebeltoft Group, aliança global de consultorias especializadas em varejo em mais de 25 países.

 

 

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