Marcela Mariano conta como busca acelerar a inovação da Ypê
Com mais de 30 anos de carreira, CMO lidera expansão da marca com collabs e ampliação para cuidados pessoais

Marcela Mariano, CMO da Ypê (Crédito: Arthur Nobre)
Quando Marcela Mariano assumiu o posto de CMO da Ypê, em janeiro, já conhecia bem os bastidores da companhia. Ela estava há um ano e meio como diretora comercial, período em que se encantou com a agilidade e a capacidade de realização de uma empresa de capital nacional.
“O legal de uma companhia nacional é que você trabalha quase sempre no modelo de startup, que é fazer, implementar e fail fast. Você erra rápido, mas tem como valores centrais a inovação e a estratégia. Com o Waldir Júnior, da Ypê, a relação é diferente, porque sou uma executiva e ele é o empresário. E isso muda muita coisa, porque a combinação de empresários com executivos é muito poderosa. Nas multinacionais, não tem o dono ali no dia a dia”, conta.
Desde então, em pouco mais de oito meses na cadeira de marketing, ela já deixou sua marca: lançou um hub de inovação e conduziu ao mercado oito projetos relevantes, incluindo a collab com a L’Occitane au Brésil e a estreia da categoria de ciclos curtos no país com o Tixan Ypê Express.
A ousadia não é novidade para a executiva. Com pouco mais de três décadas de carreira, Marcela construiu sua trajetória em empresas como Unilever, BRF, PepsiCo e Baruel, sempre marcada por entregas que redefiniram categorias.
Entre os marcos estão a reinvenção da maionese Hellmann’s, em 2008, que quase dobrou o negócio da marca da Unilever no Brasil; a introdução da Tresemmé, que trouxe o conceito de “salão em casa” ao democratizar uma marca profissional de beleza para o varejo; e o reposicionamento da Tenys Pé, transformando-a de sinônimo de “chulé” a referência em saúde dos pés.
Infância entre a praia e a resiliência
Por trás dos grandes feitos profissionais e da mente acelerada, está a história de quem precisou apoiar a família desde cedo. Filha de cariocas, Marcela nasceu em São Paulo, mas passou a infância entre o Recife e o Rio de Janeiro.
“Foi uma infância de praia, muito feliz, até que a vida virou do avesso aos 15 anos, quando meu pai adoeceu de esclerose múltipla”, relembra. Executivo do grupo Gerdau, ele precisou se afastar da carreira ainda aos 42 anos, e a família retornou a São Paulo em busca de tratamento.
Foram 17 anos de acompanhamento até sua morte, experiência que moldou a determinação de Marcela: “Eu fazia uma pressão grande sobre mim mesma para dar certo muito cedo, para ser o apoio da família. Essa obstinação diz um pouco sobre meu jeito de liderar”.
O senso de responsabilidade a levou cedo ao mercado de trabalho: aos 17 anos, já estagiava na Gerdau; pouco depois, foi trainee da Siemens. Essa vivência pessoal também lhe trouxe valores que até hoje permeiam sua liderança: a importância da saúde, do olhar humano e da resiliência em contextos de alta pressão.
Na liderança de viradas de marcas
Na Unilever, Marcela enfrentou o desafio de revitalizar marcas maduras em um mercado extremamente competitivo. Hellmann’s, embora já conhecida, sofria para se diferenciar num segmento comoditizado. Ela liderou a estratégia que reposicionou a maionese como ingrediente de qualidade, desmistificando o produto com campanhas educativas e foco no incentivo a novos usos.
O resultado foi a quase duplicação do negócio no Brasil e o aumento de market share, além da consolidação da marca como sinônimo de categoria. Mais tarde, à frente de Tresemmé, encarou o desafio de introduzir no país um conceito até então inexistente: produtos de salão a preços acessíveis. Com ativações relevantes, transformou a marca em referência no segmento premium acessível de haircare.
Na PepsiCo, entrou em um cenário de pressão por crescimento e diversificação do portfólio. Quando chegou, a empresa havia acabado de comprar a marca Mabel, hoje da Camil, e a missão era clara: fortalecer a presença da companhia em snacks doces.
Em 2015, liderou a estratégia de “choco bakery” na companhia, ou seja, de tratar biscoito como sobremesa, o que resultou no lançamento de produtos como Toddy Cookie, conectando a força da marca de achocolatado com a categoria de biscoitos. O objetivo era entrar em um mercado dominado por concorrentes tradicionais, e o movimento tornou a operação de biscoitos mais lucrativa e abriu uma frente consistente de negócios para a empresa no Brasil.
Já na Baruel, dona da marca Tenys Pé, o obstáculo era transformar a percepção de um produto associado ao chulé em algo aspiracional e ligado ao cuidado. Com inspiração de Dr. Scholl’s, e a ideia foi logo lançar uma linha de acessórios e reposicionar a marca como referência em saúde e bem-estar dos pés, trazendo novos produtos, narrativas e parcerias. Essa virada, somada a inovações e linhas infantis, ajudou a dobrar o EBITDA da companhia em três anos.
Na Ypê, seu desafio atual também é de peso: expandir uma marca consolidada em limpeza para novas frentes de consumo. “Queremos reafirmar nossa liderança em home care. Somos a segunda marca mais presente para os brasileiros, independentemente da categoria. Só ficamos atrás da Coca-Cola. E não por presença, mas por frequência nos lares. Queremos, também, nos tornar um player relevante em cuidados pessoais”, conta.
Marcela compartilha que a ambição da empresa é ter 5% de market share em cuidados pessoais em cinco anos. “Nossos planos são ambiciosos. É criar uma segunda Ypê dentro da própria companhia em pouco tempo.”
O impacto na Ypê
Sob sua liderança no marketing, a Ypê vem mesmo acelerando o ritmo de inovação e ampliando sua atuação para além do universo da limpeza. Só em 2025, foram oito grandes lançamentos que reforçam a ambição da companhia de diversificar o portfólio e ocupar novos territórios de consumo.
Um dos mais simbólicos foi a collab com a L’Occitane au Brésil, que uniu a força da Ypê em escala e distribuição com o prestígio da marca francesa no universo da perfumaria. O resultado, além de já representar 30% das vendas de amaciante da marca em dois meses, foi uma linha de produtos com apelo sensorial premium, aproximando a Ypê de um público que busca mais sofisticação em categorias do dia a dia.
Outro movimento estratégico foi a criação do Tixan Ypê Express, primeiro detergente de roupas de ciclos curtos do país. A proposta responde a uma tendência global de otimização do tempo de lavagem, reduzindo o impacto ambiental e acompanhando mudanças no estilo de vida das famílias brasileiras.
“Elas estão cada vez menores e a população está envelhecendo. Você tem casas com menos crianças, e isso significa menos sujidade nas roupas. Começa a vir uma necessidade de poupar tempo, não estragar as peças e de economizar luz e água. A gente viu empresas lá fora lançando, como Unilever, Reckitt, Henkel e P&G, e aí trouxemos para o Brasil”, explica Marcela.
No campo dos cuidados pessoais, a Ypê comprou a Banho a Banho, marca dos anos 1990 criada pela Johnson & Johnson, mas que estava envelhecida. Eles a relançaram em maio, com foco no público jovem. Os produtos, segundo Marcela, é de muita qualidade, com ingredientes de dermocosméticos. Para chegar lá, Camila Queiroz é a estrela da campanha. Já Flor de Ypê se consolidou como o sabonete mais presente nos lares brasileiros, resultado de um trabalho consistente de comunicação, inovação de fragrâncias e expansão da linha.
Resposta a tendências
A marca tem respondido a tendências de consumo globais e locais de diferentes maneira. Outro exemplo foi o desenvolvimento de um limpador perfumado de chá branco, inspirado em nomes da moda e da perfumaria, como Tânia Bulhões. A proposta foi transformar um produto de rotina em uma experiência sensorial.
“Hoje, há uma tendência muito grande de perfumaria dentro de home care como um todo. A categoria de produtos de limpeza é difícil, porque não é fancy, né? No final, você compra produtos para fazer um esforço, uma obrigação. E o perfume entra como, de fato, um fator de diferenciação. E você vê as consumidoras enlouquecidas, porque você quer, pelo menos nesse ato mais chato da rotina, de obrigação, um fator mais sensorial e emocional. Nossa lógica é pegar uma inovação, tendência ou insight do consumidor e trazer para o mercado brasileiro com acesso. É democratizar com valor“, avalia Marcela.
Para chegar aos objetivos da marca, seja o de reafirmar a liderança em home care como o de se tornar relevante em cuidados pessoais, a ideia é começar a jornada em novas categorias e definir a melhor estratégia de entrar em cada uma delas, seja por aquisição ou pelas próprias marcas da Ypê.
“Começamos com sabonete, lançamos hidratantes, acabamos de entrar em desodorantes. Mas há duas formas de entrar nesse mercado e a Ypê está avaliando ambos os caminhos. Também queremos acelerar as marcas atuais, tanto Flor de Ypê quanto Banho a Banho. Então, tem novidades aí no futuro próximo para a gente conseguir ser esse player relevante de cuidados pessoais”, conta.
Maternidade, maturidade e liderança
Marcela é mãe de dois filhos, de 22 e 19 anos, que vivem com ela em São Paulo. O caçula, Gabriel Sá, é hoje conhecido entre torcedores do São Paulo Futebol Clube como jovem jornalista esportivo da Jovem Pan. “Ele criou o blog Notícias do Tricolor aos 9 anos e explodiu nas redes. É um orgulho, mas também um desafio como mãe. O futebol é um ambiente de muitas emoções e, às vezes, de haters”, conta.
O equilíbrio entre a maternidade e a carreira sempre foi parte de sua jornada. Após um casamento de 25 anos, diz que hoje aproveita intensamente os últimos anos com os filhos em casa antes de “eles criarem asas”.
Já no trabalho, à frente de uma equipe de quase 100 pessoas, Marcela tem no board da Ypê um espaço singular: metade dos assentos são ocupados por mulheres. “Não é sobre escolher mulheres por escolher, mas sobre ter uma empresa com valores que favorecem essa diversidade”, explica.
Aos 50+, ela também reflete sobre a importância e o papel das executivas maduras no mercado. “A gente faz as perguntas certas. Entre tantos dados, a clareza estratégica vem da experiência. Hoje sei quais são as brigas que valem a pena.”