Perfil

A jornada de Jana Borges entre diferentes universos do marketing

A diretora sênior de marketing da Netflix acumula experiências diversas que ampliam seu olhar estratégico

i 19 de agosto de 2025 - 16h35

(Crédito: Arthur Nobre)

Jana Borges, diretora sênior de marketing da Netflix (Crédito: Arthur Nobre)

Natural de Uberaba, interior de Minas Gerais, Jana Borges mudou-se para São Paulo para estudar publicidade e propaganda na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), mas foi o curso de administração que a conquistou e lhe conferiu um diploma pela fundação Getúlio Vargas (FGV). O caminho da diretora sênior de marketing da Netflix, contudo, não foi estático. Após uma breve passagem por um banco de investimentos, estagiou na FutureBrand e encontrou sua vocação em aliar a comunicação aos negócios. Chegou a morar fora do Brasil, em Paris e Buenos Aires, em meio a um projeto para a Nestlé na agência.

Já no Rio de Janeiro, foi creative excellence planner para a Coca-Cola. Depois de passagens pela Alexandria e pela atual Agência Casa, fez parte da abertura da operação da Contagious no País, na capital paulista. Posteriormente, unindo o interesse pelos esportes, colaborou para o posicionamento e branding da Gympass (atual Wellhub). Jana ingressou na Netflix no time de social, no qual pôde ver de perto a essência da estratégia de colocar o fã no centro. Paralelamente — e apesar de ter tentado se afastar do empreendedorismo dado o background de negócios familiares, que incluem uma padaria, um mercadinho e um lava-jato —, a paixão pela corrida a tornou cofundadora e advisor da Bad Running, marca de moda voltada ao segmento.

Meio & Mensagem — Você acumula passagens por anunciantes, agências, e agora está numa plataforma. Esse intercâmbio vem influenciando na sua forma de atuar como diretora de marketing na Netflix? De que maneira?

Jana Borges — Faz com que você entenda todos os elos da cadeia de uma forma muito diferente. A minha relação com as nossas agências é muito diferente por eu ter trabalhado em uma agência. Eu sei a diferença que um briefing claro e direto faz, que um bom feedback faz. Sei como é importante falar: “Não é esse caminho, definitivamente. Vamos por aqui”. Sinto que consigo me comunicar e fazer com que o meu time se comunique melhor com os nossos parceiros. Ao mesmo tempo, passei por construções de marcas muito distintas. A construção de uma marca como a Coca-Cola é digna de livro. Se você pegar um livro do (Philip) Kotler que fala sobre construção de marca, a Coca-Cola fez todos os passos. A Netflix não fez nada do que está escrito no livro, ela veio de um caminho completamente diferente. Isso me traz a oportunidade também de comparar, de trazer coisas de outros lugares, mas também entender que existem outras formas de fazer e de entender esse novo momento. Para os anunciantes que vêm trabalhar conosco, penso em como fazer com que as duas marcas potencializem o valor. Ter essa habilidade de ter trabalhado em outras indústrias, em outros segmentos, em agências e em consultoria, me permite navegar nesses universos de uma forma mais empática, entendendo de onde vem cada uma das pessoas.

M&M — Além disso, você é cofundadora e advisor da Bad Running. A vontade de empreender sempre esteve no seu radar?

Jana — É curioso, porque sou de uma família de muitos pequenos empreendedores: uma padaria, um mercadinho, um lava-jato. Em Uberaba, todos os meus tios têm algum negócio e acredito que seja por isso que me afastei do empreendedorismo, na verdade, porque via que o empreendedor trabalha 24 horas por dia, sete dias por semana. Meu momento empreendedor foi com a Contagious, mas com uma marca que já estava vindo para o Brasil, com investimento. A Bad Running, na verdade, surgiu porque eu amo correr, é algo muito importante na minha vida e sentia falta de ter uma marca brasileira. Vi essa oportunidade, mas, por ter o trabalho que tenho, empreender full-time não seria opção. Tenho um amigo empreendedor, que é um dos sócios e que veio com essa ideia. Ele me falou que estava pensando em criar uma marca de corrida e queria que eu desse algumas opiniões. Minha mulher é designer e amiga dele. A esposa dele também entrou na sociedade. Então, somos os quatro. Mas o Bruno (Bocchese, fundador e diretor criativo da Bad Running) é quem, de fato, toca a operação no dia a dia. Eu estava ali no momento da fundação, da concepção do caminho e, hoje, dou palpites, participo dos eventos, obviamente, vejo as coleções, mas sou mais um advisor mesmo do que, de fato, alguém que está lá, na fábrica.

Meio & Mensagem — Qual é sua percepção sobre a evolução da presença feminina no mercado de trabalho nos últimos dez anos?

Jana — É curioso ter crescido dentro desse mercado ao mesmo tempo em que essa explosão da liderança feminina acontecia. Hoje, não consigo pensar em outra marca ou empresa com a qual eu interajo que tenha apenas uma mulher na posição de liderança. Sei que existem indústrias muito mais masculinas, mas, hoje, isso é uma realidade. Quando eu olho as mulheres ao longo desses 13 anos de Women To Watch, são mulheres que, de fato, fizeram muita diferença na representatividade feminina e são ícones e pioneiras. Essa mudança é muito visível. Nas indústrias que me cercam, isso está longe de ser uma exceção e é muito bom. São lugares não somente possíveis, mas que também desejam ter mulheres porque entendem a diferença que faz ter times diversos. Quando falo com outras mulheres, seja em grupos de liderança ou palestras, pela forma como eu fui criada e que minha mãe sempre lidou com isso, no ambiente corporativo eu raramente entro como uma mulher. Eu entro como uma pessoa. Isso passa por uma autoconfiança, por alguns aspectos, infelizmente, incomuns para muitas mulheres. Não é uma questão, para mim, meu gênero, a minha orientação sexual. Nem passa pela minha cabeça que talvez alguém não me ouça por eu ser uma mulher. Naquele momento específico (à época em que trabalhou na Agência Casa, era a única mulher do board de liderança), eu fui muito respeitada e muito ouvida, mas me fazia pensar: será que eu preciso falar de um jeito diferente? Será que eu preciso ser mais dura? Será que eu preciso me comportar mais como eles para fazer parte? Aos poucos eu fui entendendo que não. Mas foi uma vez que, de fato, eu pensei aquilo, porque quando você está em uma sala, olha ao lado e só tem homens, é um pouco opressivo.