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SXSW

SXSW 2023 & a estratégia pendular

É preciso sair da espuma para tornar visível o invisível e tomar decisões conscientes e humanizadas que rompem com a polarização e expandem a Economia da Paixão


23 de março de 2023 - 18h16

South by Southwest

(Crédito: Ben Houdijk/Shutterstock)

Pela ótica do Design Thinking, os dias de imersão em um evento como o SXSW estão mais centrados na divergência. A soma de toda vivência abre janelas de ampliação e aprofundamento de horizontes, que exigem tempo e espaço de perspectiva para a convergência das ideias através da conexão de pontos que nos levam à geração de insights. Com critério crítico e viés de intencionalidade, chegamos em um momento crucial de tornar visível o invisível, descartando boa parte da espuma, aquele barulho superficial intrínseco a um evento que, em uma sociedade com mindset de escassez, fomenta a FOMO (“fear of missing out” ou “medo de perder algo”, em tradução literal).

Ganhando cada vez mais intimidade com a lógica sistêmica da Era Digital, podemos tomar nota de como este exercício de separar o joio do trigo, assim como outros tópicos da experiência do SXSW, refletem o mundo e desafios diários nas tomadas de decisão. Estamos cercados por luz e sombra, vivemos em constante dualidade, o que muitas vezes culmina em hipocrisias, agravadas por um cenário de mudanças constantes. O próprio Simram Jeet Singh, palestrante da abertura do evento, compartilhou que durante a pandemia, identificou um abismo entre o estilo de vida de bem-estar que acredita e prega e o que estava vivendo, distante da família e focado no trabalho.

A grande questão é: onde estão os pontos de equilíbrio? Pode ser uma grande decepção ou, finalmente, o encontro de uma solução, notar que o equilíbrio da forma como projetamos não existe. Podemos parar de buscar esta tal zona de espaço e tempo que queremos ocupar como um meio de campo. O equilíbrio está no despertar da consciência, um princípio da humanização que buscamos resgatar na era digital, nos permitindo pendular entre as extremidades da jornada. Este exercício depende de um olhar de dentro para fora, para reconhecer e atender sinais instintivos, intuitivos e inquietantes, proprietários da nossa natureza criativa e realizadora. Na prática, estamos falando, por exemplo, da decisão de abrir mão de parte produtiva da agenda para um almoço tranquilo ou simplesmente um tempo de repouso – e quantos não nos permitimos ser comandados pelas notificações de recomendações das múltiplas atrações do aplicativo do SXSW? Assim vamos deixando máquinas tomarem decisões relativas à nossa consciência, enquanto nos preocupamos com as possibilidades de a inteligência artificial tomar os nossos empregos.

Em um painel que apresentou uma pesquisa sobre Burnout, realizada pela McKinsey & Company, apontando que mais de um terço dos profissionais buscam atuar como máquinas, sentindo que precisam estar disponíveis 24 horas por dia nos 7 dias da semana, a pesquisadora Diana Ellsworth relatou desafios da sua experiência pessoal, quando se viu tomada pela mecanização das atividades notificadas pela agenda, uma armadilha do esgotamento, e abrindo mão dos relacionamentos, uma das nossas principais fontes de regeneração também no ambiente de trabalho. Em outro diálogo, Nick Jonas e Mireya Martínez, diabéticos tipo 1 e 2, consecutivamente, também articularam sobre a necessidade de tomadas de decisão que garantem o bem-estar bioquímico, no que diz sobre a análise constante de dados do monitor eletrônico de insulina que utilizam, em equilíbrio com o bem-estar emocional “também queremos comer uma fatia de bolo em um aniversário e podemos fazer isso com consciência”, trouxe Mireya.

A estratégia de pendular nas tomadas de decisão, passa pelo desenvolvimento do olhar em perspectiva, que orienta as dosagens entre a visão interna e externa, razão e emoção, corpo e mente, arte e ciência, técnica e humanização, administração e criação, entre outros extremos que desafiam a capacidade inovativa. A astronauta, geocientista, exploradora, artista espacial e poetisa, Dra. Sian Proctor, colaborou para essa construção. Em uma expressão experiencial imersiva, ao lado da compositora futurista e storyteller MaryLiz Bender, Proctor compartilhou o senso de pertencimento e cuidado que conquistou ao enxergar a vida em perspectiva, observando o planeta Terra do espaço. A ativação sensorial deste talk, que contou com arte, poesia e música, carrega mais um fator de importância da estratégia de pendular. As emoções despertam o nosso ser, que é humano e parte da natureza, onde existe unicidade e conexão e é nesta sensibilidade que encontramos a fuga da polarização doentia que vivemos e nos mantém reféns da inércia diante de contextos cada vez mais complexos.

Na abertura da edição passada do SXSW, a indiana Priya Parker, mais uma oriental que trouxe para o festival contrapontos estimulantes aos imperativos ocidentais, posicionou que nossas estruturas estão colapsadas, porque estamos lidando de forma superficial com problemas complexos, que dependem da sustentação de diálogos profundos e não de conversas paralelas e superficiais – sim, a “espuma”! Neste ano, este conceito foi retomado nas palavras do chef e humanitário José Andrés, fundador da ONG World Central Kitchen, ao declarar que grandes problemas podem ser resolvidos de forma simples, a partir da cultura de “mesas grandes” ao invés da criação de “muros altos”. Não surpreende observar a sinergia desta crença da complexidade diluída pelo sistema colocada por José Andrés, um agente da Economia da Paixão, com a comunicação estampada na loja da Patagonia, marca que também se destacou nos palcos do evento por sua visão sustentável da cultura de comunidade: “aposte em mesas maiores: comidas que regeneram o planeta”.

A vibração afetiva de José Andrés, assim como outras atrações que trouxeram impulsos de emoção para o evento, nos inspira a explorar a “capacidade humana de imaginar e, portanto, criar o futuro”, como defende o futurista Rohit Bhargava, e provoca o co-autor do livro “The Book of Joy”, Doug Abrams: “podemos parar de criar problemas e começar a criar as histórias incríveis que queremos viver”. Este nosso poder de expansividade é tão grande quanto o grau de invisibilidade e bordas que ainda precisam ser exploradas na sociedade, destacando o dever com missões que carregam dimensão de legado, como defendeu Edu Lyra “precisamos de cidadãos com conhecimento técnico e coração social e empresas capazes de tocar nas feridas da sociedade para tornar o mundo melhor”. Em uma linguagem próxima, a consultora Chegane Bullock, descendente da tribo Montauk, compartilhou a estratégia de tomada de decisão que leva da sua tribo de origem para as mesas de negociação “sempre fale com o coração em primeiro lugar”.

Através destas abordagens que evidenciam o afeto como despertar da consciência e da humanização, enxergamos na estratégia de pendular estimulada pelo festival de inovação, pistas para tomadas de decisões sustentáveis em um mundo que caminha para extremos da descentralização como a autonomia e a coletividade, o nomadismo e a comunidade. Esta bagagem do SXSW 2023 vem junto com a responsabilidade instigada por Graham Nola, co-fundador da plataforma Do the WeRQ – que visa representatividade da criatividade queer na publicidade -, ao declarar que o evento reúne nós, pessoas em posições de privilégio, que estamos definindo o futuro para além de nossos contextos igualmente privilegiados. Assim, nesta soma cada vez mais visível entre negócios e espiritualidade, podemos internalizar o mantra que rompe com qualquer polarização, um princípio necessário para este ano de duros movimentos, principalmente financeiros: somos todos um!

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