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Coffee Break: Sou um otimista

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Coffee Break: Sou um otimista

O ser humano é um eterno insatisfeito, e isso não é necessariamente ruim


20 de janeiro de 2015 - 10h24

Por Marcos Caetano (*)

Não faz muito tempo, Woody Allen ganhou mais um Oscar para a sua coleção, por conta de uma pequena obra-prima: Meia-Noite em Paris. O argumento do filme é, ao mesmo tempo, simples e provocador: um jovem roteirista encontra uma espécie de passagem intertemporal que o permite visitar a gloriosa Paris dos anos 1920, com seus cafés e apartamentos da Rive Gauche abarrotados de intelectuais e artistas de todos os naipes, de Hemingway a Picasso, de Cole Porter a Salvador Dalí, passando por Joyce, Fitzgerald, Ezra Pound e Man Ray.

Encantado com aquela época de ouro, o rapaz decide largar o tempo presente para se instalar, em definitivo, no passado. Sua decisão é firme, até que, já adaptado aos anos 1920, ele descobre que intelectuais daquele período estariam planejando fugir por outra passagem no tempo para a Paris do Impressionismo, no final do século 19, habitada por gênios como Monet, Degas, Gauguin e Toulouse-Lautrec. Eles também estavam insatisfeitos com o seu tempo.

A moral da história é que o ser humano é um eterno insatisfeito — o que não é necessariamente ruim. Ruim, e contraproducente, é estarmos sempre achando que os melhores anos ficaram para trás. Não creio que isso seja verdade. Talvez eu seja um sonhador, um otimista incurável ou qualquer outro adjetivo que deve ter sido usado para atacar alguém que, em plena Paris dos anos 1920 — cidade que abrigou uma geração chamada “geração perdida” —, teve coragem de afirmar que aqueles eram mesmo tempos extraordinários. Pois afirmo sem medo de errar que vivemos tempos extraordinários. Tempos de enorme criatividade, de manifestações culturais e políticas de todo tipo, em todos os campos do conhecimento. E, ao contrário do que ocorreu em outros movimentos artísticos e científicos, mobilizando não apenas uma elite, mas o conjunto da sociedade.

Nasci em 1965, o que faz de mim um integrante da primeiríssima safra da Geração X. Como representante dos X, sou forçado a reconhecer que as pessoas da minha geração passaram a juventude em décadas nas quais a espécie humana atravessou uma espécie de hiato criativo — ao contrário da elite da geração dos meus pais, que tinha hábitos culturais mais saudáveis. Era comum, na primeira metade do século 20, que os jovens mais favorecidos tivessem aulas de música, artes plásticas, interpretação e muitas outras atividades criativas. Embora restrito a uma elite, esse fenômeno era indiscutivelmente muito presente. Um típico baby boomer ou integrante da Geração X sempre será capaz de contar histórias do pai que tinha letra bonita, da mãe que tocava piano, do tio que escrevia poemas ou da tia que aprendeu balé, coisas típicas das gerações anteriores à Segunda Guerra.

É triste reconhecer, mas a minha geração foi obsessivamente orientada ao mercado de trabalho. Ter um bom emprego era infinitamente mais importante do que escrever bem ou ser capaz de tocar um instrumento musical. Poesia era para os fracos. Balé? Ora, faça-me o favor… Era comum passarmos meses sem escrever uma simples carta, daquelas antigas, manuscritas, com muitas folhas. Aliás, conheço muita gente que jamais escreveu uma carta. A leitura foi se tornando um hábito cada vez mais negligenciado pelos X, enquanto as matérias artísticas perdiam espaço no currículo escolar. Uma aulinha de artes plásticas e uma de música por semana era o máximo com o que podíamos sonhar. O negócio era trabalhar, ganhar dinheiro e, claro, cuidar cada vez mais do corpo. Por conta de tudo isso, muitos antropólogos, sociólogos e palpitólogos garantiram que a humanidade jamais voltaria a ler, escrever e criar como antes. Eles estavam redondamente enganados.

Não duvidem: vivemos um novo período renascentista no mundo. Não no sentido do neo-Renascimento do século 19, um movimento que apenas procurava resgatar o velho Renascimento. Nossa relação com o Renascimento não está na busca do antigo, muito ao contrário. O arquétipo do chamado homem renascentista foi Leonardo da Vinci, cujo talento se manifestava nas mais variadas formas de arte e ciência. Pois o novo Renascimento a que me refiro está conectado ao fato de cada vez mais e mais pessoas do nosso tempo estarem se tornando, como Da Vinci, multiartísticas.

As pessoas voltaram a ler, escrever, desenhar, pintar, compor e conversar nas mais diferentes línguas. Podem receber aulas de mestres do mundo inteiro, organizar manifestações, derrubar regimes políticos, redefinir a sociedade, questionar e transformar tudo. E a internet, grande contribuição da Geração X para a humanidade, foi a centelha que deflagrou esse re-Renascimento. Até que, no fim das contas, os X não fomos tão inúteis assim, não é verdade? Acho que Da Vinci teria orgulho de nós… 

* Marcos Caetano é diretor global de comunicação corporativa da BRF

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