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A baixa performance global em equidade

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Opinião

A baixa performance global em equidade

Os jogos olímpicos estimulam marcas a colocar atletas mulheres em suas campanhas, mas a disparidade de investimentos ainda é alta em relação aos homens


5 de agosto de 2024 - 6h00

Pela primeira vez na história, um número igual de homens e mulheres está competindo nas Olimpíadas.

Paris, 2024.

Pasmem, foram necessários mais de cem anos, dado que a primeira edição dos jogos aconteceu em 1896.

Coincidindo com esse momento na história das Olimpíadas, há um boom sem precedentes no interesse por esportes femininos nos Estados Unidos. O basquete feminino é emblemático dessa tendência: o torneio da National Collegiate Athletic Association (NCAA ou Associação Atlética Universitária Nacional) teve mais espectadores do que o torneio masculino; o interesse geral na Women’s National Basketball Association (WNBA – Associação Nacional de Basquete Feminino) aumentou 29% entre 2023 e 2024.

Como resultado, os anunciantes estão procurando alinhar suas marcas com essa nova onda de esportes femininos e suas atletas estrelas em ascensão. Um levantamento da Reuters afirma que as campanhas de marca que apresentam atletas mulheres dobraram este ano em comparação com os anos anteriores.

De fato, marcas de mercado geral como Powerade, Reese’s e Coca-Cola lançaram anúncios estrelados apenas por atletas mulheres, enquanto outros anunciantes, incluindo a Nike, incluíram um número igual de atletas mulheres e homens em suas campanhas olímpicas. Algo também inédito.

Mas os anunciantes estão acompanhando esse progresso em torno da audiência esportiva feminina não apenas representando as mulheres, mas dando a elas histórias equitativas e inclusivas? E seus investimentos em patrocínio refletem a influência e o poder crescente dos esportes femininos?

Claramente não. Por exemplo, ainda há uma enorme desigualdade no investimento em patrocínio: atletas do sexo masculino recebem 89% do volume de dólares investidos em patrocínio esportivo, deixando apenas 11% para atletas do sexo feminino, de acordo com um estudo de agosto de 2023 realizado pela Asics. A coisa fica ainda pior quando olhamos para as transmissões globais dos jogos e partidas. Ainda que os direitos sejam vendidos sem nenhuma distinção em função do gênero, apenas 14% das competições femininas são transmitidas ao vivo nos Estados Unidos. Para efeito de comparação, o número salta para 36% no masculino. Ingressos então, é assustador: dos que sobraram e foram oferecidos pelo COI, no último mês pré-jogos olímpicos, 67% eram de competições entre mulheres. E o preço deles chega a ser em média 41% inferior. Ou seja, é estrutural entender a discrepância de impacto e visibilidade para atletas mulheres junto ao consumidor.

Alguns traços de crueldade se apresentam quando se nota que a presença feminina fica restrita ao nicho previsível do marketing e publicidade. Em categorias como moda, beleza e higiene pessoal, nas quais as mulheres são consumidoras dominantes, as marcas fazem uso das estrelas do esporte. Simone Biles trabalha para Tampax, L’Oréal e Knix (marca de moda íntima). Por isso, faço questão de ressaltar quando a adequação e relevância vêm combinadas com propósito e sensibilidade, de maneira menos oportunista. Demonstração válida, mas não livre de questionamentos, desse ponto de vista está com a Pampers. A marca de fraldas acabou de inaugurar uma parceria com a ex-atleta olímpica aposentada de atletismo Alyson Felix para abrir a primeira creche na Vila Olímpica, para que atletas olímpicos com filhos não precisem sacrificar tempo com as crianças durante a competição. Um homem atleta seria escolhido para essa campanha? Alysson seria escolhida por outras marcas para protagonizar um contexto esportivo, de performance, desempenho, estilo de vida? Já sabemos que não faz sentido achar que mulheres falam apenas com consumidoras mulheres. Então, porque os nomes do universo feminino explorado pelas marcas que querem falar com homens se resumem a atrizes, modelos e cantoras?

Nessa linha de raciocínio, expoentes e figuras memoráveis do esporte têm sido contratadas não pelo seu protagonismo, importância e relevância cultural, mas por serem sinônimos de beleza, sedução e qualquer coisa num território mais sexista? Se sim, deveríamos ter vergonha enquanto mercado publicitário.

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