Chegamos à era da incerteza

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Opinião

Chegamos à era da incerteza

O momento é de troca do lifelong learning pela liberdade do lifelong unknowing


28 de novembro de 2022 - 9h53

Crédito: Shutterstock

A era da incerteza talvez seja o maior desafio da nossa geração e do nosso mercado que, de tão obcecado por certezas, fomentou um mercado de futurologia que tem deixado profissionais da cartomancia e astrologia realmente preocupados.

A era da incerteza demanda uma postura orientada pelo presente. A capacidade de reconhecer a existência dos desconhecidos, a coragem para aceitar e assumir que as convicções, visões e fórmulas vigentes e convenientes até agora talvez não façam mais sentido para os desafios do mundo atual e, principalmente, para o mundo que queremos construir. É o exercício da liberdade ao dizer “eu não sei” e se permitir o atravessamento de outros saberes e de novas possibilidades. A era da incerteza vai na contramão do lifelong learning — a versão biblioteconômica neoliberal do acúmulo e benefício individuais. A era da incerteza é o lifelong unknowing.

Se antes era motivo de orgulho e autoridade o fato de pertencermos a uma geração que viveu tanto a fase analógica quanto a digital, o on e o off, hoje, isso também é motivo de constrangimento e ressentimento, “cringe”, “vergonha alheia”, “boomerism” — escolha seu termo trendy preferido. Essa postura de quem se credencia como autoridade porque viveu antes e depois do Cristo internético camufla a ausência de letramento sociocultural adequado, que, como consequência, produz inconscientemente o ancoramento, o desencorajamento e a sabotagem contra a (re) evolução adequada dos pensamentos e das ações verdadeiramente inovadoras — as que realmente têm impacto em problemas reais da sociedade brasileira, as inovações de que precisamos, não as reproduções ilusórias de Grants, Browns, Sineks e Galloways da vida.

Somos parte de uma geração perdida, lost & damned. Nos tornamos capazes não de mudar o mundo, mas de apropriar, esvaziar e mercantilizar as tentativas de resistência, sobrevivência e revolução, chegando ao limite trágico dos agentes da iniciativa privada se apoiarem em um suposto “propósito”, DEI, ESG que serve muito mais para alavancar carreiras e manter a estrutura do mesmo jeito.

Quando digo novo, não me refiro a “ter mais pessoas diversas nas empresas”, pois essa conversa já caducou, porque já não estamos mais falando de inclusão, mas da necessidade de uma revolução.

Em O Império Contra-Ataca, há uma cena emblemática: ao desembarcarem na Cidade das Nuvens, Han Solo, Leia Organa, Chewbacca, C3P0 e R2D2 são recepcionados pelo dono da cidade, Lando Calrissian. Depois de descansarem, eles são ciceroneados até uma sala de jantar, onde Darth Vader os espera, revelando uma emboscada. Lando confirma: “Eu não tive escolha, eles chegaram antes de vocês. Eu sinto muito”.

A compra do Twitter por Elon Musk e o escancaramento desavergonhado da sua incompetência e desumanidade mostram que não estamos falando mais de sentar às mesmas mesas, mas construir novas mesas, com novos proprietários.

Nessas novas mesas, não serão tolerados quaisquer tipos de assédios ou retaliações. Mas, mais do que isso, terão a solidariedade como norte. Nessas novas mesas, as discussões sobre modelos de remuneração ganharão a profundidade necessária para que se garanta que todas as pessoas na cadeia produtiva atuem de forma saudável, digna e com mobilidade social. Nessas mesas, haverá o incentivo financeiro e educacional adequado para que novos empreendedores surjam com novas soluções. Nessas mesas, os prêmios não serão para os melhores trabalhos, mas para as maiores realizações e transformações. Nessas mesas, a política, em todas as suas formas, é um componente inevitável. Nessas mesas, a orientação é dada pela incerteza, pela abertura a outros saberes e viveres, novos e antigos, mas todos orientados à prosperidade coletiva.

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