Freio de arrumação
Depois de uma década de compras, holdings globais da publicidade desaceleram investimentos em aquisições, redimensionam presença no País e buscam maior sinergia
Depois de uma década de compras, holdings globais da publicidade desaceleram investimentos em aquisições, redimensionam presença no País e buscam maior sinergia
5 de fevereiro de 2018 - 19h29
Nos últimos dez anos, o avanço das holdings globais no mercado publicitário brasileiro ocorreu em uma velocidade jamais vista. Há dois marcos nesse ostensivo ganho de terreno pelas multinacionais. O emblemático ponto inicial é a compra da AgênciaClick pela rede Isobar, da Aegis, no início de 2007. O fim desse ciclo de quase uma década é também a última transação de alto valor registrada — e talvez a maior da história da atividade no Brasil: a aquisição de 100% do Grupo ABC pelo Omnicom, no final de 2015.
Ao contrário do que acontecia antes, com ocorrências mais esparsas, nesse intervalo houve praticamente um grande negócio por ano, sendo que os mais importantes foram as vendas da Lew’Lara (2007), Z+ (2008), W/Brasil (2010), DPZ e Fbiz (2011), Neogama (2012), Talent (2013), NBS (2014) e Taterka (2015). Com isso, a configuração no topo da pirâmide do mercado brasileiro mudou totalmente.
Entretanto, nos dois últimos anos, as holdings globais desaceleraram investimentos em aquisições no País. Após a venda do ABC, não ocorreu nenhuma grande compra no mercado local. Pelo contrário, alguns grupos optaram por diminuir seus portfólios, com fusões, como a que uniu BETC e Havas no ano passado, e até mesmo fechar operações, como acaba de ocorrer com a Neogama — cujas contas foram repassadas pelo controlador Publicis Groupe para outras duas agências suas: Leo Burnett Tailor Made e DPZ&T.
O foco da presença da holdings globais de agências no Brasil parece ter mudado da compra de share para a otimização de recursos. O Publicis Groupe trilhou esse caminho e colheu bons frutos com seu modelo mais enxuto e reporte de todas as empresas a um único executivo (Justin Billingsley, COO da Publicis Communications para América Latina e Europa). Em 2011, depois de uma onda de aquisições, chegou a ter mais de 15 empresas no País. Após readequações e fusões, mantém agora nove agências. O movimento de consolidação coincidiu com um expressivo crescimento no ranking de compra de mídia. Se consideradas as 50 maiores da lista da Kantar Ibope Media, até 2015 o líder era o WPP. Mas, nos dois últimos anos, mesmo com um portfólio de agências menos numeroso, a holding francesa ultrapassou a britânica.
O WPP, que com suas mais de 50 empresas continua sendo o maior em receita total no Brasil, deu na semana passada um passo inédito que também parece apontar para a busca de maior sinergia entre suas agências, com o objetivo de gerar ofertas multidisciplinares e prospecção colaborativa, com a nomeação de Sergio Amado como country manager da holding no País. Esse modelo que propõe um comando único não é implementado sem ruídos. Há, por exemplo, o temor de perda de relevância por parte de alguns líderes regionais das redes integrantes da holding. De fato, um country manager num país das dimensões do Brasil pode esvaziar parte das funções dos CEOs das redes para a América Latina, aos quais são feitos atualmente os reportes financeiros e institucionais.
Com forte viés econômico e sempre atentas às variações na cotação de suas ações, as holdings têm tomado decisões mais centralizadas — vide a ordem do Publicis Groupe para que nenhuma de suas empresas invista em festivais de publicidade por um ano. Porém, o esforço para colocar agências de variadas disciplinas trabalhando em conjunto na prospecção de novos negócios e na oferta multidisciplinar tão almejada pelos clientes não é simples e não se alcança com memorandos internos.
Os enormes desafios que os grupos globais têm pela frente vão além das adequações na atuação das agências que já possuem. Incluem um novo plano de aquisições estratégicas, provavelmente focado em empresas menores e de fora da seara da publicidade; a retenção de talentos, especialmente os mais jovens, normalmente refratários ao estilo mais burocrático e engessado das grandes holdings; e a manutenção de times executivos que preservem as características empreendedoras que construíram o mercado brasileiro. Assim, a indústria poderá continuar atraindo gente como Julio Ribeiro, morto na semana passada, que no início da década de 1980, quando tinha quase 50 anos de idade e em uma época de crise, se lançou na “aventura romântica” de construir a agência dos seus sonhos — o que ele não só conseguiu como deixou de exemplo para as próximas gerações.
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