Opinião

Os cases gringos mais memoráveis de Cannes 2025

Iniciativas como The Final Copy of Ilon Specht, vencedor do Grand Prix de film, são exemplos de consistência das marcas e reconhecimento a quem faz parte da história delas

Gabriela Rodrigues

Chief impact officer da Droga5 São Paulo 30 de junho de 2025 - 14h00

Todos os anos, eu separo cerca de três noites para assistir a todas as campanhas inscritas em Cannes que ganharam ao menos um Leão. É entretenimento puro e eu super indico para quem tiver acesso ao Love The Work, site oficial de Cannes, ou ao “Love the work more”, iniciativa não-oficial criada para expandir o acesso gratuito à informação.

Esse ano, houve muitas campanhas que me chamaram a atenção. Aqui vão cinco delas e seus porquês.

1) “Captions With Intention”: ano passado, enquanto o Brasil vibrava pela Fernanda Torres, um amigo meu, surdo, falava: “Eu só queria poder assistir a esse filme, mas ele não está legendado em nenhum cinema brasileiro”. Fiquei pensando, então, na falta de acessibilidade no cinema global e como a indústria deveria mudar isso.

Pois bem, esse case, vencedor do Titanium, de 3 Grand Prix e mais 9 Leões, é um exemplo de solução: usaram o design como uma ferramenta de acessibilidade para legendas de cinema, que ainda hoje não transmitem entonação, intensidade e nem são claras ao identificar quem está falando.

O mais interessante? Ele não apenas funciona, como foi adotado nas regras de submissão ao Oscar 2026, reconhecido pela Academia e apoiado por grandes estúdios como Netflix e Disney.

 

2) “Three words”: esse aqui me pegou pela simplicidade e pela abordagem humana de uma marca de seguros. Em resumo, esse vencedor de 2 Grand Prix, 1 Titanium e mais 7 Leões adicionou no contrato de seguros domésticos um novo motivo para realocação urgente.

Um motivo com três palavras: “e violência doméstica”. O porquê? Mulheres que sofrem com violência doméstica normalmente continuam sob o mesmo teto do agressor por não terem para onde ir.

A empresa de seguros AXA decidiu ajudar oferecendo, além de um novo teto temporário, apoio psicológico e assistência legal sem custo adicional. Mais uma vez, uma campanha que pode definir um novo padrão na indústria.

 

3) “Sato 2531”: eu gosto quando vejo campanhas de impacto que usam humor como tom de voz. Mostram que não é preciso ser denso, professoral e muitas vezes chato para falar sobre crises sociais e ambientais.

Nesse caso, o objetivo era alertar sobre o problema de casamentos apagarem os nomes femininos e manterem somente os herdados dos maridos, algo similar com o que ocorre no Brasil. Para alertar sobre o problema e pressionar instituições, um estudo brilhante de dados projetou que, se nada mudar, em 2531 “Sato” será o único sobrenome existente.

E foram além: conseguiram fazer com que 40 entidades adotassem o nome “Sato”, resultando em apoio político e uma recomendação da ONU para a revisão da lei, além de 5 Leões. O movimento aumentou o apoio público e um primeiro-ministro favorável à mudança foi eleito, sinalizando progresso na igualdade de gênero. E tudo foi feito com muito sarcasmo, o que deixa a campanha ainda mais brilhante.

 

4) “Sounds Right”: achei incrível o fato de criarem um hacking na cultura e entretenimento para gerar fundos para a preservação da natureza. Como? Fazendo com que a natureza se tornasse a primeira artista não-humana verificada no Spotify, com sons que, quando usados por outros artistas ou ouvidos diretamente, gerariam royalties para financiar a conservação.

Foram mais de 150 milhões de streams e parcerias com artistas renomados e o que achei mais interessante é que é o lançamento não apenas de uma campanha, mas de um novo modelo econômico que alia música e ação climática.

Tomara que continue ativo e que vá muito além de um case pontual, que levou 1 Grand Prix e mais 3 Leões.

 

5) Por último, mas longe de ser menos importante, queria destacar o tão tocante documentário The Final Copy of Ilon Specht, vencedor do Grand Prix de film e de mais 3 Leões.

Ilon, foi ninguém menos do que a criadora da assinatura “Porque você vale muito”, da L’Oréal (em inglês, Because we’re worth it). Uma mulher que mudou a publicidade em um tempo em que mulheres não tinham espaço em grandes agências e que nos deixou em 2024.

O que me fez escolher essa campanha como parte do meu Top 5 é a consistência de marca e o reconhecimento de quem faz parte da história dela. E também a escolha corajosa de investir em um asset de quase 20 minutos quando a indústria nos ensina a sermos cada vez mais breves. Incrível, L’Oréal!

E, para terminar este texto, não posso fazer diferente. Preciso encerrar com uma frase da própria Ilon:

“É sobre seres humanos, não publicidade. É sobre cuidar realmente das pessoas. Porque todos nós valemos muito.”