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A falsa simetria da influência

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Opinião

A falsa simetria da influência

Medir o marketing de influência com ferramentas da mídia de performance pode parecer eficiente, mas gera uma miopia estratégica


27 de junho de 2025 - 14h00

Nos últimos anos, o avanço dos modelos de mensuração em mídia digital levou o mercado a uma armadilha conceitual: acreditar que tudo o que pode ser medido pode ser comparado. A influência digital passou a ser analisada com as mesmas réguas da mídia digital— como se CPM, CTR e conversão direta fossem universais e suficientes para avaliar toda e qualquer entrega de valor.

 Mas a influência opera em outro plano. Ela é simbólica, contextual, diluída no tempo e profundamente emocional. Tentar medi-la com ferramentas pensadas para mídia de performance pode parecer eficiente no dashboard, mas gera uma miopia estratégica: ignora os elementos subjetivos que movem a decisão de compra, a construção de preferência e a real eficiência da campanha.

 

O que não aparece na planilha

O valor da influência está em seu caráter cumulativo: na repetição simbólica, na familiaridade construída com o influenciador e na identificação subjetiva. É uma construção relacional e não transacional. E é justamente nesse espaço, onde a lembrança consciente não atua, que os modelos tradicionais falham. Decidir por uma marca por conta da relação com uma pessoa não é algo que se mede com régua de venda direta.

Essa dificuldade de atribuição direta, no entanto, não é exclusividade da influência. Formatos como vídeo, OOH e display também enfrentam desafios semelhantes. A diferença é que, no caso da influência, a neblina é mais densa. Porque além de atravessar diferentes formatos, canais e devices, a disciplina atua em múltiplas camadas: entre mídia, comportamento, comunidade e cultura. Tratar influência como mídia pura é ignorar sua essência híbrida — e é exatamente nesse ponto que sua potência emerge.

 

O peso do endosso

Evidências acadêmicas reforçam a ideia de que o impacto do influenciador não pode ser comparado linearmente ao da mídia tradicional. Um estudo publicado na Humanities and Social Sciences Communications demonstra que atributos como autenticidade, valor informativo e identificação com o influenciador fortalecem os laços parassociais com o público, o que eleva de forma significativa a intenção de compra. A influência aqui opera menos como exposição e mais como relação.

Outro estudo recente, publicado na Inglaterra por autores chineses, mostrou que campanhas com influenciadores tendem a ter melhor performance na introdução de novos produtos do que as baseadas em publicidade tradicional, justamente pela capacidade de gerar engajamento afetivo e sensação de pertencimento junto à audiência. Tudo isso aponta para uma realidade inescapável: o convencimento gerado pela influência tem natureza distinta. Não é apenas sobre ser visto, é sobre ser validado por alguém com quem o consumidor já se relaciona.

 

Para medir influência é necessário transcendê-la

Paradoxalmente, medir bem a influência exige ir além dela. Modelos econométricos e testes de lift continuam sendo caminhos eficazes para identificar impacto real, mas não dão conta sozinhos. Pesquisas de campo e avaliações psicométricas complementam essa leitura ao mapear percepção, identificação e intenção de compra a partir da relação com o influenciador. Já ferramentas de social listening ampliam o entendimento sobre o comportamento em rede, revelando conversas orgânicas, sinais culturais e o efeito simbólico do endosso nas comunidades.

Ainda que muitos desses métodos enfrentem desafios de escalabilidade, especialmente em ambientes com múltiplos influenciadores, são recursos fundamentais para decisões mais precisas. Manter essas abordagens no radar, mesmo que aplicadas em momentos pontuais, pode fazer toda a diferença na escolha estratégica dos perfis com maior peso na estratégia da marca.

Chegou o momento de abandonar a falsa simetria. Medir o impacto da influência exige entender não só o que aparece na planilha, mas, principalmente, o que a planilha não consegue capturar.

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