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Opinião

Sem unanimidade

A capacidade de unir tamanha amplitude de pensamento, em tempos de polarização extrema, talvez seja o grande valor da peregrinação anual para Austin, em março 


18 de março de 2018 - 9h36

Austin recebe 32ª edição do SXSW (Crédito: Jonas Furtado)

Colocado sob judice semanas antes de sua realização, o South by Southwest chegou a sua 32a edição sob a pressão de provar o próprio valor, algo comum a eventos que atingem tal magnitude e relevância, mas que muitas vezes é o começo de um possível desgaste na fórmula. Não foi desta vez, no entanto, que a sensação de perda de tempo superou a famigerada síndrome de não ter tempo para ficar sabendo de tudo o que está acontecendo em Austin.

Este foi o meu terceiro festival e nunca havia visto tamanhas multidões vagando pelas ruas rumo aos painéis, ativações e sessões nas diversas arenas oficiais espalhadas por Downtown. Diretor-geral da M&M Consulting, Pyr Marcondes tem mais do que o dobro de participações do que eu e confessou a mesma sensação, enquanto saboreávamos o tradicional churrasco texano na pausa para o almoço: nunca vira tanta animação na delegação brasileira, que mais uma vez quebrou o recorde de presença no SXSW. A quantidade de pessoas prometendo voltar no próximo ano também é um ótimo indicador.

Essa energia colaborativa é peça fundamental na engrenagem bem-sucedida do SXSW, um evento cuja áurea e a eficiência dependem fundamentalmente da troca estabelecida entre os participantes. É um festival essencialmente interativo, não basta contemplar. A pluralidade de ideias, origens e estilos também é ímpar.

“Temos de abrir portas e cabeça para tentar fazer diferente. Aqui você consegue ver as mudanças que estão acontecendo, assuntos diversos. Dá para perceber como outras indústrias estão passando por mudanças semelhantes por conta da mudança de comportamento das pessoas”, afirmou Luiz Sanches em entrevista à repórter Isabella Lessa. O copresidente e executivo-chefe de criação da AlmapBBDO esteve pela primeira vez no evento em Austin. Seu parecer pessoal: “estou adorando”.

Historicamente um festival democrático quanto às patentes de sua frequência, um lugar onde as empresas americanas recrutam novos talentos, a área de Interactive do SXSW, que concentra as atrações ligadas à inovação em suas mais diversas aplicações, tem atraído um número maior de líderes de agências e executivos do primeiro time
de grandes anunciantes. Ao mesmo tempo que segue investindo em workshops e sessões de mentorias para seu público original, de olho nos novos frequentadores, mais maduros, o festival incrementou o número de personalidades de diferentes áreas a se apresentarem nos grandes salões do Centro de Convenções de Austin.

Nessa seara, o grande momento do festival foi a participação de Elon Musk. Ele disputa com Jeff Bezos, da Amazon, o posto de homem de negócios mais influente do mundo, posto que por muitos anos pertenceu a Steve Jobs. O propósito dos investimentos e a irresistível imagem de desbravador de Marte conferem um glamour especial ao criador e CEO da Tesla e da SpaceX. A histeria em torno da participação do jovem empreendedor ganhou as ruas e Musk tomou o SXSW de assalto ao seduzir a plateia com histórias fantásticas de viagens espaciais e empreendedorismo sem limites.

Mas Austin não é um lugar para unanimidades.

Em sua tradicional palestra anual no SXSW, o escritor e filósofo Bruce Sterling disse não acreditar em uma só palavra de Musk. “Que conversa era aquela? Foi a hora mais estranha da minha vida”, ironizou o autor, consagrado por sua obra cyperpunk em que o avanço da tecnologia alimenta o abismo entre as classes sociais.

Sterling provavelmente passou maior parte de seu tempo em sessões ligadas a possíveis desdobramentos de temas superatuais da nossa sociedade. E a edição deste ano do SXSW deu um passo importante para consolidar seu espaço como um grande fórum de debates dessas discussões, com destaque especial para as participações do democrata Bernie Sanders, cotado para ser candidato à Presidência dos Estados Unidos nas próximas eleições, Tim O’Reilly, empresário e ícone da luta pela internet livre, e Bozoma Saint John, chefe executiva de marca do Uber.

Essa capacidade de unir tamanha amplitude de pensamento, em tempos de polarização extrema, talvez seja o grande valor dessa peregrinação anual, em março, para o Texas.

O futuro não terá uma única direção.

 

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