14 de março de 2022 - 6h11
Minha primeira memória de filmes de herói, na verdade, não é bem um filme de herói, mas de heroína. Tinha menos de dez anos quando estreou nos cinemas Alien, o Oitavo Passageiro, e devo tê-lo assistido mais próximo de meus 15 anos. E, desde então, a imagem de uma jovem e forte atriz com nome estranho nunca saiu da minha mente: Sigourney Weaver, intérprete da personagem Ripley, a única sobrevivente do ataque de um alienígena que se infiltra em uma nave espacial e que se provou uma das mais poderosas protagonistas femininas na ficção científica. O filme acompanha a tripulação da embarcação espacial Nostromo, que acaba tendo que lutar por suas vidas após um alienígena tomar conta da nave.
Sigourney Weaver em Alien: A Ressurreição (Crédito: Rex/Shutterstock)
Em 2019, quando o filme completou 40 anos de estreia, Sigourney revelou que, originalmente, o papel havia sido escrito para um homem. “Eu acho que o roteiro original era só para homens. Quando eles começaram a reescrever o roteiro, conversaram sobre quem devia ser o sobrevivente. E eu acho que a razão que acabaram tornando Ripley uma mulher foi que, naquele momento, ninguém acharia que uma desconhecida acabaria interpretando a sobrevivente”, disse.
Dois anos atrás, logo no início da pandemia, fiz uma maratona de alguns filmes clássicos de um dos meus diretores de cinema preferido: Ridley Scott. E foi arrebatador perceber que quatro décadas antes, Alien foi um marco da história do cinema de ficção. A discussão sobre igualdade de gêneros que o filme traz é de uma contemporaneidade assustadora. Ao contrário da imensa maioria dos filmes que buscam intencionalmente descontruir estes conceitos, Alien não esfrega as desigualdades do mundo real na cara do público. Ao contrário, ela as ignora e concebe uma sociedade na qual as diferenças não existem.
O próprio protagonismo de Ripley não é imediato. Ela se estabelece aos poucos como líder, e, finalmente, como única sobrevivente.
Pouco tempo depois de ter assistido Alien fui ao meu primeiro concerto de rock, do alto dos meus 16 anos. Assisti nada menos do que o show da banda inglesa de rock Siouxsie and The Banshees. Quem foi adolescente nos anos 1980 sabe da febre das chamadas boy bands e ver ali na minha frente uma front leader mulher com a grandeza de Siouxsie Sioux marcou minha vida para sempre. Para quem nunca ouviu falar, o grupo foi um dos pioneiros do pós-punk e sua vocalista e líder Siouxsie influenciou uma geração de artistas de sua época e posterior como PJ Harvey, Kim Gordon, da banda Sonic Youth, e Elisabeth Fraser, da banda Cocteau Twins. Conhecida como a Rainha do Dark, ela é antes de tudo um símbolo de empoderamento, liberdade, rebeldia e erotismo como expressão de feminilidade, e uma ávida militante contra rótulos que limitem o que artistas possam ser ou fazer enquanto profissionais.
Siouxsie Sioux (Crédito: Reprodução/Facebook)
Uma sociedade demonstra que determinado valor ou comportamento é importante para ela quando cria um termo para expressá-lo. É o caso de ‘role model’, expressão usual em países de língua inglesa, mas que não possui um equivalente exato em português. Os dicionários tendem a traduzi-lo como “uma pessoa cujo comportamento em um papel específico é imitado por outros”. Seria algo como “modelo de conduta”. Na sociedade americana, é comum uma personalidade pública que desperta admiração ser chamada de “role model”, pelo seu poder de influência.
Sou de uma geração na qual não havia role models femininas no mundo corporativo. Por isso, nessa estreia do meu blog, chafurdei minhas mais recônditas memórias para trazer as duas primeiras role models femininas: Sigourney Wervaer e Siouxsie Sioux. Não por acaso, ambas da indústria cultural.
A alegria de voltar a ter um blog, agora integrante da plataforma Women To Watch, da qual tenho a honra de ser curadora, é proporcional à nossa missão: aumentar e dar visibilidade ao protagonismo feminino para ajudar meninas a terem também exemplos reais e próximos de mulheres fortes e poderosas.