Quebrando o teto de vidro em Cannes
Esse ano, me chamou a atenção a busca por atrair a atenção para temas mais críticos, como um convite a publicitários e publicitárias para se engajarem em temas urgentes
Esse ano, me chamou a atenção a busca por atrair a atenção para temas mais críticos, como um convite a publicitários e publicitárias para se engajarem em temas urgentes
22 de junho de 2019 - 17h40
O festival de Cannes é historicamente conhecimento por reconhecer os melhores trabalhos em publicidade e celebrar a criatividade em todas as suas formas. Mas nos últimos anos, discussões mais amplas, que envolvem a sociedade, tem crescido. Esse ano, me chamou a atenção a busca por atrair a atenção para temas mais críticos, como um convite a publicitários e publicitárias para se engajarem em temas urgentes. E peço licença nesse espaço dedicado às premiações e belos cases, para falar do lado menos glamurouso que vi do festival.
Existe um fenômeno nas empresas conhecido como teto de vidro, as barreiras invisíveis que impedem que mulheres e outros grupos minorizados alcancem cargos de liderança. Esses tetos de vidro encontram seus alicerces na discriminação de gênero e na suposta diferença comportamental e de performance entre homens e mulheres. O termo “glass ceiling” surgiu em 1986 nos Estados Unidos e continua muito presente 33 anos depois.
Em uma sessão sobre a batalha das mulheres asiáticas por mais espaço na liderança, vimos que mesmo países desenvolvidos social e economicamente, ainda estão muito atrás nesse quesito. Na super high tech Coréia do Sul, país em que meus pais nasceram, eu teria poucas oportunidades de encontrar um lugar no board de uma grande empresa. Apenas 2.1% dos que fazem parte do board executivo de empresas coreanas de capital aberto são mulheres. Como referência, no Brasil, mulheres são 11% dos conselhos administrativos das 500 maiores empresas.
Em diversas sessões, em sua maioria com uma platéia formada majoritariamente por mulheres, algumas palestrantes buscaram compartilhar jeitos dd atingirmos maior equidade de gênero e mudar a cara de quem senta nas mesas de decisão:
Fique confortável com a ideia de estar sempre desconfortável
Shonda Rhymes, escritora, produtora e fundadora da Shondaland, responsável por sucessos como “Grey’s Anatomy” e “Scandal”, tem uma biografia de sucesso que poderia cobrir mais algumas linhas. No painel “Quebrando estereótipos de beleza”, Shonda foi contundente ao afirmar que vamos ter que nos acomodar com a ideia de desconforto nas salas de reuniões e ambientes de trabalho, espaços majoritariamente brancos. “Se todo mundo na sala se parece com você, há um problema”, ela afirma. É a responsabilidade de quem tem os privilégios de estar em lugar de algum poder trazer mais pessoas para a mesa, trazer mais mulheres críticas, mais vozes diferentes.
Equidade na criação e cuidado dos filhos
As políticas de governos escandinavos que garantem igualdade de gênero no cuidado dos filhos é o que garante que eles lideres nos índices de equidade de gênero na sociedade. Na Suécia, por exemplo, os pais podem dividir igualmente os dias de licença, e cada um tem direito a tirar 90 dias reservados exclusivamente para ele ou para ela ficarem com seus filhos. Segundo Phumzile Mlambo-Ngcuka, diretora executiva da ONU Mulheres, que fez a última palestra do festival, essas políticas permitem que as mulheres se desenvolvam na força de trabalho, com iguais oportunidades para ambos os pais.
Mudando as leis
Outra ação apresentada por Phumzile, que foi ainda a primeira mulher a ocupar o cargo de vice-presidente da África do Sul (2005-2008), é a ajuda na re-inclusão de mulheres que sofreram violência ou assédio impedindo que elas se desenvolvessem economicamente. Ela mencionou a Nova Zelândia como primeiro país a dar licença remunerada a mulheres que sofreram violência doméstica. E contou projetos de leis que visam indenizar mulheres que sofreram assédio sexual nos ambientes de trabalho.
Algumas iniciativas parecem revolucionárias para um país que ainda está na discussão de cores quando se fala de gênero. Mas ver duas mulheres negras que não apenas quebraram os tetos de vidro, mas construíram palácios próprios, me faz acreditar que uma nova geração inspirada por elas vai mover mundos.
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