Comunicação

Como produtoras estão lidando com a GenAI

Companhias tentam encontrar equilíbrio entre uso da tecnologia e importância da visão criativa tradicional

i 5 de novembro de 2025 - 12h22

Por Brandon Doerrer, do Ad Age

Produtoras e uso de iA

Primeiro anúncio com IA criado pela Google Creative Lab (Créditos: Divulgação)

Há apenas um ano, veicular um anúncio com o uso significativo de inteligência artificial (IA) faria diretores de cena suarem frio. Ferramentas de inteligência artificial generativa (GenAI) não ofereciam o nível de controle criativo que as produtoras desejavam ter sobre os produtos finais, e as reações à publicidade feita com IA eram frequentemente ambíguas ou negativas.

Em parte, o sentimento permanece, mas hoje as produtoras estão mais confortáveis em mostrar aos consumidores conteúdos criados com GenAI. A tecnologia é usada inclusive em campanhas importantes, incluindo a de início de temporada da NFL, que utilizou IA e computer generated imagery (CGI) para criar uma cena com carro alegórico e torcedores da liga.

@nfl this is the year. you better believe it. #nfl #nflkickoff ♬ original sound – NFL

Produtoras e diretores estão aceitando melhor o uso de GenAI à medida que a tecnologia evolui, oferecendo maior controle criativo sobre as produções. Tal conforto tornou-se imperativo ao passo que marcas começaram a pedir por parceiros que usassem IA no processo de produção.

Para atender à demanda, produtoras começaram a contratar executivos e times criativos para definirem em quais momentos se deve usar a tecnologia. Enquanto algumas mapeiam o uso da IA junto de outras tecnologias, outras ainda estão decidindo como adotar a ferramenta, temendo pela segurança de alguns empregos.

Por que marcas estão buscando produtoras que usam IA?

As marcas costumavam ser cautelosas quanto ao uso de GenAI em campanhas, porém, recentemente, passaram a solicitar o uso da tecnologia.

“Está acontecendo cada vez mais. Minha preocupação é que eles nos procurem com esse pedido por uma decisão financeira”, conta Andrew Travelstead, produtor-executivo da Biscuit Filmworks.

A Biscuit trabalha com diretores que preferem manter certa visão artística, o que, muitas vezes, exige a gravação de um filme. Travelstead prevê conflitos quando os diretores insistirem em obter uma qualidade que a GenAI ainda é incapaz de produzir e clientes insistirem em velocidade e menor custo.

“Isso com certeza se tornará uma batalha. As pessoas que tomam decisões financeiras normalmente não são da área criativa e vão pedir por algo similar ao que a Coca-Cola tem feito — uma integração significativa de IA que transforma o modo de se fazer filme”, explica Travelstead.

A Coca-Cola utilizou GenAI para produzir suas campanhas de Natal. Em colaboração com a Silverside, a marca orquestrou uma história que demonstra o comprometimento da marca com inovação, sem perder o charme da temporada natalina.

Travelstead espera que a IA terá participações maiores nas produções, gradualmente. Marcas raramente pedem que campanhas sejam completamente geradas com IA, pois os modelos não permitem microajustes, tornando difícil a criação de imagens de alta qualidade.

Normalmente, as marcas pedem uma abordagem híbrida, que envolve o uso de GenAI e efeitos visuais tradicionais.

A tecnologia é mais útil nos estágios iniciais da produção, segundo Mungo Maclagan, deputy managing director da Stink Films. A companhia está produzindo comerciais que misturam animação e live-action, que são cenários de fundo incorporados na composição de uma tomada final de efeitos visuais.

A produtora usou IA no design e para desenvolver personagens antes de apostar em efeitos visuais mais tradicionais, segundo Maclagan.

“Pudemos explorar os personagens de forma rápida e eficiente, até certo ponto. Mas depois, quando agências, clientes e diretores trouxeram ajustes muito específicos, tivemos que utilizar a abordagem tradicional. A IA ainda não permite esse nível de especificidade”, conta o executivo.

Quando usar GenAI ou efeitos visuais tradicionais

Diversas partes do anúncio de início de temporada da NFL foram geradas por IA, incluindo um bebê utilizando roupas dos Raiders e maquiagem. A dupla de diretores Tusk, representada pela M ss ng P eces, trabalhou em parceria com a 72andSunny utilizando dez ferramentas e modelos de IA, entre eles produtos da Ad.

Para evitar gerar visuais estranhos a partir de textos, essas partes foram criadas com CGI e depois foram animadas com auxílio de IA. Por exemplo: o carro alegórico foi construído com uso de CGI, depois ganhou textura e iluminação com inteligência artificial. Cada parte criada com a tecnologia foi depois refinada com efeitos visuais tradicionais.

A Tusk também construiu algumas partes usando CGI por não conseguir criar com IA. Inicialmente, a dupla recorreu à IA para gerar o golfinho em que Druski está montado, mas não era possível sincronizar o animal com os movimentos de Druski. O uso da tecnologia também tiraria o sentido de que a cena acontecia em frente a uma tela verde.

A inteligência artificial também foi usada durante a pré e pós produção, incluindo em concorrências — gerando imagens originais, em vez de combinar referências.

“Foi muito útil, especialmente na campanha da NFL, porque tinham tantas cenas únicas que era impossível encontrá-las online, pois simplesmente não existiam”, conta Kerry Furrh, cofundador da Tusk.

“Até pesquisamos no Google: ‘Papa em um enorme carro alegórico da NFL com 32 times’, mas não encontramos nada”, brinca Olivia Mitchell, cofundadora da Tusk. “Por décadas, fizemos referências a trabalhos de outras pessoas, através de imagens encontradas no Google. Estamos nesse ramo e agora é mais fácil fazer referências a imagens e elas serem originais”.

A M ss ng P eces e seus diretores determinam quão proeminente a IA será nos estágios iniciais de um projeto, segundo Kate Oppenheim, managing partner da produtora.

“Sentamos juntos com o produtor executivo, os diretores, o supervisor de IA e o supervisor de efeitos especiais e perguntamos: ‘O que vamos fazer?’. Antes mesmo da IA, quase sempre houve várias maneiras de criar algo. Tudo se resume a decifrar o ‘cubo mágico’ de opções com base no tempo e no orçamento que temos disponível”.

Definir como a IA não será usada também é importante, acrescenta a executiva. Exceto por bebês e personagens de fundo desfocados, a M ss ng P eces não usa GenAI para criar pessoas.

“Ainda há, e permanecerá existindo, esse sentimento negativo em relação a pessoas feitas com IA, deixando o storytelling mais desafiador. Qualquer coisa sincera que você estiver tentando transmitir pelo anúncio soará estranha”, conta Oppenheim.

Até o Google evitou o uso de pessoas geradas por IA em seu primeiro anúncio do Google Creative Lab, lançado no final de outubro. Ao invés disso, um peru chamado Tom estrelou a peça, usando o Google Search AI Mode para planejar uma fuga antes do Dia de Ação de Graças.

No entanto, pessoas geradas com IA estão começando a aparecer nos anúncios. Uma peça da P.C. Richard & Son, lançada em agosto, apostou nisso.

Apesar dos esforços manuais e considerações que seguiram a campanha da NFL, a Tusk recebeu diversas críticas sobre o uso de IA. Os comentários mais curtidos no YouTube são críticos ao uso da tecnologia, e diretores receberam mensagens após o lançamento de pessoas que acreditavam que a IA tinha sido usada na produção inteira.

“Todo mundo acha que é um trabalho preguiçoso. A indústria está a par, mas o público geral não”, diz Olivia, da Tusk.

Como as profissões estão mudando devido à IA

Diversas produtoras estão contratando diretores e supervisores de inteligência artificial.

Alvin Cruz chegou à Prettybird como ECD de inovação em outubro, ficando responsável por estar à par das últimas novidades sobre o uso de IA, implementando as ferramentas nos processos da companhia.

“Me juntei com todo mundo, indo desde o setor jurídico até o de engenharia, para deixar tudo nos conformes”, conta o executivo. “Estamos em uma posição sólida, mas o mundo da IA evolui todos os dias. A cada segundo, surge um modelo novo para testar”.

Outras produtoras estão buscando preencher essas vagas. Oppenheim conta que a M ss ng P eces planeja acrescentar papéis voltados para a IA, que irão construir fluxos de trabalho e apoiar produções individuais em 2026.

Embora a maioria dos executivos espere que a IA gere maior quantidade de filmes publicitários, a percepção é de que marcas necessitam de expertise para decidir quando usar ou não a GenAI.

“Se a espada continuar afiando, vamos usar a tecnologia”, conta Travelstead, da Biscuit. “Mas ainda é preciso ter pessoas que tenham experiência em direção há alguns anos para criar o produto final. Não dá para simplesmente entregar uma espada a alguém que vai usá-la de maneira estúpida”.