Criação em casa: “KPI do cliente deixa de ser instagramável”
Alex e Rafael Fittipaldi, sócios e diretores criativos da MediaMonks, comentam desafios de produções remotas e adaptação de eventos para o digital
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Isabella Lessa
28 de abril de 2020 - 6h00
Colaborações entre os escritórios da MediaMonks são recorrentes desde os primórdios da agência, que nasceu com foco em serviços digitais na Holanda. É comum uma situação em que um cliente de Los Angeles manda um briefing que é comandado pelo escritório de São Paulo, produzido em Buenos Aires e criado pela equipe de Amsterdã.
O que mudou efetivamente, contam os sócios e diretores criativos Alex Fittipaldi e Rafael Fittipaldi, foi o aumento do que chamam de “check-ins diários” com o time nacional, para controlar o que está acontecendo sem de fato ver o que ocorre no dia a dia.
Em operação desde 2016 (o escritório paulistano foi lançado por meio da aquisição da Cricket, empresa fundada por eles e a MediaMonks, por sua vez, foi comprada pela S4 Capital, de Martin Sorrell28), a MediaMonks São Paulo não trabalha com duplas criativas, pois esse formato vai, segundo eles, contra a cultura colaborativa da empresa.
Desde que começou a quarentena, as entregas que mais sofreram alterações foram as de experiential, justamente o maior foco da empresa no Brasil. Mas, em vez de morrerem, eventos e experiências se transformaram à nova realidade: o Facebook Boost, evento que a rede social realizaria presencialmente, virou um evento digital por meio de lives, webséries e mesas-redondas. “Estamos tocando inteiramente de casa, o roteirista está em um lugar, o diretor em outro. Está acontecendo muito essa digitalização na parte de eventos para as marcas continuarem dialogando”, detalha Rafael.
Muitos outros eventos que a MediaMonks realizaria neste ano – como a parte de UX e experiências em 3D – já estavam em fase final de produção e também foram readaptados para o digital. Apesar da crise inevitável que acomete o setor de eventos, a produtora teve de montar um time exclusivo para cuidar da crescente demanda de propostas, pitches e gerenciamento de projetos para marcas que querem levar seus eventos para o digital.
Para a Nike, a MediaMonks São Paulo está criando séries com personalidades em suas casas fazendo exercícios. O desafio foi, de acordo com eles, manter a qualidade da produção e garantir a segurança dos participantes. A empresa enviou os equipamentos higienizados e, por videocall, houve montagem do aparato de filmagem e direção remota dos famosos. “Todo dia a gente vê uma live de música que ainda têm a mesma estrutura de produção, com 15, 20 pessoas. A gente tenta reduzir ao máximo neste momento”, diz Alex.
Meio & Mensagem — Como a MediaMonks organiza o fluxo de projetos internamente durante a quarentena?
Alex Fittipaldi — A gente cria canais específicos para cada grupo que cuida de cada projeto. Desta forma, as conversas ficam fluidas e naturais.
Rafael Fittipaldi — Todos os nossos arquivos estão no cloud. Então todo mundo já tinha acesso a tudo antes de entrar na quarentena, foi só levar o computador para casa. Fazemos aprovações de filmes no digital com o cliente, então essa cultura ajuda bastante.
M&M – Quais são os desafios que as atuais condições trazem para o processo criativo?
Alex – Normalmente os grupos são menores para cada tipo de trabalho, mas o que estou vendo agora é que todos os escritórios estão se mobilizando. Temos recebido briefings de Los Angeles e, no mesmo dia, 60 pessoas estão no mesmo documento dando ideias. Parece desorganizado, mas tem sempre uma pessoa responsável por filtrar as ideias que serão apresentadas para o cliente. Então temos tido diferentes perspectivas para um mesmo projeto.
Rafael – Acabou dando voz para um monte de gente. Horizontalizou ainda mais, porque todo mundo fica ali naquele call, o espaço fica mais aberto. No meio digital, é possível extrair mais ideias de pessoas que têm mais vergonha de dar ideias. A gente sempre teve um estilo de criação em que gostamos de colocar não só gente de criação, mas engenheiros, designers de produtos.
M&M — Wesley ter Haar, cofundador e COO da MediaMonks, defende muito o fato de que a indústria hoje não pede uma grande ideia, mas sim uma série de boas ideias. Como vocês colocam isso em prática?
Rafael — O modelo antigo em que colocávamos a dupla de criação em uma salinha e, dias depois, eles surgiam com a grande ideia não funciona mais porque hoje colaboração está no coração de tudo isso. A cocriação com o cliente é algo muito grande. Aquela coisa de não mostrar o trabalho porque não está pronto, não existe mais. Às vezes, a ideia que achávamos que era maravilhosa nem é a ideia que vai resolver o problema de comunicação do cliente.
Alex — Muitas vezes o cliente responde com comentários em tempo real. Claro que para isso é preciso ter a confiança do cliente.
M&M — O modelo defendido pela S4 Capital é o do “better, faster, cheaper”. Como esse modelo se aplica na realidade atual dos negócios?
Rafael — O modelo funcionou no momento que a gente mais precisou: em um momento de crise, de emergência, todos clientes ficaram carentes de campanhas do zero. Campanhas que tinha seis meses para executar, tiveram de ser substituídas por campanhas que, em duas semanas, estavam na rua. Inclusive, a gente proativamente montou equipes de criação e atendimento que bolavam ideias e ativando os clientes um por um, antes de eles nos acionarem. O que faz a diferença é se colocar como parceiro ativo.
Alex — O cheap não necessariamente quer dizer mais barato, é mais pensando na linguagem do programático, automatização de mídia, em como economizar nesse processo.
Rafael — Em vez de fazer uma produção de vídeo de milhões, num dia você marca fotos de social e outro dia faz o texto… nossa ideia é utilizar o investimento do cliente de uma só vez. Pensando em recortar o conteúdo em milhares de possibilidades.
M&M — Para as lives da Nike, vocês tiveram de dirigir as pessoas remotamente. A diminuição de recursos ajuda a criatividade?
Alex — Ajuda a ter ideias que não teríamos em outros momentos.
Rafael — Acho lindo ver o cliente e o público aceitando muito mais hoje em dia. Ninguém vai reclamar se tiver um probleminha, um defeito visual ali no canto direito da tela. Deu uma baixada nas expectativas de todo mundo e acho bom, porque mostra que dá para fazer um bom conteúdo sem o preciosismo exagerado.
M&M — Quais tendências de conteúdo podem ser previstas para os próximos meses?
Alex — Falando de projetos, as pessoas estão de forma geral estão mais expostas à tecnologia, muitas que nunca usaram tiveram de sair da zona de conforto. E as pessoas conseguiram sair bem rápido desta zona, mas conforme estão mais expostas e entendendo melhor, quando passar a crise principal, as pessoas vão passar a demandar mais interações que não tinham. Serão mais exigentes em relação a experiência que estamos propondo. E diversos artigos científicos falam que as pessoas acabam mudando depois de crises como essa, ficam mais solitárias, têm depressão e vão conseguir se conectar ainda mais com outras pessoas. Seja em experiential ou algo totalmente digital, teremos de pensar nesse fator humano, em como aguçar mais percepção das pessoas, ativar essa parte sentimental. Sempre que a gente fazia um projeto, o KPI do cliente é que precisava ser instagramável. Acho que as pessoas vão tirar um pouco isso da cabeça e criar conexões mais profundas, tirar vazio do superficial e pedir por coisas novas.
Rafael — As pessoas não querem mais one way, querem cocriar, fazer junto. Se olhar as novas grandes plataformas surgindo no conteúdo e na tecnologia, são ferramentas que permitem qualquer pessoa criar e compartilhar, é só ver o sucesso do TikTok, dos creators de Instagram e YouTube. O que vai mudar é como a comunicação adiciona esse elemento novo onde as pessoas fazem parte. Existe muito medo nisso, porque quando você abre a voz para todo mundo, perde um pouco aquele filtro que você tem na sua comunicação. Mas, se a gente não tiver essa coragem, não deixar as pessoas participarem, não vai conseguir se destacar. Para a gente, o futuro são livestreams — e outros projetos — que são modificados ao longo da exibição. Quanto mais as pessoas fazem parte deste processo, elas perdoam mais e sentem que fazem parte daquilo.
*Crédito da imagem no topo: iStock
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