O recado das urnas para as marcas: posicionem-se!

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Opinião

O recado das urnas para as marcas: posicionem-se!

Um pequeno grupo de fãs da marca, desde que abastecido por um conteúdo coerente e ativados de forma constante, é capaz de apresentar um retorno do investimento muito melhor que ‘celebridades das redes sociais’ pagas de forma esporádica


16 de outubro de 2018 - 10h31

Crédito: Tarikvision/iStock

O resultado do primeiro turno das eleições presidenciais mostra a crescente importância da articulação entre valores e redes sociais embora, é bom lembrar, 30% do eleitorado brasileiro não tenha acesso à internet (mas a maioria dos consumidores que tem algum poder de compra usa as redes com uma intensidade que é destaque mundial).

É claro que o resultado obtido por Bolsonaro não é fruto direto somente do uso das redes sociais, afinal a tecnologia não existe no vácuo. De forma geral, a transição de uma sociedade industrial para uma baseada em serviços aumenta a preocupação das pessoas com valores relacionados com a autoexpressão e racionalidade secular, em contraposição aos valores tradicionalistas/sobrevivencialistas. Obviamente, esta não é uma trajetória linear, e a tensão entre esses diferentes polos é dependente de condições econômicas objetivas (crises, etc). Essas transformações, combinadas com as mudanças demográficas vão lentamente aumentando as pressões sobre o sistema político, com as eleições servindo como uma “válvula de escape” dessas tensões a cada quatro anos. Esse é um fenômeno bem documentado nas democracias europeias e americana desde a década de 1980, mas que parece ter sido acelerado pela evolução tecnológica (para quem tiver mais interesse sobre o assunto recomendo o excelente Modernização, Mudança Cultural e Democracia, de Ronald Inglehart).

Bolsonaro foi construindo sua marca de forma lenta, mas consistente com os valores de uma parcela expressiva do eleitorado. A polarização com um adversário (PT) e o atentado de que foi vítima serviram para projetar esse trabalho na mídia tradicional — e antes que alguém se lembre de que ele só tinha 8 segundos no horário eleitoral, foi o candidato que mais apareceu na mídia “clássica” entre 6 de setembro (dia do atentado) e a véspera da eleição. Segundo a Bites, empresa que desde 2016 monitora as redes dos candidatos, Bolsonaro saiu de 5,602 milhões de seguidores (Facebook, Twitter, YouTube e Instagram) em 1/10/2017 para 14,124 milhões em pouco mais de um ano. Mais importante: ele não só apresentou o maior índice de engajamento por posts entre todos os candidatos (média de 16.907), mas também o maior crescimento nesta métrica nos últimos 12 meses: 82,9%.

Tão importante quanto a visibilidade nas “grandes redes”, foi sua instrumentalização para coordenar milhares de “microrredes”, impulsionadas por ativistas, que via
Whatsapp se encarregavam de divulgar mensagens e notícias (algumas fakes, outras verdadeiras) favoráveis ao ponto de vista do candidato. Quando esta estrutura de “microaudiências” foi amplificada pela mídia tradicional e por grupos articulados ao redor de valores religiosos (o apoio explícito dos movimentos evangélicos na reta final da campanha), criou-­se uma “onda” que quase resultou na vitória em primeiro turno.

Isso mostra que para a atuação efetiva nas redes, uma atuação consistente e frequente sobre os mesmos temas pode ser mais importante que um crescimento rápido “comprado” via apoio de influenciadores — até porque o consumidor, assim como o eleitor, está cada vez mais consciente deste tipo de manifestação. É o velho princípio do Capital Social: uma combinação entre confiança, comunicação recíproca e endosso coletivo, mais do que valores monetários. Um pequeno grupo de fãs da marca, desde que abastecido por um conteúdo coerente e ativados de forma constante, é capaz de apresentar um retorno do investimento muito melhor que “celebridades das redes sociais” pagas de forma esporádica.

Ao mesmo tempo, não se pode descartar, como algumas análises mais apressadas fizeram, o poder da mídia tradicional, desde que utilizada como instrumento de caráter mais “comunicativo” do que “propagandístico”. É evidente, como demonstra o fracasso do “latifúndio midiático” de Alckmin, que não é mais possível entender a publicidade como um “discurso” sobre a marca martelado na televisão e no rádio. Ela deve, necessariamente, se tornar uma conversação sobre valores: a mídia tradicional serve para introduzir o assunto, mas sem a sustentação e ressignificação gerada pelas redes sociais está fadada ao fracasso. A publicidade se aproxima, cada vez mais, do jornalismo e das relações públicas.

Voltando ao contexto da campanha, independentemente do resultado final do segundo turno, é provável que nos próximos anos a sociedade brasileira esteja crescentemente envolvida em “guerras culturais”, nos quais valores como Família, Sexualidade, Religião, Mercado e Estado (direito de regular porte de arma, currículo escolas, etc) estarão no centro de polêmicas amplificadas por um novo sistema de mídia. Será necessário entender como sua marca pode se posicionar neste espaço, mesmo que ela não queira, em função de uma ação infeliz (lembram­-se da campanha carnavalesca “esqueci o não em casa”?), o comentário equivocado de um funcionário em uma rede social ou mesmo “fake news corporativas”. Canalizar esta demanda para alimentar uma nova forma de fazer publicidade, baseada na interação entre microinfluenciadores, redes sociais e a mídia tradicional é a maneira de ganhar a eleição no bolso do consumidor.

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