Por que eles podem e eu não posso?

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Opinião

Por que eles podem e eu não posso?

Impedimento à coexistência de marcas concorrentes no portfólio de clientes de uma mesma agência de publicidade é um tabu que precisa ser revisto


15 de dezembro de 2021 - 14h51

A reflexão de hoje é sobre o porquê de até hoje existir um paradigma grande de que cada agência de publicidade só pode ter uma conta de cada categoria de produto ou serviço.

Publicitários buscam trazer a mídia para controle interno e sair das dependências das agências externas (Créditos: iStock)

Historicamente, se falava que as agências têm acesso a informações muito sensíveis e confidenciais, planos de inovação, posicionamento de marca, o plano de mídia do ano todo. Sim, verdade. Nossos parceiros têm acesso a isso e até mais, hoje, com todo o trabalho de gerenciamento dos canais digitais e e-commerce. No entanto, vale observar que todas as grandes consultorias estratégicas têm acesso a
informações que são, muitas vezes, muito mais sensíveis: o P&L da empresa, a estrutura organizacional, o plano de negócio como um todo, planos de aquisições, planos de abertura (ou fechamento) de novos canais de vendas, estratégias de portfolio de longo prazo, arquitetura de marcas e de categorias e por aí vai. E todas as grandes consultorias conseguiram estruturar um esquema de governança, gerenciamento de times e de segurança da informação para poder atender a P&G de manhã cedo, a Unilever na hora do almoço, o Boticário de tarde e a Avon no fim do dia. E nós convivemos com isso. NDAs são assinados, times são segregados e a vida segue. Outro caso são as empresas de plataformas de tecnologia e até de canais de mídia que, até um certo ponto também têm uma grande visibilidade do direcionamento do nosso negócio com antecedência. Sabem qual é meu plano de lançamentos e quais são minhas prioridades estratégicas para o ano todo, assim como dos meus concorrentes diretos. E mais: todas essas empresas, hoje, estão organizadas por vertentes de indústria. Então, a mesma pessoa ou time atende todas as marcas daquele mesmo segmento.

Então, por que as consultorias e os veículos de mídia conseguiram implantar isso e as agências não? Será que falta um processo de governança mais robusto das informações e uma melhor segregação de times exclusivos, no caso de concorrentes? Ou será que isso era uma premissa antiga que existia no mercado e que até hoje não caiu? Porque tenho dificuldade de acreditar que uma grande agência não conseguiria desenvolver e colocar em prática um sistema sério que assegurasse as informações sensíveis de cada cliente. Talvez para uma agência menor isso seja mais complexo, por ser mais difícil de separar os times. Mas e as grandes?

Com a onda de fusões e diminuição do número de agências que existem no mercado, uma tendência no Brasil e no mundo, atender marcas do mesmo setor vai ser algo muito provável que aconteça. Além disso, com o crescimento dos marketplaces e “fintechização” de
tudo, o número de marcas que consideramos “concorrentes” cresceu exponencialmente em quase todas as categorias de produtos e serviços nos últimos anos.

A coexistência de concorrentes dentro da mesma agência assusta, parece estranho, mas eu realmente acredito que isso é um padrão do nosso mercado que precisa ser revisto. Com uma boa governança e estrutura adequada, acho que é muito possível isso acontecer sem grandes riscos aos anunciantes.

O presidente da minha agência parceira me ligou há uns meses com um “causo” assim. Ganharam uma concorrência de uma grande empresa e uma das contas que vinha era de uma categoria na qual nós operamos.

E agora? Agora, bora montar uma governança de informações sigilosas, segregar os times e cuidar para que ambas as marcas possam
coexistir dentro da mesma agência sem risco e conflito. A coexistência é possível se existir boa intenção das duas partes.

Então, fica aqui a reflexão: será que não chegou a hora de rever essas regras? Se eles podem, eu deveria poder também.

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