Opinião
Receita para a sobrevivência de um meio de comunicação
Apostar em conteúdos diferentes, exclusivos, de interesse da audiência são pontos cruciais para esse tipo de negócio
Apostar em conteúdos diferentes, exclusivos, de interesse da audiência são pontos cruciais para esse tipo de negócio
21 de janeiro de 2022 - 6h00
(Crédito: Shutterstock)
Um veículo de comunicação é um negócio. Tem custo e precisa de receita para pagar a conta. O mesmo que um restaurante, uma loja, um mercado, com a diferença que o conteúdo oferecido não se toca, não se guarda na bolsa, não se come: se absorve. Depois de absorvido pode ser compartilhado com amigos, familiares, vizinhos, colegas e até nas redes sociais.
Mas, outra vez, isso tem custo. O custo cresce em relação direta com a qualidade do que se pretende apresentar. Profissionais experientes custam mais do que jornalistas em início de carreira. Reportagens trabalhadas necessitam mais tempo e investimento do que textos frágeis e rasos. Análises profundas exigem mais trabalho do que opinião de amigos.
Da mesma forma que há restaurantes populares que oferecem refeições completas por pouco dinheiro e restaurantes gourmets para poucos e bem cuidados pratos por preços nada populares, veículos de comunicação precisam calibrar a régua a partir de algumas variáveis. O produto é montado para uma audiência específica. Terá um custo X e deverá arrecadar mais de X em publicidade e em receita de audiência se não quiser quebrar. Esse X é maior ou menor dependendo do perfil que quiser adotar, direcionado a uma audiência específica com potenciais anunciantes que aceitem suas características e pretendam chegar ao mesmo público. Nesse ajuste de sintonia fina errar é muito fácil.
Soma-se a tudo isso o domínio das plataformas de distribuição – impresso, áudio, vídeo, digital e outros. Também a explosão de competidores pela mesma audiência, o controle do mercado por gigantes de tecnologia como Google e Facebook (ou Meta) e a demora em se entender as novas regras a partir da chegada do Digital. Tudo isso, aliado à pouca capacidade de gestores em tomar decisões rápidas, cavou a sepultura de um bocado de empresas no mundo todo.
A nova vítima dessa realidade incompreendida é o jornal Agora São Paulo, que deixou de circular segunda-feira, dia 29 de novembro. Seguiu os passos nada invejáveis de empresas como Gazeta do Povo (Curitiba), Jornal do Brasil (Rio de Janeiro), A Gazeta (Vitória), Diário do Nordeste (Fortaleza) e Jornal do Commércio (Recife), para citar apenas os maiores. Fora das capitais a lista é bem maior. O Agora não mudou quando podia, apostou em um modelo esgotado de jornalismo popular e fechou. Curiosamente, seu preço de capa no fim da vida – desde meados de julho – era de R$ 4, valor nada popular em um país de quase 20 milhões de desempregados. Possivelmente fruto do desespero de um gestor tentando “pagar a conta”, sem entender a audiência.
O modelo de negócios de uma empresa de comunicação é tão importante quanto seu modelo editorial. Sem o produto não há chances de ganhar relevância. No mundo do jornalismo, importante é fazer o oposto do que recomenda o jornalista inglês Nick Pisa no seriado Amanda Knox (Netflix, 2016). Pisa, responsável por inúmeras capas no popular The Daily Mail (Londres) diz: “Recebia informações e publicava. Não podia esperar, perder tempo checando a veracidade. Precisava dar antes, ou perdia o furo. Isso é jornalismo”.
Não, Nick. Isso não é jornalismo. Isso é um dos fatores que mata o jornalismo, cria confusão entre qualidade e irresponsabilidade.
Empresas que quiserem entrar 2022 com alguma chance de prosperar devem entender em que negócio estão. E definitivamente apostar em conteúdos diferentes, exclusivos, de interesse da audiência. Ou vão fazer companhia ao Agora São Paulo no cemitério dos veículos esquecidos.
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