Marketing

O recado das ruas para as marcas

A verdade ganhou a disputa contra o jabá

i 16 de julho de 2013 - 8h30

(*) Por Mauro Silva

O meu plano para este artigo era escrever sobre o Festival de Cannes e trazer referências e discutir esse que é o maior evento de criatividade publicitária do mundo. Mas algo muito maior aconteceu e roubou a pauta.

Os acontecimentos das ruas chegaram para escancarar algumas verdades e provocar pensamentos e ações adequados à nova realidade das pessoas. A mensagem das ruas não foi somente para o governo, mas também, em certa medida, para as marcas.

Enganam-se os que acham que esse movimento é direcionado exclusivamente a protestar contra posturas do governo e dos partidos. O movimento vai muito além disso. Junto com a crise de representatividade política e todas as insatisfações que afloram disso, as pessoas estão expressando a insatisfação com a falta de verdade. Que se expressa na forma de governar, mas se expressa também na forma antiga de fazer propaganda.

Mudamos de era.

Ficou para trás a época em que a mensagem criativa tinha o poder de vencer o jogo e começou a era em que a inovação do negócio por meio da comunicação é a única maneira de se manter relevante. Ficou para trás a era de esconder o problema e começou a era de construir a solução. O modelo de sucesso não se resume mais em encontrar a mensagem certa para a marca, mas sim encontrar o que o negócio precisa para ser atraente para as pessoas.

Parece difícil? Realmente é. Mas é isso que estamos vivendo. Portanto, encontre as suas armas e garanta que entre elas você terá um bom dispositivo de ouvir os milhões de pequenas mensagens que são enviadas a cada dia. E faça bom uso disso em favor do negócio e com criatividade.

Estamos evoluindo de uma indústria de mídias integradas, para uma indústria que conecta pessoas. E, junto com as pessoas, vêm suas causas, ideais e movimentos. Estamos evoluindo do egocentrismo das marcas para as histórias reais das pessoas. Estamos evoluindo para uma civilização que entende a necessidade de solucionar problemas de forma sustentável e conta com a inventividade para conseguir existir.

Nos últimos anos já vimos que a insistência persuasiva das mensagens publicitárias ficou para trás. Já vimos muitos bons exemplos de marcas que entenderam que não podem ser intrusivas e, em vez disso, criam mensagens com força gravitacional própria. Já evoluímos para um ambiente no qual está claro que a opinião de um amigo é mais poderosa do que a mensagem de uma marca para dizer o que vale e o que não vale. E estamos evoluindo para um mundo onde as marcas têm um papel cada vez mais responsável em promover algo positivo para as pessoas em coletividade, ao mesmo tempo que alcançam resultados comerciais. É um mundo diferente que a gente já está vivendo.

É diferente para nós que estamos na indústria da propaganda assim como é diferente para o poder público que tem de entender como representar as expectativas dos cidadãos. Nada fácil, mas excitante — e com ótima perspectivas.

Em Cannes, um lugar onde se celebra a propaganda, surgem exemplos positivos que foram corretamente premiados e exemplos negativos que demostram velhos vícios ultrapassados. Um deles é o vício de tentar pegar carona na reputação de celebridades sem estar realmente interessado em ouvir o que eles têm a dizer. Algumas agências contrataram grandes nomes para subir ao palco. Mas infelizmente não souberam fazer um bom uso das inteligências.

No caso mais extremo, uma falha de condução levou uma grande network de agências digitais a algo próximo de um vexame. O presidente da agência liderou uma entrevista com Vivienne Westwood e acabou perdendo o apoio da plateia por tentar embretar o pensamento da convidada e encapsular seus argumentos em torno de conceito de comunicação da agência. Foi um erro básico que mostra uma espécie de oportunismo desmedido da classe publicitária e demonstra que os que tentam aproveitar cada momento em uma lógica egocêntrica não estão entendendo que o público é mais interessado na pura verdade do que no jabá.

(*) Mauro Silva é sócio e vice-presidente de criação e planejamento da LiveAD. Este artigo está publicado na edição 1568 de Meio & Mensagem, de 15 de julho, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets.

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