Inspiração

Planejamento em tempos de mudança: os aprendizados de Mariana Teixeira

Diretora de planejamento da AlmapBBDO, fala sobre como a adaptabilidade e a escuta ajudam a construir times fortes em meio à transformação

i 5 de julho de 2025 - 10h38

Mariana Teixeira, diretora de planejamento da AlmapBBDO (Crédito: Divulgação)

Mariana Teixeira é diretora de planejamento da AlmapBBDO e está à frente das campanhas da Volkswagen. Ainda na faculdade de publicidade, percebeu que tinha maior afinidade com a área de planejamento nas agências. Iniciou um estágio na Thompson (então JWT), e de lá para cá, passou por grandes agências como a Young & Rubicam (atual VML), Publicis, Africa, FCB e já atendeu grandes marcas como Nokia, HSBC, Shell e Bayer.

Ingressou na Y&R como assistente, atendendo marcas como Danone e Vivo, e passou a desenvolver sua carreira ao longo de seis anos e meio na agência. Em 2017, já como gerente na Y&R, conquistou o Young Lions de Planejamento com um case da Cielo, o que ampliou sua visibilidade no mercado. Pouco depois, foi convidada a integrar a equipe da Publicis, onde ascendeu para diretora de planejamento atendendo marcas como Bradesco, Honda e Nestlé. Após um período na FCB, em que esteve à frente de marcas como Intimus, Huggies, Flash e Aurora, recebeu a proposta da AlmapBBDO para atender a Volkswagen.

Nesta entrevista, Mariana fala sobre a mais recente campanha da Volkswagen, “Chegadas”, que contou com a parceria da Netflix para divulgar o carro Tera em diferentes séries reconhecidas da plataforma. Além disso, ela avalia os desafios atuais que os profissionais de planejamento enfrentam num contexto marcado pela impermanência.

Meio & Mensagem – Vocês lançaram recentemente a campanha “Chegadas” da Volkswagen em parceria com a Netflix. Conte um pouco dos bastidores dessa campanha, como ela surgiu e como foi produzir?

Mariana Teixeira – Cheguei na Almap no final de janeiro deste ano, e o processo da campanha da Volks com a Netflix já estava rolando. Participei mais da construção de timeline, definição de presença, quais features do carro seriam destacados. O briefing da Volks sempre foi muito claro: posicionar o carro como um grande ícone. E isso fazia todo sentido, porque é um modelo com muito apelo, pensado para um público em ascensão, que quer mostrar suas conquistas com símbolos concretos. Hoje, o carro dos sonhos é um SUV, e o Tera vem justamente para democratizar esse acesso.

A gente precisava de uma campanha muito impactante. Afinal, falar de um ícone da Volks com o histórico que a marca tem em comunicação era um baita desafio. Tínhamos o desafio adicional de ser uma campanha para toda a América Latina. E aí, ou fazíamos algo muito caro e internacional, ou algo sem impacto. A Netflix casou perfeitamente com o que precisávamos.

No planejamento, nosso papel foi entender quais séries funcionariam melhor, com quais públicos estávamos falando, e ir pavimentando esse caminho. Era importante que, quando o filme principal chegasse, tudo já estivesse construído em torno do mesmo tema. Foi um trabalho coletivo incrível, com um time muito bom, do tipo que você aprende com todo mundo.

M&M – Na sua opinião, quais habilidades são essenciais para os profissionais de planejamento hoje?

Em planejamento, eu acho que tem duas coisas que são indispensáveis. A primeira é a escrita. A gente precisa ser muito claro no que quer comunicar. É sobre conseguir construir uma narrativa de forma que o cliente e as pessoas entendam, ir construindo essa história e trazendo mais gente pro barco.

A segunda coisa é a curiosidade. É você se interessar de verdade por um assunto, mesmo que ele não seja uma paixão sua. Por exemplo: eu não sou apaixonada por carros. Eles sempre estiveram presentes na minha vida, acho superinteressantes porque falam de mobilidade, de ir para lugares, de algo que está no nosso dia a dia. Mas não sou aquela pessoa que fica pesquisando qual é o carro do ano, sabe? Só que quando você está trabalhando com uma marca de carros, precisa se interessar.

E aí você vai descobrindo coisas que viram interesses pessoais ao longo do processo. Acho que tem esse outro lado legal que é como a gente consegue fazer as indústrias se conectarem. A indústria automotiva, que às vezes é mais fria, pode ganhar muito com a do entretenimento, por exemplo. Então é isso: uma curiosidade constante e uma forma de escrever que consiga transmitir de um jeito claro e inspirador para cada pessoa.

M&M – Quais são as principais mudanças que você observa no comportamento do consumidor atualmente?

MT – Nossa, eu acho que a única constante é que tudo está mudando. Às vezes, mesmo olhando só para o Brasil, a gente vive momentos de estabilidade econômica, depois vem desemprego e isso afeta até o mercado automotivo. Por exemplo, o aumento de motoristas de aplicativo tem mudado o setor. Mas acho que são muitas mudanças acontecendo, aqui e no mundo. As expectativas das pessoas também vão mudando. Voltando ao exemplo da Netflix: o jeito como você escolhe um filme ou uma série acaba influenciando o que você espera ao comprar um carro. Você quer que seja tão simples quanto.

Tem muito medo no ar, mas também tem muita gente querendo aproveitar a vida. Não dá pra ficar só focando no que está errado no mundo. E mesmo temas como sustentabilidade, que influenciam o mercado automotivo, às vezes não impactam só pela causa em si. Muita gente compra um carro híbrido não porque ele vai salvar o planeta, mas pela tecnologia.

Acho que cada pessoa está encontrando um jeito próprio de lidar com tudo isso, com essa velocidade, com as mudanças, com a inteligência artificial. E como tudo muda tão rápido, não dá tempo de existir uma regra. Cada um vai reagindo de um jeito, e o nosso papel é entender, o mais rápido possível, como aquele público específico está lidando com aquilo naquele momento.

E, ao mesmo tempo, a gente também vai se descobrindo nessas mudanças todas, como pessoas, como indivíduos. É um tempo muito rico em informação, em cultura, mas também muito desafiador justamente pela velocidade das coisas.

M&M – De que forma você integra as áreas de criação, mídia e atendimento no desenvolvimento de campanhas?

MT – Acho que o nosso papel em planejamento é garantir que está todo mundo remando para o mesmo lugar. Às vezes, a gente precisa se intrometer um pouco em algumas coisas, sabe? Ver se está tudo certo, se dá pra ajudar. Porque tem uma parte do processo em que é natural a gente se afastar, como quando entra na etapa de produção. Mas eu acredito que a gente precisa estar sempre envolvido, mesmo que não seja algo necessário naquele momento. Isso permite dar inputs, acompanhar de perto e, às vezes, direcionar algo que poderia ser melhor.

Acredito muito num trabalho conjunto, muito alinhado. Cada um respeitando a entrega do outro, claro, mas quanto mais gente discutindo um assunto, mais difícil é cair num lugar comum. Às vezes, não conseguimos isso por falta de tempo ou outros motivos, mas em projetos grandes isso se torna essencial.

Acho que é por isso que conseguimos bons resultados: porque tem muita gente contribuindo, somando detalhes, e às vezes é justamente um detalhe que faz toda a diferença. E aí, quando todo mundo começa a se juntar pra fazer acontecer e enxerga o potencial da ideia, dá pra ver claramente que está todo mundo remando junto.

M&M – Qual foi o maior desafio da sua carreira e como você lidou?

MT – Acho que o maior desafio é a síndrome da impostora. Ela está ali todo dia, de algum jeito. E o momento em que saí da Y&R pra ir pra um lugar novo deu aquele frio na barriga, tipo, será que vai dar certo? Será que é isso mesmo? Será que eu vou me dar bem? Foram muitos anos num só lugar, onde você já sabe quem é quem, aprende a lidar com tudo, e o ambiente te conhece também como pessoa. Quando você vai pra outro lugar, está chegando agora, sem história, sem vínculo. Dá uma sensação de estar meio desprotegida.

Então esse momento de me provar, de entender se eu realmente conseguiria lidar com tudo aquilo, foi bem disruptivo. E fui lidando aos poucos, com um pouco de desconfiança, mas também trabalhando, entendendo como as coisas funcionavam, quais eram os desafios, como me relacionar com pessoas que eu não conhecia.

Sempre gostei muito de conversar. Se você não coloca o seu ponto de vista, sempre com muito respeito e cuidado, é difícil esperar que o outro entenda o que a gente está tentando dizer. E também acreditar que tudo bem discordar. Tá tudo bem discordar, porque às vezes é daí que vem um caminho melhor. Colocar meu ponto de vista, conversar, entender cada pessoa e cada momento foi essencial pra eu ir me descobrindo fora daquele lugar onde estive tanto tempo. Entender que eu não era só a profissional da Y&R, que eu era uma profissional construída a partir de tudo isso.

No lado pessoal, teve um ponto marcante também. Sempre mantive minha vida pessoal separada, principalmente por ser lésbica. No começo, achava melhor deixar isso quieto. Mas nessa mudança eu pensei: cara, não tem porquê. Na época, eu namorava uma pessoa do mercado publicitário também. E falei: é isso, pra quê evitar esse assunto? Não era esconder, mas pra quê evitar? Estar num lugar novo, sendo 100% eu, foi muito importante. E realmente fez muita diferença.

M&M – Como você descreveria seu estilo de liderança?

MT – Acho que tudo começa pela conversa. Cada pessoa está ali trabalhando, mas, se a cabeça está em algum problema pessoal ou se a gente não está bem fisicamente, com alguma coisa acontecendo, é muito difícil conseguir dar o nosso melhor. No fim das contas, acho que é como qualquer relação: esse time precisa entregar 100%. Às vezes eu vou dar 20%, às vezes vou dar 80% para cobrir os outros 20% de alguém. É sobre a gente se complementar, puxar um ao outro.

Eu gosto muito de conversar, trocar, ensinar, compartilhar o que eu sei e aprender também. Quando a gente consegue fazer isso, tirar o melhor de cada um, o trabalho flui. Tentar colocar todo mundo numa mesma esteira, num modelo engessado, não funciona. Você não tira o melhor das pessoas assim. Cada um contribui de um jeito, e isso faz parte da formação do time também. Ter personalidades diferentes ajuda a equilibrar outras personalidades e isso, no mundo corporativo, conta muito.

Como eu tenho essa visão do todo, vou conversando, entendendo o perfil de cada um e tentando formar esse organismo que, no fim das contas, entrega 100%, mesmo que alguém, naquele momento, não esteja bem. E aí penso: dentro daquele cenário, se tem alguma coisa acontecendo, como é que eu transformo esses 80% em 100%?