Múltiplas responsabilidades

Além de se desdobrarem para responder a contextos de comportamento de consumo mais complexos, CMOs têm de fazer isso calibrando estratégias voltadas às gerações atuais e futuras


13 de outubro de 2023 - 10h07

Por Caio Fulgêncio, Giovana Oréfice e Valeria Contado

Os executivos-chefes de marketing da GM, McDonald’s, P&G, Unilever, Nestlé, The Fini Company e Disney Brasil estiveram nos painéis da trilha The Next CMO (Crédito: Eduardo Lopes/Imagem Paulista)

Lidar com novos comportamentos de consumo, contextos regulatórios, o cenário multiplataforma e o jogo de equilíbrio entre atender a contento consumidores atuais, que garantem os resultados de negócio hoje, mas desvendar os anseios das novas gerações, sem as quais não há futuro, estão entre os desafios dos profissionais de marketing debatidos na trilha The Next CMO.

Os CMOs na era conectada

Com o crescimento do consumo multiplataforma, as marcas têm o desafio de buscar a atenção dos consumidores em diferentes fases e momentos do dia, e conseguir que essa interação aconteça de forma natural.

Esse contato é um dos assets dos CMOs, que buscam unir criatividade ao uso de dados na construção de uma comunicação eficiente e personalizada de acordo com cada perfil de cliente e produto de um portfólio. Por isso, as marcas passaram a entender em maior profundidade como funciona cada um dos canais usados para se conectar com cada perfil de consumidor e, assim, definir o modelo de negócio a seguir e qual a estratégia de comunicação mais eficiente a determinada marca. “Nesse mundo multicanal, com tendências e dados, a criatividade é fundamental”, pontuou Maria Belen Silvestris, CMO da Procter & Gamble.

Já na General Motors, por exemplo, um dos focos, neste momento, é trabalhar o life time value, que são estratégias para gerar uma jornada mais longa ao lado do cliente. “A jornada não é mais linear. Precisamos garantir que estejamos em todos os pontos de contato. Gostamos de testar bastante coisas, temos feito pilotos e acompanhamos a evolução”, explica Christianne Rego, CMO da GM.

No McDonald’s, um dos assets fortes para a marca é a mídia, na qual está sempre ativa. O CMO Sérgio Eleutério afirma que por esse ser um ponto de contato muito forte, o investimento na relação com as agências e com cada tipo de veículo é grande. “O mundo da mídia tem muitas possibilidades. Por isso, a agência tem que entender seu negócio e criar soluções de negócio, e isso passa por mídia”, diz. O executivo reforça, ainda, a análise de dados como auxílio para definir a melhor abordagem para se aproximar do consumidor em cada momento de sua jornada.

No entanto, Maria Belen, da P&G, alerta que é preciso estar atento ao que cada dado significa: “Eles podem ser algo ruim, se não soubermos trabalhar. Mas de modo geral, os dados são um bem hoje, precisamos normalizar o trabalho com eles de forma eficiente e ágil”.

Conexão e cultura no setor de alimentos

Mudanças de hábitos de alimentação, aumento da atenção à saúde e bem-estar, múltiplos pontos de contatos. Nos últimos anos, as marcas da indústria de alimentos têm intensificado os investimentos e estratégias na construção de conexão e cultura junto aos consumidores.

Ionah Kochen, vice-presidente de marketing e comunicação da Nestlé, defendeu que a abrangência do portfólio tem papel fundamental, pois permite alcançar mais pessoas em diferentes momentos, o que, para o marketing, amplia a capacidade de análise de comportamento, entendendo as oportunidades de conexão. “Temos um portfólio de produtos que abrange todas as fases da vida, desde a decisão das mulheres pela gravidez até o envelhecimento saudável, e tem sido interessante estar atento a todas as tendências. Cultura, conexão e engajamento dos consumidores passam por isso”, disse.

Para o líder da divisão de nutrição da Unilever Brasil, Rodrigo Visentini, o consumidor está cada vez mais consciente, buscando saudabilidade e sustentabilidade: “Está mais criterioso nos ingredientes que vai consumir, olhando a fundo essas informações”. No entanto, ainda há espaço às compras de indulgência. Ionah concorda que a busca pelo “exclusivo e perfeito” no consumo foi substituída por uma noção de equilíbrio. Assim, segundo a VP, a opção dos consumidores tem passado pelo balanço entre produtos saudáveis e indulgentes. Por isso, é preciso conseguir oferecer itens que se encaixem nesses dois momentos.

Na Unilever, existem metas específicas de redução pela metade de sal, gordura e açúcar até 2025 em todos os produtos. Conforme Visentini, a principal diretriz diz respeito aos ingredientes. “Muito mais do que classificar se o produto é ou não saudável, é a qualidade dos ingredientes que nos faz pensar na saudabilidade”, explicou.

As discussões ao redor da saudabilidade também estão relacionadas ao desenvolvimento das pautas ESG dentro do setor alimentício, desde os processos de produção ao apoio a iniciativas de impacto social. “Um bom alimento é aquele que devolve para a natureza mais do que retira. Hoje, você não vende mais um produto pelo que ele é, mas pela causa que ele carrega”, explicou a líder de marketing da Nestlé.

E o marketing, segundo os gestores, ganha um papel importante de interface da inovação, devido ao contato mais próximos dos compradores. A aproximação ocorre tanto em projetos físicos quanto em estratégias no ambiente online, que também têm o foco de fomentar a construção de comunidades. “É onde conseguimos capturar os insights, tanto nas plataformas digitais quanto nas presenciais”, acrescenta Ionah.

Geração alpha: a maior de todos os tempos

O acompanhamento da jornada do consumidor nunca foi tão discutido. E estar junto a ele desde a base torna-se uma vantagem competitiva em longo prazo. A geração alpha — pessoas nascidas a partir de 2010 — ainda que não seja economicamente ativa neste momento, tem potencial de consumo a ser notado pelas marcas. Relatório da WGSN elaborado com o M&M mostra que os alphas farão parte da maior geração da humanidade: até 2025, serão 2,5 bilhões de pessoas do grupo. E a cada semana, cerca de três milhões de alphas nascem.

Mesmo que significativo, o contingente ainda é um terreno pouco explorado. Vitor Coelho, consultor da WGSN Mindset, afirmou que, ainda que haja muita informação sobre a geração alpha, há uma escassez de diretrizes para marcas sobre pontos acionáveis. O report contou com uma pesquisa feita junto à base de assinantes do M&M e 46% dos CMOs, diretores e gerentes de marketing do Brasil dizem conhecer bastante sobre essa geração, mas a maior parte (58%) ainda não a considera em suas estratégias.

Um desafio ao direcionamento de ações para a geração alpha é o respeito à barreira de publicidade infantil, a fim de proteger o desenvolvimento emocional, cognitivo e social das crianças. Hoje, os mais velhos da geração têm apenas 13 anos. Ainda assim, a publicidade pode tomar formas indiretas. Dados de 2019 do Instituto Locomotiva mostram que 88% dos pais são influenciados pelos filhos quando estão fazendo compras no shopping ou no supermercado. “Muitas vezes, a decisão de a marca estar dentro daquele carrinho de compra, de pertencer àquele lar ou contexto familiar, vai passar por um alpha”, declarou Coelho.

Para ilustrar dados do relatório com exemplos reais, juntaram-se ao painel Claudia Neufeld, vice-presidente de marketing da The Walt Disney Company Brasil, e Raquel Paternesi, diretora de marketing da The Fini Company. Questionadas sobre como é possível manter a relevância entre gerações distintas, a VP da Disney apontou que a empresa busca evoluir seu storytelling de acordo com o momento atual, seja na publicidade ou em seus conteúdos. Um exemplo é o recém-lançado liveaction de A Pequena Sereia, em que Ariel é protagonizada por uma atriz negra — diversidade e inclusão estão entre os temas de interesse dos alphas.

Outro ponto levantado pela consultoria foi que 74% dos alphas preferem exercícios e atividades ao ar livre, ou diminuir o uso de tecnologia para administrar a saúde mental. Nesse sentido, Raquel, da Fini, citou a responsabilidade de marcas como ponto-chave. “Nosso core é criar produtos com açúcar, isso é fato. Mas o equilíbrio está em criar saudabilidade física e mental”, argumentou. A executiva fez referência às gerações recentes que já nascem com uma certa fluidez e maturidade de encontrar o equilíbrio da indulgência em momentos de tensão e desconexão e a importância de cuidar do bem-estar físico.

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