História e alterações da Lei Cidade Limpa
Projeto de lei em tramitação na Câmara Municipal quer flexibilizar pontos da legislação
A Lei Cidade Limpa foi sancionada em 26 de setembro de 2006 pelo então prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD-SP), e entrou em vigor em janeiro de 2007, ou seja, há mais de 18 anos. À época, a publicidade e anúncios indicativos eram submetidos a regras do Projeto Belezura, criado na gestão de Marta Suplicy (PT-SP), em 2003.

Eletromidia e JCDecaux operam abrigos de ônibus e relógios de rua em São Paulo (Crédito: Alf Ribeiro/Shutterstock)
A falha na fiscalização e as irregularidades contínuas na mídia criaram terreno para a formulação de nova regulamentação. “Todo mundo governou a paisagem dessa cidade por jurisprudência. Era muita ação em cima de ação e a cidade foi ficando daquele jeito. Não tinha como arrumar a não ser retirar tudo e começar tudo de novo”, recorda a autora da Lei Cidade Limpa e presidente da Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU), Regina Monteiro. A CPPU é um órgão colegiado da prefeitura de São Paulo. Regina conta que, na época, haviam 63 mil painéis irregulares na capital.
À princípio, dar uma nova ordem à poluição visual em São Paulo foi um projeto do governo de José Serra (PSDB), que delegou a iniciativa ao seu então vice-prefeito, Kassab. Serra deixou a prefeitura para assumir o governo do Estado. Kassab assumiu a presidência em 2006. A popularidade da Lei Cidade Limpa foi um dos pontos decisivos para garantir sua reeleição ao posto em 2008.
Alterações na Lei Cidade Limpa
Atualmente, tramita na Câmara Municipal um projeto de lei (nº 14.223/06) de autoria de Rubinho Nunes (União) que propõe flexibilizações para o texto da Lei Cidade Limpa. O texto original do PL do vereador Nunes sugeria a alteração de alguns artigos da Lei Cidade Limpa com o objetivo de modernizar a legislação, com o objetivo de melhorar o aproveitamento dos espaços públicos e privados e potencializar os investimentos no município.
Contudo, esses já não são mais os objetivos. O gabinete do vereador afirmou que será feito PL substitutivo focado na criação da Times Square paulistana. “Não é uma mudança de estratégia, quem diz isso não entende nada de processo legislativo. O texto de primeira votação deve ser amplo para criar o debate e permitir escolhermos uma área para a criação da Times Square”, justifica Nunes. Outro PL, submetido por Amanda Vettorazzo (União-SP) em janeiro deste ano, sugere a instalação de painéis luminosos com propaganda em prédios da capital a exemplo de Nova York e Tóquio.
Uma série de PLs tentou mudar a lei ao longo desses 18 anos. Regina afirma que apenas duas alterações passaram. Para o vereador Nunes, isso demonstra que seu PL é “melhor, maduro e bem articulado”. Em 2016, a Lei 16.374 criou parâmetros para a veiculação de anúncios especiais não publicitários no Sambódromo do Anhembi durante o Carnaval. Outra mudança impôs que os veículos fossem notificados antes da aplicação da multa pela irregularidade.
Levantamento feito pelo geógrafo e consultor em temas ligados ao trato da paisagem urbana na RS Projetos, Sergio Rizo, lista, adicionalmente, alterações que permitem a celebração de termos de cooperação com a iniciativa privada para o restauro e conservação de bens de valor cultura mediante à instalação de placas informativas em fachadas de imóveis ou monumentos; a criação de parâmetros e encaminhamentos sobre o patrocínio do Carnaval de rua; mudanças na gestão de concessão de sanitários públicos fixo e móvel; e a revogação da Taxa de Fiscalização de Anúncios (TFA) aplicada a empresas com concessão.
Em 2017, estudo feito pelo Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior do Estado de São Paulo (Sepex-SP) projetou que a instalação de cerca de dois mil painéis de LED, com formato padrão, que não ultrapassassem os 18m² e que fossem instalados somente em avenidas de São Paulo, dentro da rarefação (distanciamento) de 1 km, poderia gerar cerca de R$ 30 milhões anuais em outorga para a prefeitura. O projeto sugeria “zona de interesse turístico”, similar à Times Square, que poderia inclusive, aumentar o valor de outorga anual a ser paga para a prefeitura. O projeto foi apresentado para o então prefeito Bruno Covas (PSDB), com seu falecimento em 2021, não prosseguiu.
Uso de mobiliários urbanos para publicidade
A Lei Cidade Limpa prevê a veiculação de anúncios publicitários em 25 mobiliários urbanos, mas apenas os dois citados (relógios e abrigos de ônibus) foram licitados. A Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), por meio da Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU), afirmou que, embora a lei preveja 25 categorias possíveis, isso não significa que todas devam ser objeto de licitação ou concessão, sendo necessária a avaliação do interesse público.
Em 2018, o prefeito João Dória (sem partido atualmente) tentou iniciar a licitação de lixeiras e sanitários públicos. Embora documentada, a licitação não foi aberta por falta de interesse do setor. “Nos últimos anos, a prefeitura fez uma série de concessões buscando retornos do tipo e muitos dos casos em andamento não são bem-sucedidos. Temos no Vale do Anhangabaú quiosques com banheiros que poderiam ser mobiliários urbanos para propaganda e que sequer são usados. Estamos começamos a criar outras iniciativas sem que as que estão em andamento estejam funcionando bem”, ressalta a presidente do IABsp (Instituto de Arquitetos do Brasil — Departamento de São Paulo), Raquel Schenkman.
Entre os equipamentos urbanos que poderiam ser licitados, constam às bancas de revistas e jornais. Há um impasse em relação a elas, no entanto. Enquanto a lei permite a licitação de bancas como mobiliário urbano que pode ser explorado por publicidade, a autora, Regina, afirma que só podem exibir os produtos que vendem, mas não criar peças para anunciá-los. “Banca de jornal não tem demanda para ter publicidade”, opina. Um projeto de 2014 (220/14) tentou alterar a Lei 10.072, de 1986, que dispõe sobre a instalação de bancas de jornais e revistas em logradouros públicos, para que as bancas pudessem explorar, de forma remunerada, espaços publicitários. Apesar de receber pareceres favoráveis de comissões diversas, o prefeito da capital na época, Fernando Haddad (PT-SP), vetou o projeto.
Em outros formatos, a prefeitura de São Paulo tem termos de cooperação com empresas privadas. Regina, autora da Cidade Limpa, aponta que as empresas interessadas devem desenvolver projeto com contrapartida de interesse público e a CPPU avaliaria caso a caso. Exemplo é a fachada do estádio Morumbi, no qual a Mondelez propôs plano urbanístico para a área do entorno por 36 meses para a instalação da placa MorumBis na fachada principal. “Participando da urbanização da cidade, da questão ambiental e paisagística, a contrapartida pode ser bem diferente. Mas é estudado um a um”, diz Regina Monteiro.