A eloquência do silêncio
Omitir-se em momento tão crucial do nosso país, em nome de prudência comercial, equivale a não estar à altura do que o momento nos impõe
Omitir-se em momento tão crucial do nosso país, em nome de prudência comercial, equivale a não estar à altura do que o momento nos impõe
A ausência de manifestação institucional que prepondera no mercado de comunicação, passadas 24 horas dos atentados mais graves à democracia brasileira, não só é gritante como também estarrecedora.
Para tentar trazer o mínimo de objetividade a uma análise feita no calor indignado do momento, me dei ao trabalho de checar as redes sociais das 20 maiores empresas de publicidade e de comunicação corporativa do país, segundo rankings do CENP e da ABRACOM. Constatei que, com apenas duas honrosas exceções na lista de agências de PR (cujas tímidas manifestações se restringiram à reprodução de nota de repúdio da ABRACOM em seus stories), a tônica dominante foi o silêncio.
A publicidade e o marketing, atividades normalmente associadas a certo vanguardismo na promoção de tendências e valores progressistas, viu algumas de suas entidades de classe se manifestarem só depois de muitas outras associações de outros setores expressaram publicamente seu repúdio. E, até o momento da publicação deste artigo, a entidade máxima que congrega os maiores anunciantes do país, representante do grande poder econômico que sustenta a comunicação comercial profissional do Brasil, permanece calada.
Como bem colocou o consultor em diversidade Ricardo Sales, não há ESG sem Democracia. Logo, não apenas é constrangedor, como absolutamente paradoxal, para dizer o mínimo, constatar a cara de paisagem dos principais players do mercado diante dos acontecimentos que marcam um ponto de inflexão da história nacional. Trata-se das mesmas agências que, em tempos de normalidade, constantemente pedem mais respeito nas tratativas comerciais, bem como advogam às marcas que estas estejam conectadas ao que acontece em seu entorno e sejam socialmente responsáveis.
Omitir-se em momento tão crucial do nosso país, em nome de prudência comercial, equivale a não estar à altura do que o momento nos impõe, bem como esvazia qualquer autoridade moral para participar ativamente do debate público e da (re)construção do país que queremos e merecemos ter.
Diante de um contexto em que a lógica militar se transformou numa literalidade da nossa realidade civil, recorro à Ernest Hemingway na esperança de que o belicismo de hoje volte a se tornar metáfora amanhã:
– Quem estará nas trincheiras ao teu lado?
– E isso importa?
– Mais do que a própria guerra.
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