Opinião
A ressignificação das redes
Hoje, a forma que usamos essas plataformas se parece muito mais com nossa relação com a TV e o controle remoto e isso implica em desafios e oportunidades
Hoje, a forma que usamos essas plataformas se parece muito mais com nossa relação com a TV e o controle remoto e isso implica em desafios e oportunidades
Quando Mark Zuckerberg e seus colegas de Harvard lançaram o Facebook, a proposta de valor da plataforma era clara: transportar para o ambiente digital as conexões humanas que estabelecemos no mundo real. Era o conceito de aldeia global, de Marshall McLuhan, ganhando contornos muito mais nítidos. Hoje, 20 anos depois, as mesmas redes sociais que transformaram de forma incomensurável as nossas vidas passam, elas próprias, por um profundo processo de ressignificação.
Os algoritmos – que nos direcionam para conteúdos com os quais nos identificamos e tornam os ecos de nossas bolhas ainda mais ruidosos – são parte importante dessa história. Mas há muito mais a ser entendido. Matéria recente da revista britânica The Economist aponta que, desde 2020, caiu de 40% para 28% o número de americanos que gostam de documentar suas vidas online. Isso, porém, não significa que diminuiu o tempo que nos dedicamos aos apps sociais. Pelo contrário. Atualmente, as pessoas passam um quarto do tempo em que estão acordadas nas redes, 40% a mais do que quatro anos atrás. Embora os dados se refiram ao mercado americano, é fácil traçar paralelos com o Brasil.
A mudança em nossos hábitos de consumo de conteúdo virtual tem a ver com alguns fatores. O primeiro é que, na hora de compartilhar registros e opiniões pessoais, muita gente vem migrando das redes sociais abertas para ambientes mais seguros, como o dos apps de mensagem fechados. Parece um movimento pendular natural de resposta a anos de superexposição, proliferação de fake news e discursos extremistas, além de uma forma de proteção em relação aos impactos da cultura de likes e cancelamentos tão danosa à saúde mental, especialmente à de jovens e adolescentes.
Esses problemas, obviamente, também podem ocorrer, e ocorrem, em grupos fechados. Mas certamente a sensação é de mais controle e proteção quando conhecemos nossos interlocutores ou fazemos parte de uma comunidade unida por interesses comuns.
Outro ponto de inflexão importante na dinâmica das redes sociais foi a arrancada do TikTok, que chacoalhou o mercado ao inundar nossas vidas com vídeos rápidos, dancinhas e trends – além de publicidade, claro. Se antes entrar numa rede social lembrava o ritual de ir a um bar com os amigos para colocar o papo em dia, hoje, a forma que usamos essas plataformas se parece muito mais com nossa relação com a TV e o controle remoto.
Para nós, que fazemos parte da indústria da comunicação, essa nova configuração traz desafios e oportunidades. Quando as redes sociais se tornam entretenimento, proporcionado, na maioria das vezes, por pessoas que não são do nosso círculo de amizade, a figura de influenciadores e creators emerge como fundamental em boa parte das estratégias de comunicação. É nossa obrigação, porém, ir além do trabalho básico de curadoria de perfis e conteúdos dos nomes que traremos para as nossas campanhas.
Precisamos pensar em novos modelos de negócios, que atendam às necessidades dos clientes diante de um ecossistema mais complexo, e contribuir para a evolução desse mercado em discussões mais amplas do que as de alcance, aderência e base de seguidores. Temos de colocar na pauta também temas que passam por autorregulamentação e profissionalização de influenciadores. E lançar um olhar macro para o negócio da influência, considerando as singularidades do País e da própria indústria de comunicação, além de integrar o pensamento estratégico a cada conteúdo que compõe a estratégia de uma marca.
Hoje, o Brasil é o segundo país com maior número de influenciadores do mundo (atrás apenas dos Estados Unidos). Para tentar quantificar, ao todo, são 10,5 milhões de contas no Instagram com mais de mil seguidores, segundo pesquisa da Nielsen. E o mercado só tende a crescer: de acordo com outro levantamento, da Influency.me, 68% dos anunciantes pretendem aumentar o investimento em marketing de influência neste ano. Tirar eventuais pedregulhos dessa trilha de crescimento e seguir adiante está em nossas mãos.
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