Desconfortando-se
Fazer é complicado porque quem faz, erra. E cada vez estamos mais afundados na ideia de que não dá para errar. Mas, a verdade é que só tem um jeito de não errar: não fazendo nada
Fazer é complicado porque quem faz, erra. E cada vez estamos mais afundados na ideia de que não dá para errar. Mas, a verdade é que só tem um jeito de não errar: não fazendo nada
Tensão pré-criação. Só de ser convidada para escrever um texto com quatro mil caracteres já me deu TPC. E ainda bem, porque ela é realmente necessária. E esse texto é para tentar explicar o porquê.
Capítulo 1. A agonia. Tudo começa quando você tem um problema e precisar criar uma solução nova, criativa e eficiente, ou seja, ter uma ideia genial que faz tanto sentido para pessoas que provoca a frase: como nunca pensaram nisso antes? Pronto, aí vem a agonia. E nessa fase, o único remédio que conheço é começar a fazer. E o que parece óbvio nem sempre é. Fazer é complicado porque quem faz, erra. E cada vez estamos mais afundados na ideia de que não dá para errar.
Capítulo 2. O Erro. Já faz tempo que o modelo mental imposto pelo mercado é o de que não dá para errar. Não pode errar por causa do investimento magro, não dá para errar porque precisa se provar pra/pro chefe, não dá para errar porque é a/o chefe. Mas, a verdade é que só tem um jeito de não errar: não fazendo nada. As ideias que envolvem a tecnologia, a ciência e a inovação deixam mais clara a importância do erro. A gente sabe o que está começando, mas não sabe exatamente o que vai entregar no final. São as tentativas e erros que vão determinar o produto final. Clientes que pedem certezas na entrega podem saber que não receberão algo novo. Se é novo, não temos certeza. Algumas das maiores descobertas do mundo vieram de erros. Procure saber sobre o raio-x, o microondas, o post-it, a penicilina ou o marca-passo. Erros fenomenais para humanidade. Enfim, estou aqui justificando os erros para tentar responder como chegar aos grandes acertos, às grandes ideias. Outro exemplo que sempre dou é sobre como todos buscam pessoas que pensam “fora da caixa” para contratar e, quando o fazem, é justamente para colocá-las em uma caixa. Na verdade, fazemos isso fora da publicidade também, somos tão apavorados para não errar que fazemos isso até com as crianças! Sim, somos terríveis. Queremos que nossos filhos sejam quem? A próxima Marie Curie, o próximo Steve Jobs. Filhos que criem coisas revolucionárias, mas que — pelo amor de Deus — não desenhem nas paredes, não sujem a roupa inteira de tinta e não perguntem por quê umas dez vezes ao dia. Até a gente estragar tudo, crianças aprendem a partir do fazer, do experimentar. E o resultado é surpreendente e muitas vezes totalmente novo para nós.
Capítulo 3. Errar não é humano. Pelo menos é o que a gente cresce ouvindo. Quem erra é fraco, quem erra é burro. E logo, obviamente, ninguém mais quer errar. É um fenômeno global. O Mark Zuckerberg ficou zilhardário apostando que o ser humano só quer falar dos seus acertos e assim surgiu o nosso perfil do Facebook, e em tudo quanto é plataforma, falando super bem sobre nós mesmos.
E isso nos leva ao Capítulo 4. A zona de conforto. A zona de conforto está com super população. É pra lá que vai quem se contenta com o conhecido; quem quer respostas, mas não sabe fazer perguntas; quem não estuda o que foi feito para fazer diferente e melhor; quem não procura os problemas de verdade e acaba resolvendo o que não é um problema relevante para ninguém. Quem está na zona de conforto quer ficar invisível, quer ser neutro, não quer opinar e assim consegue… sumir. Isso mesmo, se fingem de mortos e não percebem que para muitos declaram que morreram. Bem, era aí que eu queria chegar quando falei da importância da tensão pré-criação. E não se engane, vale para todos na indústria: da criação, da agência, do cliente. Então, por favor, agoniem-se, façam, errem, sejam humanos, encarem problemas reais, entrem na zona de desconforto, tenham tensão pré-criação, por favor.
Capítulo 5. P.S. (As fake news, a pandemia, as mídias sociais, o diálogo e as conversas fizeram com que as marcas também tivessem que sair de suas zonas de conforto invisíveis e se posicionar. O mundo agradece, a criação agradece. Problemas reais são bem-vindos. Não dá para fazer diferença na vida das pessoas sem entender de verdade onde o calo aperta. Obrigada)
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