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Será o fim do varejo como conhecemos?

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Opinião

Será o fim do varejo como conhecemos?

Nenhum varejista que tenha participado da NRF este ano voltou para casa tranquilo


27 de janeiro de 2017 - 9h39

Depois de três dias de National Retail Federation, ou NRF, o principal evento de varejo do mundo, e muitas visitas às lojas conceito de Nova York posso crer que sim.

Quase todos os painéis da conferência falavam sobre as transformações do varejo impulsionadas pela tecnologia. Vimos conteúdos tratando desde como os dados estão ditando um novo modelo de fazer negócio, até aplicações práticas de robôs em loja para melhorar produtividade, atendimento e segurança. Todas as frentes estão sendo reinventadas e tenho certeza de que nenhum varejista voltou para casa tranquilo depois desses dias intensos de conteúdos e palestras.

Mas o interessante foi ver que em meio a tudo isso nunca se falou tanto de pessoas e propósito de marcas. O primeiro e o último painel da NRF foram com líderes de varejos como Macy’s, Walmart e Ikea enfatizando como um propósito de marca forte traz diferenciação, engajamento dos colaboradores e, consequentemente, gera fidelização dos clientes. Mas como tudo isso se cruza?

O propósito de uma marca sempre foi muito importante, mas para o varejo, onde o olhar para o curto prazo tende a ditar as regras, acaba sendo renegado por muitas empresas do setor. Mas agora está na hora de olharmos para isso com um pouco mais de cuidado se pararmos para pensar o quanto o modelo tradicional de varejo, digo especificamente do modelo de lojas físicas e do e-commerce como conhecemos, pode se tornar cada vez menos relevante na vida dos consumidores.

O varejo cresceu e se fortaleceu com a regra de sucesso calcada na relação preço e produto. Mas quando pensamos no avanço de gigantes como Amazon e Alibaba essa máxima precisa ser revista. Para termos uma ideia, 55% das buscas feitas na internet hoje em dia nos EUA são no site da Amazon, e não no Google (segundo o profeta do varejo Dough Stephens). São mais de 400 milhões de produtos de todos os tipos e preços para o mundo todo escolher e comprar num click. Por mais esforço que as redes tenham em ampliar sortimento, acho difícil chegar perto desse volume.

O gigante do varejo online entrou este ano como top 10 na lista das 250 maiores empresas de varejo da Deloitte (10ª posição, sem somar as vendas via marketplace). Se seguir nesse ritmo, a projeção é que dentro de dois ou três anos se tornará o 2º maior varejista do mundo, atrás somente do Walmart. A Amazon já é o varejista com maior valor de mercado, valendo U$370 bilhões, quase o dobro dos US$ 200 bilhões do Walmart. Para aqueles que acham que o varejo alimentar está imune às transformações, vale a pena ver o novo conceito de supermercado físico da Amazon. As coisas estão mudando, não? Olha só esse gráfico:

 

As vendas pelo canal eletrônico já representam 20% do varejo chinês, 18% do Reino Unido, 10% do norte-americano e no Brasil somente 3%, porém, em categorias como livros, eletrônicos e informática já chegamos a encontrar 30% de penetração do e-commerce. O acesso à internet está avançando rapidamente, até 2020 estima-se que 65% da população brasileira será conectada (segundo estudo da Visual Network Index).

Sendo assim, fazer comparação, pesquisar preço, ver as opiniões de colegas sobre determinado produto será lugar comum. Por outro lado, os varejistas online estão correndo todos os dias para nos oferecer uma experiência de compra cada vez melhor, baseada em nosso comportamento e interesses, antecipando nossas necessidades, melhorando o tempo de entrega e as políticas de troca de mercadorias.

Sem falar no avanço das próprias indústrias em desenvolver suas interfaces digitais diretas com o consumidor, sem intermédio do varejo. De 2012 a 2013, as vendas da indústria diretamente ao consumidor cresceram 70% e hoje 40% das marcas americanas já vendem diretamente para o consumidor. Veja os exemplos da Brastemp e Sony aqui no Brasil e P&G lá fora.

Então por que continuaríamos indo a uma loja física? Por que então Amazon, Google, Warby Parker estão abrindo lojas físicas?

Eles sabem que não tem como criarmos uma relação real e profunda, consequentemente de longo prazo, com consumidores sem criar uma relação emocional com eles. E isso inclui a experiência em loja física, o contato direto, o olho no olho. É aí que entra o propósito de marca. As pessoas não vão se relacionar emocionalmente com uma marca porque ela quer vender mais, mas sim porque ela tem uma razão de existir maior, que agrega algo relevante na vida delas. Marcas que geram identificação por seus valores e pelo que promovem com as pessoas e comunidades, pelas experiências e sensações que despertam.

Ao contrário do que muita gente pensa, o futuro do varejo inclui a loja física. Pelo menos é o que acreditam os experts do setor. Não iremos a uma loja porque precisamos e sim porque queremos. E isso muda todo o conceito do varejo. Vai ser cada vez menos sobre a transação e cada vez mais sobre a experiência.

Segundo Dough Stephens, o tradicional funil de conversão será ao contrário: a loja será o ponto máximo de engajamento e fidelização com o consumidor que, satisfeito com essa relação, impulsionará os demais steps como venda, engajamento e awareness de marca.

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E um dos cases mais bacanas que vi por lá é do Westfield, uma das principais cadeias de shopping centers do mundo, que vendo o risco do seu negócio sumir em alguns anos parou para repensar todo o modelo. De espaço para locação de lojas, viraram um espaço de convivência, serviço e conveniência para o cliente. O novo shopping, no antigo WTC, é um encanto de lindo e através da integração do físico e do digital consegue oferecer e-commerce integrado de todas as lojas do shopping com entrega em 24 horas. Big data traz experiência personalizada dentro do shopping, como antecipar pedidos ou fazer reservas nos restaurantes, e a criação de espaços de convivência e shows propiciam entretenimento. O projeto saiu de um laboratório interno que possuem.

Vale ressaltar que 20% da receita do Westfield já vêm de outras fontes que não a locação dos espaços para lojas.

Está na hora de repensarmos nosso negócio, nossa cadeia de valor. Propósito de marca engaja colaboradores, colaboradores engajados engajam e fidelizam clientes.

O que temos de certeza é que nada será como antes.

 

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