É preciso falar, ouvir e cuidar da saúde mental
Organizações perdem com funcionários estressados, ansiosos e esgotados e devem adotar medidas para apoiar colaboradores e, em especial, as mulheres, mais afetadas pela jornada contínua
É preciso falar, ouvir e cuidar da saúde mental
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Meio & Mensagem
1 de dezembro de 2023 - 12h12
Por Carolina Scorce
O adoecimento mental ligado às condições de trabalho não é novidade para empresas e colaboradores. Com a pandemia e questões próprias das transformações sociais e culturais contemporâneas, o tema está em destaque. Principalmente porque nunca as pessoas estiveram tão doentes.
Mas existem algumas camadas de desigualdade que precisam ser levadas em conta nessa reflexão que têm a ver, também, com lacunas na percepção do mercado do que é equidade, diversidade e inclusão e com a postura das empresas em relação a essas frentes.
Segundo estudo da consultora Ana Carolina Peuker, CEO da startup de saúde mental Bee Touch, a desigualdade de gênero é uma das maiores inimigas da produtividade, pois aumenta a rotatividade de funcionários e gera insatisfação com o trabalho, o que é rota perigosa rumo ao adoecimento mental.
Ana Carolina representa o Comitê Consultivo do Movimento Mente em Foco, do Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU), e afirma que problemas com a saúde mental dos funcionários têm ficado mais caros para as empresas, mas ainda sofrem muito estigma e perdem espaço para a lógica da produtividade.
Algo em torno de 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos, anualmente, para a depressão e ansiedade, com custos à economia de quase US$ 1 trilhão. O levantamento é do relatório “Diretrizes sobre Saúde Mental no Trabalho”, publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022, e coloca contra a parede gestores em relação à importância e urgência de debate sobre o tema.
Entre as mulheres, as informações que chegam são ainda mais preocupantes: 7 em cada 10 pessoas diagnosticadas com depressão ou ansiedade no Brasil são mulheres, de acordo com relatório “Esgotadas”, da Think Olga, consultoria de equidade de gênero. O dado deixa evidente que, quando o assunto é saúde psicológica, as mulheres devem ser prioridade. Estresse, irritabilidade, baixa autoestima, fadiga, sonolência, insônia e tristeza são os sintomas relatados entre as mais de mil entrevistadas da pesquisa.
A relação com o trabalho é agravante desse contexto. De acordo com a pesquisa, muitas mulheres reclamam da baixa remuneração (32%), falta de reconhecimento (21%), jornadas de trabalho excessivas (20%) e ausência de planos de carreira (19%). E isso sem contar a sobrecarga de tarefas domésticas (22%), uma responsabilidade ainda muito mal dividida dentro das famílias que, fatalmente, resulta em estresse e esgotamento mental.
“O trabalho realizado por mulheres precisa passar por revisão e reorganização social”, argumenta a diretora do Think Eva e Think Olga, Maíra Liguori. “Isso não é uma tarefa só das empresas, e sim de toda a sociedade, embora as companhias possam incentivar essa distribuição”, afirma. Para isso, as empresas poderiam, por exemplo, oferecer licença paternidade com tempo suficiente para que o pai fique dedicado aos cuidados que filhos e mãe demandam nesse período.
A exclusividade com o tempo que será gasto com cada tarefa, seja do trabalho, na vida pessoal ou nas atividades domésticas, é fundamental para barrar a sobrecarga, diz Maíra. E o trabalho híbrido, se, por um lado, é mais gentil com os muitos papéis que todos têm que desempenhar todos os dias, por outro borrou as fronteiras entre uma coisa e outra. Essa falta de fronteiras causa o que se chama de jornada contínua. Ou seja, a mulher não para de trabalhar em nenhum momento. Uma das soluções, segundo Maíra, é que os processos de trabalho sejam bastante discutidos e estabelecidos em conjunto entre gestor e funcionária. “No caso da comunicação é, por exemplo, estabelecer prazos que sejam exequíveis, quantidade de horas, se vai ser por projeto ou por tempo. Tudo isso precisa ser bem pactuado e respeitado”, avalia.
A sobrecarga do cuidado é, sem dúvida, determinante na relação entre a saúde mental das mulheres e o trabalho. Enquanto elas dedicam 21,4 horas semanais para os serviços de cuidado, os homens trabalham apenas 11 horas. São tarefas essenciais para a saúde e o bem-estar de toda a família, o que inclui cozinhar, dar banho, fazer faxina, comprar alimentos, dar suporte na educação e cuidados diante de doenças. E para enfrentar a desigualdade na distribuição dos papéis e das tarefas não há atalhos. “Há assimetria entre homens e mulheres, seja no presencial ou no formato remoto. Há desigualdade salarial e de jornada. É preciso, antes, resolver esse ponto, que é histórico. Com melhores salários e jornadas exequíveis, podemos começar a falar em segurança psicológica para as mulheres”, afirma Ana Carolina, da Bee Touch.
Crédito da imagem em destaque desta matéria: Vita555/Adobe Stock
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