Women to Watch

Renata Ceribelli amplia olhar sobre a velhice no Fantástico

A jornalista fala sobre envelhecer com propósito e curiosidade, e como nova temporada de 'Prazer, Renata' provoca debate sobre a longevidade

i 10 de julho de 2025 - 17h06

Renata Ceribelli estreia novo quadro de "Prazer, Renata" no Fantástico (Crédito: Globo/Manoella Mello)

Renata Ceribelli estreia nova temporada de ‘Prazer, Renata’, no Fantástico, com foco em longevidade (Crédito: Globo/Manoella Mello)

Renata Ceribelli decidiu virar a câmera para si mesma e para o tempo. Reconhecida por sua longa jornada como repórter e apresentadora da TV Globo, agora, aos 61 anos, ela se debruça sobre um tema que ainda provoca silêncios, preconceitos e, por vezes, medo: o envelhecimento. Na nova temporada do quadro ‘Prazer, Renata’, no Fantástico, que começou em 6 de julho e conta com quatro episódios, a jornalista amplia o sentido de prazer para além da sexualidade e se aprofunda nas múltiplas experiências da longevidade. 

Entre entrevistas com diferentes gerações de pessoas com mais de 60 anos, conversas com especialistas e reflexões pessoais, Renata propõe uma nova narrativa: envelhecer não é perder, mas transformar. Para ela, em um país onde mulheres maduras ainda enfrentam barreiras no mercado de trabalho e onde o etarismo está naturalizado, o quadro desafia os estigmas com afeto, curiosidade e coragem. “Tenho uma fixação em falar sobre prazer, que as pessoas associam muito ao prazer sexual. Mas o que quero dizer é outra coisa. É sobre a libido da vida mesmo, sobre o prazer de viver”, diz.

Nesta entrevista ao Women to Watch, ela fala sobre o novo quadro e conta o que aprendeu até agora sobre saúde, autonomia, beleza, trabalho, autocuidado e as pequenas alegrias da vida. Em primeira mão, compartilha também importância do prazer na vida dela frente a barreiras de saúde mental que enfrentou aos 35 anos. 

Meio & Mensagem – O quadro ‘Prazer, Renata’ nasceu com um olhar para o prazer feminino. Agora, retorna com foco na longevidade. Como foi essa transição de abordagem? 

Renata Ceribelli – Na verdade, ‘Prazer, Renata’ nasceu como um podcast. A ideia inicial era abordar a intergeracionalidade entre mulheres, falar sobre como vivemos situações parecidas nas diversas gerações. Durante e após a pandemia, esse debate ganhou força, e todos os assuntos acabavam em sexo. Estávamos no auge do boom do bem-estar sexual feminino. Nunca se falou tanto sobre isso. O próprio podcast, então, passou a abordar bastante a sexualidade. Quando foi para a TV, a proposta era falar sobre a sexualidade feminina e a revolução que as mulheres fizeram em relação ao próprio desejo, desde o surgimento da pílula anticoncepcional. Fizemos uma linha do tempo, e foi assim que o quadro entrou no ar. Depois disso, a gente quis ampliar o sentido de “prazer”. 

M&M – O que te moveu pessoalmente a olhar para o prazer e o envelhecimento com mais profundidade? 

Renata – Vou contar uma coisa de que nunca falei publicamente: a palavra “prazer” me traz um significado muito importante. Aos 35 anos, passei por um momento difícil. Tive crises de pânico. Naquela época, as pessoas não falavam muito sobre isso. Hoje, todo mundo fala com naturalidade. Por isso, me sinto à vontade para compartilhar. Tomei medicação. No meio do processo, me senti muito ansiosa e pedi para meu médico aumentar a dosagem, porque achei que não estava dando conta. Entre as várias perguntas que ele me fez, uma delas foi: “quando foi a última vez que você teve um prazer com você mesma?”. Respondi que sempre tinha prazer com meus filhos, com minha família. E ele disse: “Claro, você ama seus filhos. Mas minha pergunta é sobre algo que você fecha os olhos e pensa ‘queria que esse momento parasse’. Um prazer mesmo. Pode ser um banho quente, o que for”. Na hora, pensei em um banho de mar, que sempre me faz recuperar a alma. E aí ele perguntou há quanto tempo eu não fazia isso. E, nossa, fazia um bom tempo, mesmo eu morando no Rio de Janeiro. 

O terapeuta não aumentou a dosagem do remédio na minha receita, mas escreveu “mais prazer na vida”. Lembro que pensei: “vou levar essa frase para mim”. E estou aplicando agora. Quando começamos a brincar com a palavra “prazer” para o nome do quadro, falei: “vamos ampliar, então, para o prazer em todas as áreas da vida”. Acho que por isso minha fixação de falar sobre prazer, que as pessoas associam muito ao prazer sexual. Mas o que quero dizer é outra coisa. É sobre a libido da vida mesmo, sobre o prazer de viver. 

M&M – E como foi migrar o podcast para um quadro na televisão? 

Renata – Quando passamos a falar de prazer sexual na TV, o assunto fica um pouco mais difícil, sobretudo em um programa como o Fantástico. Há um limite, porque você entra na casa de muitas pessoas. Nem todo mundo gosta de falar sobre esse assunto na intimidade ou em família. Há vários perfis diferentes entre quem assiste ao programa no Brasil. No podcast, as pessoas ouviam aquilo no “ouvidinho”, cada um na sua. Quando vai para a televisão, é um impacto. Por isso, decidimos ampliar o tema para a longevidade, um assunto que me interessa muito. Fiz 60 anos e pensei: “nossa, e agora?”. Bate um susto, porque sempre ouvimos que, aos 60, você está velha e não serve para mais nada. Que não vai mais ser olhada, vai perder o emprego… Você tem sempre a impressão de que vai ser jogado para fora do mercado. Graças a Deus, isso não aconteceu comigo. Tenho muitos projetos. E, durante a produção dessa série, aprendi ainda mais. 

M&M – A ideia do recorte para longevidade foi sua? Como foi esse processo? 

Renata – Em 2024, participei de um painel com a Layla Vallias [consultora e especialista no consumidor sênior] e o Fernando Gabeira sobre longevidade, no Festival LED da Globo. Lá, ela disse uma coisa sensacional: depois dos 60, vivemos uma espécie de adolescência. É uma fase em que você repensa sua vida, porque começa a olhar para os anos que possivelmente ainda tem pela frente. Antes, a gente não pensava assim. A gente se preparava para desacelerar e se aposentar. Agora, não. Você precisa se sustentar por muito mais tempo. Está fisicamente melhor e quer uma vida mais ativa, mais para frente. Tudo isso reforçou a ideia de fazer esse quadro, e a Layla acabou se tornando nossa especialista. Tive ideia e levei a proposta para o Marcelo Outeiral [coordenador de quadros e séries da Globo], e ele gostou. O Bruno Bernardes, diretor do programa, também comprou a ideia de ampliar o conceito de prazer para as várias fases da vida. 

O desafio, desde o início, foi encontrar o tom certo. Nem romantizar, nem dramatizar. Porque há várias velhices, em diferentes classes sociais. Você pode chegar doente, pode chegar bem. E é um tema que interessa a todas as gerações. Outra coisa que a Layla trouxe e me chamou a atenção é que a geração que fez a revolução nos anos 1960 e 1970 é justamente a que está envelhecendo agora, e mais uma vez está ditando novos padrões. E isso começa pela mulher, não tenha dúvida. A gente puxa esse movimento, embora seja algo que envolve toda a sociedade. 

M&M – Mulheres maduras ainda enfrentam muitas barreiras no mercado de trabalho, especialmente em áreas como comunicação e publicidade. Você, que amadureceu na televisão, acredita que esta realidade está mudando? 

Renata – Prefiro dizer que ainda há muito a melhorar. Mas posso dar exemplos. Eu realmente envelheci na televisão. Hoje, estou com 61 anos, e comecei na TV com 21. Passei pela TV Cultura, trabalhei no SBT, mas a maior parte da minha carreira foi construída na Globo. No início, repórter tinha que usar terno. O blazer era obrigatório, porque não se podia mostrar o braço. Tinha que ser uma figura séria, ter a credibilidade de um homem, porque feminilidade era vista como algo que desviava a atenção da notícia. Não podia usar brincos. Com o tempo, esse visual foi mudando bastante. 

Mas acredito que quem mais dita o padrão de beleza de uma época é a publicidade, mais do que o jornalismo. Isso vem da sociedade. O olhar das pessoas ainda está muito preso a isso. Um exemplo é a revolução do skincare. Ela surgiu da ideia de cuidar de nós mesmas, do autocuidado. Mas, de repente, a indústria se apropriou disso e passou a vender produtos, botox, procedimentos. Não estou dizendo que não consumo isso, sou tão vítima quanto qualquer um. Não é uma crítica, mas uma constatação. A gente precisa entender o mundo em que estamos, até para sofrer menos. 

M&M – Para você, qual é o papel da mídia nesse contexto? 

Renata – Um papel fundamental da mídia é mostrar a mulher de verdade. Mas não sei se isso vai acontecer de fora para dentro. Acredito que deve ser um movimento vindo de nós, mulheres. De nos gostarmos, de não exigirmos tanto umas das outras. De não olharmos para a mulher apenas como um mercado de consumo, como ainda acontece. Por isso, não dá para culpar a mídia completamente. Mas, sim, acho que poderia ter um olhar mais generoso. O padrão deve ser mais diversificado. Isso já está acontecendo de certa forma. Temos visto mulheres magras, gordas, loiras, pretas, brancas. Isso é importante, mas volto a repetir: tudo começa pela publicidade. É ela que representa a verdade e a realidade com as quais as pessoas se identificam. 

M&M – A longevidade feminina está crescendo, mas ainda carecemos de imagens positivas sobre isso. O que você gostaria que sua série deixasse de legado para outras mulheres? 

Renata – O legado que quero deixar é que a gente fale mais sobre o envelhecimento e passe a olhar para a velhice com um novo olhar. O sonho é que as pessoas deixem de associar essa fase à tristeza, ao fim da vida, ao momento de parar. Que parem de marginalizá-la. 

Serão quatro episódios. No primeiro, chamado “O conceito de velho ficou velho”, bato na tecla de que muita gente ainda pode ser o que quiser. O segundo será sobre o mercado de trabalho, onde trago algumas iniciativas interessantes. Uma delas é a de um supermercado que adotou o selo “age-friendly employer”, recém-chegado ao Brasil e já presente em países como Estados Unidos e Austrália. É como uma certificação de que a empresa adota práticas de respeito às pessoas mais velhas, como número mínimo de funcionários e horários adaptados. 

Conversei com algumas dessas empresas, e quem trouxe o selo ao país explicou que há mais produtividade e mais lucro quando essas pessoas são empregadas, porque há espaço para elas. E houve algo muito curioso: normalmente, pessoas com mais de 60 anos, dependendo da classe social, frequentam mais o supermercado e preferem atendimento humano. E aí é importante que as pessoas do caixa tenham o mesmo ritmo de quem está sendo atendido. Essa sinergia é relevante. Soube que em uma das unidades dessa rede de supermercados, por exemplo, o setor de carnes começou a vender mais, porque os moradores mais velhos do bairro decidiram frequentar o lugar, já que ali eram mais bem atendidas. 

Depois, vamos falar sobre relacionamentos. E aí entra uma discussão muito legal, que está ganhando força: não são apenas os relacionamentos amorosos que importam. A gente cresceu achando que ficar sozinha era o mesmo que não ter marido ou esposa. Mas não é só isso. As amizades têm um papel muito importante. No último episódio, vamos falar sobre saúde. Hoje, temos gerações chegando aos 100 anos e vivendo bem. Antes, quem fazia 100 era notícia no Jornal Nacional. A ideia é mostrar que a vida está mais longa e provocar a reflexão de como queremos envelhecer. Apresento fatos, mas com um viés muito comportamental também, e essa é a minha área. Gosto de comportamento e de conversas leves. Por isso, escolhemos a música “Envelhecer”, do Arnaldo Antunes, para abrir o quadro. Ela resume bem essa proposta: não existe nada mais moderno nessa vida do que envelhecer. 

M&M – Se você pudesse responder agora à pergunta que abre o quadro, ‘o que você quer ser quando envelhecer?’, o que diria? 

Renata – Meus desejos são bem diferentes dos que tinha aos 15 anos. Agora, quero ter saúde, mobilidade, o mínimo de dinheiro e me sentir produtiva. Entre os 60 e 70 anos quero uma coisa, mas acho que dos 70 aos 80 vou querer outra, e assim por diante. Minha mãe, aos 93, me ensina muito sobre como o prazer muda com o tempo. De repente, um grande prazer é acordar bem, com saúde e disposição, e tomar seu cafezinho. Em algum momento, meu prazer vai ser só esse também. Agora, quero continuar envelhecendo e dar conta disso mental e emocionalmente. Meu jeito de viver é esse: busco informação, assimilo, trago para mim e sigo em frente.

Tenho uma relação quase terapêutica com a vida. Quando você faz terapia, ao menos a freudiana, você aprende a separar o que é seu do que é do outro. Do marido, da sociedade, da família. Isso ajuda a se encontrar consigo mesma, a se fortalecer e a fazer escolhas com mais clareza. É um processo transformador. Aprendi isso na terapia, que faço há muitos anos. Antes, tudo era misturado. E envelhecer tem sido um aprendizado parecido: estou reaprendendo a me separar e a me entender nesse novo tempo. 

É outro desafio, outra fase da vida. O que eu vou precisar nessa fase da vida para viver bem? Como quero envelhecer? Tenho refletido sobre o que é realmente meu e o que vem da pressão da sociedade, e até onde posso ir. Mas, para isso, preciso estar bem mentalmente, senão vou pirar. Vou ficar cada vez mais enrugada, com os cabelos mais brancos… Então, tenho que lidar com a minha aparência física, com as dificuldades maiores que devem vir, como de mobilidade e novas doenças. Por isso, estou muito focada em cuidar da saúde hoje e mudando muito minha vida. Quero envelhecer feliz e quero continuar tendo prazer na vida. 

M&M – Além de o quadro se chamar ‘Prazer, Renata’, ele traz a ideia de que o prazer na vida não pode ter data de validade. O que te dá prazer hoje?  

Renata Nossa, tenho muito prazer em sair com minhas amigas e em fazer novas descobertas. Também adoro viajar, mas não aquelas viagens corridas. Gosto de fazer pausas. Estou muito bicho-grilo, mas é isso, tenho gostado cada vez mais de fazer pausas e de buscar meu equilíbrio. Acho que esse é o meu prazer na vida. E ah, o banho de mar continua um grande prazer também. Agora é sagrado, e de preferência nas águas quentes da Bahia. Busco prazer todos os dias. É sobre relaxar, sabe? E aí envelhecer é uma libertação, porque você deixa de se importar como antes e faz o que quer. Prazer também é dar risada espontaneamente. Quero rir, rir com as minhas amigas, rir de mim. Rir da vida.

M&M – O que a Renata Ceribelli de 61 anos diria para a profissional Renata de 30?  

Renata “Relaxa, você vai dar conta e ser feliz”. Sou muito feliz na minha profissão, porque ela se mistura muito com a minha vida pessoal. Você não deixa de ser repórter em nenhum momento. A curiosidade que tenho na minha profissão é a que tenho pela vida. Para mim, essa curiosidade não pode acabar. Nunca fiz jornalismo por dinheiro, mas pelo afeto que tenho pela vida e pelo prazer pelas descobertas. Hoje, por exemplo, estou fazendo uma série que me ajuda a entender o envelhecimento e a pensar em como quero envelhecer. É difícil responder como vai ser minha velhice, mas sei como quero envelhecer nos próximos anos. Conversar com pessoas de 80, 90 anos tem ampliado meu olhar. Minha filha [Marcela Ceribelli] também me ensina horrores. Leio o que ela escreve e aprendo muito. E minha mãe também. Ter pessoas mais velhas e mais novas na vida é muito importante. Antes, a gente só convivia com pessoas da nossa geração.