Pokémon Go e a bolha de mídia

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Opinião

Pokémon Go e a bolha de mídia

Dependência de conteúdos virais em redes sociais e veículos de comunicação que nada têm a ver com o universo dos videogames impulsiona sucesso do produto criado pelo estúdio Niantic em parceria com a Nintendo


27 de julho de 2016 - 13h21

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Não há como questionar o sucesso do game Pokémon Go e sua fórmula arrasadora: resgatar uma febre midiática da virada do século XX e reinventá-la com inovação, utilizando recursos tecnológicos modernos como o GPS e a realidade aumentada. Mas por que outros jogos para smartphones tão bons ou melhores não conseguiram se tornar um case de excelência de marketing como este produto criado pelo estúdio Niantic em parceria com a Nintendo?

Fico me questionando se uma das razões do sucesso de Pokémon Go não é justamente a dependência da mídia por conteúdos virais e a consequente divulgação em todas as plataformas, como redes sociais e em veículos de comunicação que nada têm a ver com o universo dos videogames. As recentes cenas de histeria no Central Park, em Nova York, quando centenas de pessoas se lançaram em busca de um Pokémon raro, comprovam que esse assunto deixou de ser exclusividade de um nicho para se tornar de interesse do mundo inteiro. Nas últimas semanas, qualquer reportagem publicada sobre o game foi garantia de audiência e viralização, o que pode ter criado uma espécie de “bolha” fora da mídia especializada.

É notável que toda essa demanda também seja atendida pelas mídias não-especializadas em games – desde sites de lifestyle e cultura pop a influenciadores, passando por veículos tradicionais de alcance global como o The New York Times –, que enxergam uma rara oportunidade de se apropriar do assunto e gerar tráfego. Além disso, assessorias de imprensa vislumbram chances de repercutir com a febre, disparando releases com sugestões de pautas das mais diversas, de empresas de segurança sugerindo precauções no download do app ao inacreditável convite “Venha procurar Pokémon em Aruba”.

No Brasil, chegou a causar espanto que até a TV Globo, sempre avessa em mencionar marcas, tenha veiculado uma matéria no Fantástico citando a marca Pokémon com todas as letras. E há muitos casos como o da minha esposa, uma advogada que nunca se considerou fã de Pokemon, que não vê a hora de baixar o jogo “só porque fiquei curiosa, todo mundo fala disso”. Ou seja, não são só os fãs de Pokémon que estão em êxtase: todo mundo quer pegar monstrinhos.

A matemática que explica a formação dessa “bolha de mídia” é relativamente simples, ainda que difícil de ser reproduzida em outras circunstâncias:

1. A mídia digital se baseia muito na viralização (que depende de algoritmos de outras plataformas, tais como Facebook ou Google) para gerar audiência. Então, a mídia está constantemente de olho nos conteúdos que possam atrair a atenção do público.

2. Pokémon sempre foi uma grande fonte de audiência em sites especializados – e hoje em dia, mais do que nunca. Atualmente, qualquer novidade sobre o game pode gerar um novo conteúdo; consequentemente, qualquer conteúdo viraliza e gera rápida audiência. Tal informação passa a se espalhar e a ultrapassar barreiras de nicho.

3. Enxergando o potencial, a grande mídia começa a se apropriar desse conteúdo, utilizando ganchos diferentes para aproveitar a fácil viralização. A informação, ao sair de seu universo original (dos consumidores de videogames), atinge um alcance mais amplo, gerando interesse até mesmo em quem não faz parte do público-alvo. Surge assim a percepção geral de que se trata de um fenômeno sobre o qual é preciso consumir mais.

4. Os resultados fora da curva acabam fazendo a própria audiência gerar mais conteúdo, que por sua vez gera ainda mais mídia sobre o assunto. Isso cria um efeito cascata de viralização e a propagação de um sentimento de desejo pelo produto, não apenas entre os fãs, mas em escala mundial – e também no Brasil, onde o game ainda nem foi lançado.

Aliás, é o conteúdo gerado pela bolha de mídia que faz com que o sucesso do jogo esteja garantido no Brasil: não conheço ninguém que não vá baixar o jogo no dia do lançamento. Daí surge a questão: o jogo nem foi lançado, mas o desejo já existe. Fica difícil saber se o fenômeno vem do jogo em si, ou da mídia, que criou o desejo para o jogo, por este ser uma fonte de audiência. Mais do que isso, parece óbvio assumir que o segredo do sucesso de Pokémon Go esteja na necessidade da mídia de viralizar conteúdos de interesse geral e na sua consequente divulgação em todos os tipos de plataformas. Ou seja, se não fosse pela internet e seus veículos, Pokémon Go seria um sucesso apenas dentro de seu nicho – o qual já é bastante grande, por sinal. A qualidade de jogo, e o fato dele ser viciante, dá validade ao fenômeno.

Esse é o caso de Pokémon Go, um sucesso mundial também por seus próprios méritos. O jogo utiliza de maneira eficiente os recursos tecnológicos modernos e tem a seu favor uma das franquias de personagens mais populares dos 20 últimos anos. Parece difícil imaginar que tal resultado ocorreria se essa combinação de fatores não existisse. Obviamente, um fenômeno de mídia não se basta sozinho. E, verdade seja dita, não fosse pela força da franquia Pokémon e pelas mecânicas viciantes do jogo, nada disso teria acontecido.

A grande conclusão que tiro desse fenômeno: muito conteúdo com muita antecedência pode influenciar o desejo do consumidor final – é claro, se o produto for realmente bom e viralizável. E esse parece ser o caso de Pokémon Go.

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