Opinião

Nostalgia vende: por que funciona tanto?

Resposta pode estar menos no que a tecnologia promete e mais no que o ser humano precisa: segurança

João Branco

Professor e conselheiro 15 de julho de 2025 - 6h00

Por que, num mundo que muda mais rápido do que o rosto da Anitta, a gente insiste em revisitar o que já foi? Em pleno auge da inteligência artificial (IA), dos drones e dos algoritmos, por que tantas marcas estão abrindo o baú de memórias?

A Kibon relançou o palito premiado. A Adidas está bombando com o Samba (da década de 1950!). O OMO trouxe de volta a promoção das minibolas. A NotCo fez referência aos bichinhos da Parmalat. A Coca-Cola reimprimiu com os nomes nas latinhas. E até a turma do Ronald McDonald (quem diria?) está reaparecendo aos poucos.

A lista é infinita. Vinil voltou. Tamagotchi existe. Remakes de Vale Tudo e Pantanal vão ao ar no horário nobre da Globo. O SBT trouxe de volta o Show do Milhão e o Chaves. Novo filme do Shrek está em produção. Livros de colorir viraram febre. E até meme velho ressuscita no TikTok para ganhar view novo.

Está claro: a nostalgia está em alta. E não é um truque barato de “reviver coisas velhas”. É uma estratégia poderosa para conquistar corações, cliques e carrinhos de compra. O marketing nunca andou tão de mãos dadas com o saudosismo. Por que isso está acontecendo?

A resposta pode estar menos no que a tecnologia promete, e mais no que o ser humano precisa: segurança. Quando tudo se transforma o tempo todo, o passado vira um porto seguro. É como previu Martin Lindstrom, no seu clássico livro Buyology (traduzido como A Lógica do Consumo): “Quanto maior o estresse a que estivermos submetidos em nosso mundo e quanto maior for o medo, maior será a nossa procura por bases sólidas.”

Nunca mudamos tão rapidamente. Todo dia alguém anuncia que a IA vai roubar o seu emprego, vai escrever seus textos, vai criar suas músicas, vai decidir sua vida. Tudo muda o tempo todo, e num ritmo que, às vezes, a gente não aguenta acompanhar.

Por um lado, vivemos uma época fascinante de transformação. Mas, por outro, viver em um ritmo tão acelerado é exaustivo. No meio desse vendaval de novidades, o que é familiar se torna refúgio. Quando o mundo assusta, a nostalgia abraça. É como se o passado fosse aquele cobertor velho que a gente guarda no armário: meio gasto, mas com o cheiro da nossa infância. O consumidor de 2025 é hiperconectado, mas também é humano e tem receio do desconhecido.

E aí mora uma decisão estratégica: que papel sua marca quer ter nesse turbilhão? Tem quem escolha ser parte do medo. É o curso que grita: “Aprenda IA hoje ou vire dinossauro amanhã!” ou a consultoria que lucra espalhando ansiedade.

Mas também há outro caminho. O dos negócios que se colocam no lugar do seu público e mostram que estão passando tudo isso junto com eles. Marcas podem ser as bases sólidas que Lindstrom antecipou. O abraço no meio do caos. O lugar onde o cliente pensa: “Aqui eu sou compreendido.”

Antes de sair correndo para a próxima trend viral, olhe para o seu próprio passado. Quais símbolos, produtos ou histórias guardam emoção de verdade? Como resgatar isso de forma autêntica, sem parecer oportunista? E mais: como ser uma dose de conforto conhecido em um mundo que parece sempre em beta?

A nostalgia não é o fim da linha para a inovação, é uma ponte que liga o que as pessoas já amam ao que elas ainda nem sabem que vão amar. Saber atravessar essa ponte pode ser o maior diferencial competitivo de quem quer continuar relevante amanhã.

O passado, esse arquivo vivo de afetos, virou a grande matéria-prima para marcas que querem se conectar num mundo onde tudo parece provisório. No meio de tanta tecnologia, o cliente também quer boas memórias e companhia.