A irresponsabilidade social

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Opinião

A irresponsabilidade social

A coerência e a verdade são as palavras da vez; pode ser para produtos, para empresas, agências, para líderes e até, por que não dizer, países


1 de julho de 2019 - 13h40

Carnaby Street (Crédito: Nigel Cohen/ Pixabay)

Amo a publicidade inglesa. E quem não ama? É a melhor publicidade do mundo, aquela que chocou o mundo por colocar um homem grávido com o título “Would you be more careful if it was you that got pregnant?”, num anúncio de Charles Saatchi ainda jovem. Esse é só um pequeno exemplo da revolução que a Inglaterra seguiu fazendo na publicidade e no design.

Nos anos 1960, a Inglaterra mudou tudo no rock, na moda, nos costumes. Carnaby Street fervia e a publicidade inglesa se afastou dos anúncios que pareciam avisos de serviços e passou a fazer propaganda que, em vez de dizer o que fazer, argumentava e fazia pensar.

Quem não se lembra dos questionamentos dos icônicos anúncios all types do jornal The Economist? “I never read The Economist — estagiário 42 anos.” Era o início da propaganda entretenimento, na Inglaterra todo mundo começava a se apaixonar pelos “reclames”, e depois, sempre depois, o mesmo acontecia em outras partes do mundo.

Em seguida, vieram várias agências revolucionárias e vários comerciais icônicos, entre eles o “Wonderbra”, da TBWA\London, feito em 1994. O pôster de um sutiã que puxava os seios o mais próximo do queixo possível dizia: “Hello Boys”. Controverso, mas supereficiente, virou assunto no mundo e todo mundo comprou um sutiã desses, até eu. Eram outros tempos.

Vi agora em O Globo que a Inglaterra revoluciona novamente. Dessa vez, proibindo, desde o dia 14 de junho, a veiculação de qualquer campanha, em qualquer meio, que reforce estereótipos de gênero.

Hello boys and girls! A ASA, entidade que regulamenta a publicidade no Reino Unido, fez uma pesquisa sobre os impactos causados por anúncios que ditam padrões de comportamento para homens e mulheres, e comprovou o óbvio: elas limitam as aspirações e escolhas das pessoas, o que justifica as novas regras. Quem quiser conhecer as regras de conduta, pode consultar o site da entidade.

Gostei do que li e acho que muitas dessas regras já vêm sendo praticadas no Brasil por clientes e agências que entendem que, mais do que investir em responsabilidade social, é preciso não praticar a irresponsabilidade social. Chamo assim toda a comunicação que insiste em reforçar estereótipos negativos por eles ainda venderem muito mais que os positivos. Isso porque muitos consumidores ainda são machistas, homofóbicos e preconceituosos. E ter o apoio de marcas para esses comportamentos é um alívio para quem não quer o desconforto, não quer mudar comportamentos ou nem sequer pensar sobre o assunto.

Isso é grave. Não só por uma questão moral, mas porque, na minha opinião, as marcas sem propósito, as oportunistas, as que se aproveitam dos velhos costumes, devem guardar seus lucros, porque em um futuro próximo elas serão cobradas. E reconhecer o erro e mudar de posição muitas vezes sai bem mais caro. A coerência e a verdade são as palavras da vez. Pode ser para produtos, para empresas, agências, para líderes e até, por que não dizer, países.

*Crédito da foto no topo: iStock

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