Opinião
Renascer ou quebrar
Depois da crise, o jornalismo vai ser outro e os sobreviventes sensatos, mais fortes do que nunca
Depois da crise, o jornalismo vai ser outro e os sobreviventes sensatos, mais fortes do que nunca
31 de março de 2020 - 15h00
A crise provocada pela epidemia de coronavírus está só começando, mas já é possível enxergar algumas consequências inevitáveis. Como a grande maioria dos meios impressos do Brasil dependem fundamentalmente de publicidade do setor de serviços – e a economia está parada – o faturamento será próximo de zero nos meses de Covid-19. Eventos? Impossível, ninguém pode sair de casa. Pior, raros foram os meios que entenderam a necessidade de mexer na matriz de receitas antes da chegada do vírus, incentivando a participação da audiência nos resultados. Agora é tarde.
O quebra-quebra já começou. Demissões no Destak. Redução de circulação em diários do interior. É a lógica, não há milagres. Os custos são fixos e altos, as margens que já estavam minúsculas – ou negativas – agora se transformarão em um buraco enorme, uma cratera. A menos que ocorra um milagre, nenhum meio predominantemente impresso do Brasil fechará o ano no azul. Mesmo os que têm uma operação digital digna. Rádios e TVs seguirão a mesma toada – talvez com uma ou outra nobre exceção. Meios nativo digitais poderão ter resultado positivo, se já apostaram na receita da audiência – como Nexo ou Canal Meio, por exemplo.
Se por um lado o jornalismo do Brasil pós-coronavírus será outro, com a morte inevitável de diversos veículos, a crise poderá servir para que se repense as estruturas. O medo da mudança será atropelado pela velocidade de propagação do vírus. O pior das ilusões será imaginar que passada a crise tudo vai voltar ao “normal”. Não e não. Aquele cenário que já vivia de favores de anunciantes está morto e sepultado. A única solução será depender do dinheiro da audiência.
E que melhor momento para isso do que agora?
A desinformação é um problema sério. Não se sabe em quem acreditar, nas selfies do chefe de Estado com os bajuladores na frente do Planalto, ou nos alertas de cientistas e médicos para os perigos do vírus. Os veículos devem se posicionar, como aos poucos vêm se posicionando. Na falta de um governo forte, a sociedade civil se organiza. Mas as empresas de comunicação precisam assumir a liderança desse movimento, não podem perder a oportunidade de ser a fonte confiável para a sobrevivência. É a postura que possibilitará com que a audiência invista no produto, pague por ele. Não haverá ocasião melhor.
É hora de transformar essa pandemia em uma eficiente vacina. Mudar a lógica do negócio, esquecer os favores aos eventuais anunciantes, deixar para trás os tempos dos anúncios classificados, lembrar como um fato do passado a dependência de anúncios oficiais e não oficiais. A única opção sensata é praticar o bom jornalismo. Repensar as estruturas, diminuir drasticamente os custos nas áreas fora da produção de conteúdo. E fazer com que o veículo valha alguns reais na conta enxuta da audiência.
Chega de resistir. O coronavírus é o divisor dos tempos. Depois da crise, o jornalismo vai ser outro. Muitos mortos. Inúmeros moribundos. E os sobreviventes sensatos, mais fortes do que nunca.
*Crédito da foto no topo: Audioundwerbung/ iStock
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